A cada dia depois do acidente da TAM em Congonhas, novas informações revelam que por trás da tragédia está a sede por grandes lucros, superexploração e relações suspeitas entre governo, Congresso Nacional e empresas aéreas. Para tentar abafar o caso, são divulgadas informações cuja intenção é livrar a cara dos capitalistas que atuam no setor e suas promíscuas relações com o governo.
Segundo reportagem da revista Veja, as primeiras informações das caixas-pretas indicam que o comandante do Airbus 320 da TAM não conseguiu desacelerar o avião devido a um defeito de um dos reversos (mecanismo que ajuda a desacelerar) e a uma falha do piloto na operação do manete dispositivo que acelera o motor da aeronave.
O assessor para Assuntos Internacionais do governo Lula, Marco Aurélio Garcia, deve ter ficado ainda mais contente por poder tirar a culpa do governo e colocá-la na mão do falecido comandante.
Mas a manobra não tira de forma alguma a responsabilidade do governo federal e das companhias aéreas. Se o piloto falhou foi porque havia um defeito já detectado pela TAM no reverso do avião. Mesmo assim, a aeronave continuou operando. A tragédia de grandes proporções só ocorreu porque as empresas estão preocupadas apenas com seus lucros exorbitantes e não com a segurança dos passageiros.
Por outro lado, a omissão do governo permitiu a máxima utilização de um aeroporto que não possui condições para garantir a segurança dos passageiros. O acidente não teria dimensões catastróficas se a pista de Congonhas fosse maior e tivesse uma área de escape. É o que comprova a comparação com outros acidentes originários do mesmo erro, nas Filipinas em 1998 e em Taiwan em 2004 o erro foi o mesmo, mas o número de vítimas fatais foi de apenas três em solo no caso filipino e nenhuma em Taiwan. Através da Infraero e da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), o governo fecha os olhos e passa a mão na cabeça de tais empresas, pois está comprometido com elas.
Um erro humano num desastre desses também é fruto da pressão que as empresas exercem sobre os funcionários. Segundo sua lógica mercadológica, é preciso sempre aumentar o número de vôos, vender mais passagens, explorar mais os funcionários e voar com aeronaves que não estejam 100% em condições.
Nada substitui o lucro
O avanço no setor aéreo, o aumento na quantidade de vôos e os lucros obtidos pelas empresas diante de tal crescimento são facilmente observáveis. TAM e GOL são as maiores empresas do país no setor. Mesmo com a crise que já dura quase um ano e com duas grandes tragédias neste período, elas mantiveram seus lucros inabalados.
A TAM faturou, só em 2006, R$ 555,9 milhões, tendo crescimento de 174% em relação ao ano anterior. Não é por acaso. Dentre os sete mandamentos da empresa, disponíveis em seu site, o primeiro é nada substitui o lucro. Diante desta premissa, a companhia explora ao máximo sua mão-de-obra e também o uso das aeronaves.
É esta meta que faz com que as aeronaves sejam usadas até quando apresentam defeitos. Seguindo sua estratégia de lucro a qualquer custo, a própria companhia exemplifica sua política de utilizar ao máximo cada avião: em 31 de dezembro de 2005, a taxa de ocupação média de suas aeronaves era de 71%, e a média de horas voadas por aeronave era de 12,2 horas, ao passo que, em 31 de dezembro de 2004, a taxa de ocupação média de suas aeronaves era de 66% e a média de horas voadas por aeronave era de 10,3 horas.
O aumento de horas de vôos com redução de custos também implica em maior exploração dos funcionários. No dia 24 de julho, um grupo de funcionários se reuniu com o presidente da companhia, Marco Bologna, e devem entrar com processos contra a sobrecarga de tarefas.
ANAC: Relações perigosas
Liberação da pista de Congonhas antes da conclusão das reformas, omissão diante da venda pelas companhias aéreas de mais passagens do que os aviões comportam esses são alguns dos feitos da Anac. A agência é produto da desregulamentação do setor. Sua diretoria foi indicada pelo lobby das companhias aéreas que atuam no Planalto e no Congresso.
Exemplo disso é uma das diretoras da agência, Denise Abreu, que foi assessora da Casa Civil na época do então ministro José Dirceu. Além disso, Denise é irmã do advogado que presta serviços à TAM na Suíça. Já o diretor da Anac, José Baraf, é dono da Planam Consult, que já prestou consultoria para a TAM e teve contato com o grupo que controla a GOL. O diretor Leur Lomanto, por sua vez, teve um longo jantar com o presidente da BRA em um hotel de luxo no final do ano passado, depois do qual a companhia foi coincidentemente beneficiada com várias novas linhas.
Mas a promiscuidade não pára por aí. A sessão da Comissão de Infra-Estrutura do Senado para sabatinar esses diretores, em novembro de 2005, foi uma longa troca de elogios. Governistas e parlamentares da oposição burguesa renderam pomposos elogios aos diretores da agência. Toda essa bajulação não é de graça é fruto das relações construídas entre eles e as empresas aéreas, que financiam suas campanhas e depois cobram a fatura.
Governo quer privatizar Infraero
Com o auge da crise aérea, o governo vem anunciando medidas que só beneficiam as companhias aéreas, como o aumento das passagens (restringindo ainda mais o acesso ao transporte aéreo) e a privatização da Infraero.
Não é uma idéia nova. Sempre houve um movimento, com origem nas companhias aéreas, para privatizar a infra-estrutura aeroportuária.
A privatização da estatal será a realização do sonho dos capitalistas que atuam no setor e vai colocar todo o sistema aéreo do país de joelhos perante a insaciável sede de lucro fácil das empresas. Foi justamente essa lógica que levou ao desastre, ao sucateamento e à diminuição da segurança dos aeroportos.
Como abutres, governo e grande imprensa aproveitam a tragédia para defender essa proposta e utilizam o argumento da eficiência da iniciativa privada. Nada mais falso. O mito da eficiência privada provocou desastres como o desabamento das obras de uma estação do Metrô de São Paulo, realizada pelas mesmas empreiteiras que não concluíram as reformas da pista de Congonhas. Aplicar completamente a lógica de mercado ao funcionamento da Infraero é um crime, que pode significar mais e maiores tragédias como a do vôo 3054.
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