Protesto de familiares das vítimas no guichê da TAM, em Congonhas
valter campanato/Agência Brasil

A cada dia depois do acidente da TAM em Congonhas, novas informações revelam que por trás da tragédia está a sede por grandes lucros, superexploração e relações suspeitas entre governo, Congresso Nacional e empresas aéreas. Para tentar abafar o caso, são divulgadas informações cuja intenção é livrar a cara dos capitalistas que atuam no setor e suas promíscuas relações com o governo.

Segundo reportagem da revista Veja, as primeiras informações das caixas-pretas indicam que o comandante do Airbus 320 da TAM não conseguiu desacelerar o avião devido a um defeito de um dos reversos (mecanismo que ajuda a desacelerar) e a uma falha do piloto na operação do manete – dispositivo que acelera o motor da aeronave.

O assessor para Assuntos Internacionais do governo Lula, Marco Aurélio Garcia, deve ter ficado ainda mais contente por poder tirar a culpa do governo e colocá-la na mão do falecido comandante.

Mas a manobra não tira de forma alguma a responsabilidade do governo federal e das companhias aéreas. Se o piloto falhou foi porque havia um defeito já detectado pela TAM no reverso do avião. Mesmo assim, a aeronave continuou operando. A tragédia de grandes proporções só ocorreu porque as empresas estão preocupadas apenas com seus lucros exorbitantes e não com a segurança dos passageiros.

Por outro lado, a omissão do governo permitiu a máxima utilização de um aeroporto que não possui condições para garantir a segurança dos passageiros. O acidente não teria dimensões catastróficas se a pista de Congonhas fosse maior e tivesse uma área de escape. É o que comprova a comparação com outros acidentes originários do mesmo erro, nas Filipinas em 1998 e em Taiwan em 2004 – o erro foi o mesmo, mas o número de vítimas fatais foi de apenas três em solo no caso filipino e nenhuma em Taiwan. Através da Infraero e da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), o governo fecha os olhos e passa a mão na cabeça de tais empresas, pois está comprometido com elas.

Um erro humano num desastre desses também é fruto da pressão que as empresas exercem sobre os funcionários. Segundo sua lógica mercadológica, é preciso sempre aumentar o número de vôos, vender mais passagens, explorar mais os funcionários e voar com aeronaves que não estejam 100% em condições.

“Nada substitui o lucro”
O avanço no setor aéreo, o aumento na quantidade de vôos e os lucros obtidos pelas empresas diante de tal crescimento são facilmente observáveis. TAM e GOL são as maiores empresas do país no setor. Mesmo com a crise que já dura quase um ano e com duas grandes tragédias neste período, elas mantiveram seus lucros inabalados.

A TAM faturou, só em 2006, R$ 555,9 milhões, tendo crescimento de 174% em relação ao ano anterior. Não é por acaso. Dentre os sete mandamentos da empresa, disponíveis em seu site, o primeiro é “nada substitui o lucro”. Diante desta premissa, a companhia explora ao máximo sua mão-de-obra e também o uso das aeronaves.

É esta meta que faz com que as aeronaves sejam usadas até quando apresentam defeitos. Seguindo sua estratégia de lucro a qualquer custo, a própria companhia exemplifica sua política de utilizar ao máximo cada avião: “em 31 de dezembro de 2005, a taxa de ocupação média de suas aeronaves era de 71%, e a média de horas voadas por aeronave era de 12,2 horas, ao passo que, em 31 de dezembro de 2004, a taxa de ocupação média de suas aeronaves era de 66% e a média de horas voadas por aeronave era de 10,3 horas”.

O aumento de horas de vôos com redução de custos também implica em maior exploração dos funcionários. No dia 24 de julho, um grupo de funcionários se reuniu com o presidente da companhia, Marco Bologna, e devem entrar com processos contra a sobrecarga de tarefas.

ANAC: Relações perigosas
Liberação da pista de Congonhas antes da conclusão das reformas, omissão diante da venda pelas companhias aéreas de mais passagens do que os aviões comportam – esses são alguns dos feitos da Anac. A agência é produto da desregulamentação do setor. Sua diretoria foi indicada pelo lobby das companhias aéreas que atuam no Planalto e no Congresso.

Exemplo disso é uma das diretoras da agência, Denise Abreu, que foi assessora da Casa Civil na época do então ministro José Dirceu. Além disso, Denise é irmã do advogado que presta serviços à TAM na Suíça. Já o diretor da Anac, José Baraf, é dono da Planam Consult, que já prestou consultoria para a TAM e teve contato com o grupo que controla a GOL. O diretor Leur Lomanto, por sua vez, teve um longo jantar com o presidente da BRA em um hotel de luxo no final do ano passado, depois do qual a companhia foi ‘coincidentemente’ beneficiada com várias novas linhas.

Mas a promiscuidade não pára por aí. A sessão da Comissão de Infra-Estrutura do Senado para sabatinar esses diretores, em novembro de 2005, foi uma longa troca de elogios. Governistas e parlamentares da oposição burguesa renderam pomposos elogios aos diretores da agência. Toda essa bajulação não é de graça – é fruto das relações construídas entre eles e as empresas aéreas, que financiam suas campanhas e depois cobram a fatura.

Governo quer privatizar Infraero
Com o auge da crise aérea, o governo vem anunciando medidas que só beneficiam as companhias aéreas, como o aumento das passagens (restringindo ainda mais o acesso ao transporte aéreo) e a privatização da Infraero.

Não é uma idéia nova. Sempre houve um movimento, com origem nas companhias aéreas, para privatizar a infra-estrutura aeroportuária.

A privatização da estatal será a realização do sonho dos capitalistas que atuam no setor e vai colocar todo o sistema aéreo do país de joelhos perante a insaciável sede de lucro fácil das empresas. Foi justamente essa lógica que levou ao desastre, ao sucateamento e à diminuição da segurança dos aeroportos.

Como abutres, governo e grande imprensa aproveitam a tragédia para defender essa proposta e utilizam o argumento da “eficiência” da iniciativa privada. Nada mais falso. O mito da “eficiência” privada provocou desastres como o desabamento das obras de uma estação do Metrô de São Paulo, realizada pelas mesmas empreiteiras que não concluíram as reformas da pista de Congonhas. Aplicar completamente a lógica de mercado ao funcionamento da Infraero é um crime, que pode significar mais e maiores tragédias como a do vôo 3054.
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