A recente visita do presidente Lula a Israel – a primeira feita por um chefe de Estado brasileiro – e a Cisjordânia provocou um intenso debate sobre qual papel o governo brasileiro pretende desempenhar na complicada geopolítica do Oriente Médio. O debate esquentou ainda mais depois que Lula anunciou uma viagem oficial para o Irã, marcada para 15 de maio.

No Brasil, a grande imprensa qualifica a aproximação de Lula ao regime iraniano e a intromissão na questão palestina como errática. Já a esquerda governista exibe o episódio como demonstração de independência da política externa brasileira em relação aos Estados Unidos. Será?

Desgaste dos EUA
A política externa do governo Lula só pode ser entendida a partir de uma análise do profundo desgaste vivido da diplomacia dos EUA no Oriente Médio, isto é, a derrota da guerra ao terror de Bush, na esteira das derrotas acumuladas nas guerras da região.

A eleição de Obama representou uma mudança na tática do imperialismo para enfrentar a situação mundial e a luta das massas. Sob a figura de Obama, o imperialismo tenta aplicar sua política de dominação de forma mais negociada, através de consenso e com o auxílio de instituições multilaterais como ONU, OTAN, OEA, entre outras.

Obama, porém, continua a defender os mesmos interesses sociais, políticos e históricos de Bush, mas com métodos supostamente mais democratizantes. Essa política de reação democrática tem uma importante colaboração na figura dos presidentes ditos de esquerda da América Latina, especialmente em Lula.

No entanto, nem mesmo Obama consegue reverter sozinho o desgaste da diplomacia de Washington. Isso dificulta que os EUA cumpram um papel de mediador honesto nas crises do Oriente Médio. Um prova disso foi proporcionada pela recente visita do vice-presidente dos EUA, Joe Biden, à região. Assim que o avião de Biden aterrissou em Tel-Aviv, seus anfitriões israelenses anunciaram planos para construir outras 1.600 casas nos território ocupado de Jerusalém Oriental. O anúncio despertou a fúria dos palestinos, que neste momento estão nas ruas enfrentando os soldados israelenses.

Perante o desgaste de Washington, um rosto novo, o de Lula, é apresentado à cena.

O que propõe Lula sobre o conflito palestino
Na sua visita a Israel e a Cisjordânia, o presidente brasileiro propôs a retomada dos diálogos e criticou os novos assentamentos israelenses na Cisjordânia.

“A mensagem que o presidente Lula dará ao lado palestino é que a primeira coisa a fazer é unir-se. Se o lado palestino não tiver uma posição coesa, homogênea, qualquer entendimento com Israel ou com quem quer que seja estará fadado ao fracasso”, disse o assessor especial para assuntos internacionais da Presidência, Marco Aurélio Garcia. Mas de que entendimento está falando Garcia? Da via morta dos acordos entre Israel e a Autoridade Nacional Palestina que levaram a atual situação?

É bom lembrar que foram os Acordos de Oslo, selados em 1993 pela direção da OLP e Israel, com a mediação de Bill Clinton, que levaram ao fortalecimento do Estado sionista e à deterioração dos palestinos. Os acordos foram um marco do abandono do programa original da OLP (Palestina, laica democrática e não racista) para a aceitação da criação de dois Estados, israelense e palestino, e levou à criação da ANP como uma superestrutura colonial com uma autonomia muito limitada, similar à dos bantustões da África do Sul na época do Apartheid.

Em vez de estabelecer termos de paz, os acordos serviram para acobertar a expansão sem precedentes dos assentamentos israelenses na Cisjordânia. Além disso, ofereceram a Israel uma cobertura diplomática para suas sistemáticas agressões genocidas ao povo palestino.

O governo brasileiro, portanto, não propõe nada de novo para o conflito na região. Ao se manter nos marcos dos Acordos de Oslo, o Brasil ignora os crimes cometidos por Israel e faz o mesmo jogo da atual política externa norte-americana que também tenta reativá-lo. Assim, os apelos de Lula pela negociação acabam reforçando os apelos do próprio imperialismo para retomar a via morta das negociações.

Outro objetivo da visita de Lula foi anunciar a aprovação do acordo de livre comércio entre o Mercosul e Israel. O acordo terá validade a partir de 4 de abril e vai favorecer muitos empresários brasileiros.

Os palestinos receberam Lula com muitas homenagens na Cisjordânia, mas o acordo com Israel vai garantir o apoio econômico de que o Estado sionista precisa para continuar gastando na máquina de guerra e na política de guetização dos palestinos.

Atualmente, o Brasil é o maior parceiro comercial de Israel na América Latina. O intercâmbio comercial com Israel aumentou sob o governo Lula. Em 2002, totalizavam US$ 440 milhões. Hoje a cifra é de US$ 1,6 bilhão.