Estamos diante de uma contrarreforma urbana levada a cabo pelos governos e pelo capital? Como você avalia isso?

Guilherme Boulos – Nunca o capital imobiliário esteve tão forte no Brasil. Atualmente, este setor dita o ritmo do crescimento econômico – via PAC, Minha Casa, Minha Vida e outros – e tem boa parte do aparelho de Estado no bolso. Em 2010, 57% dos parlamentares que foram eleitos haviam recebido doações de empreiteiras ou incorporadoras. Foram elas também as maiores financiadoras tanto da campanha da Dilma, como da do Serra. Isso evidentemente tem resultados políticos.

As políticas urbanas desenvolvidas pelo Estado, em todos os níveis, só têm fortalecido os interesses do capital imobiliário: despejos sistemáticos, especialmente de áreas em processo de valorização; financiamento público para grandes obras; política de higienização e repressão aos que resistem. As cidades brasileiras têm sido remodeladas de acordo com estes interesses. Por isso, falamos de uma contrarreforma urbana. O que está ocorrendo no país é o oposto de um projeto popular de reforma urbana. Esta situação se agrava com a aproximação dos megaeventos esportivos – Copa e Olimpíadas.

O que é a Frente de Resistência Urbana? Como ela busca unificar o movimento de luta pela moradia?

Guilherme – A Resistência Urbana é uma frente nacional de movimentos populares, que atualmente está presente em 14 estados. São mais de 20 movimentos, alguns mais locais, outros nacionais, que se organizam há mais de cinco anos para enfrentar estes ataques. 

O papel que a frente tem cumprido é o de organizar jornadas, campanhas e materiais unificados em relação a temas que atacam o conjunto dos movimentos. Neste ano, levaremos adiante a campanha contra os crimes da Copa, para resistir aos despejos e denunciar a legislação de exceção e o modelo segregador de cidade que estão associados ao evento.

Em anos anteriores, desenvolvemos jornadas de luta pela moradia, com ocupações de terras e prédios públicos. E também a campanha “Minha Casa, Minha Luta”, entre outras ações que têm construído uma alternativa real de luta e organização aos movimentos populares.

Como você avalia a crescente criminalização dos movimentos sociais?

Guilherme – O problema da criminalização tem se intensificado a cada ano. No ano passado tivemos, que lançar a Campanha Sem Teto com Vida por conta de ameaças e atentados a militantes do MTST em estados como DF, AM e MG. Não foram casos isolados.

Percebemos, nos últimos meses, que há um aprofundamento da política do Estado brasileiro neste sentido, tendo como vanguarda as forças mais conservadoras ligadas ao PSDB de São Paulo. A militarização da USP, a repressão indiscriminada na Cracolândia e o massacre do Pinheirinho foram expressões evidentes disso.

Eu milito no movimento sem-teto há mais de 10 anos, já vi uns 30 a 40 despejos. Mas nunca vi algo parecido ao que se deu no Pinheirinho. É uma escalada preocupante. 
Mas o pior é que não se limita aos governos tucanos. Basta ver como o governo petista do DF tem tratado as ocupações urbanas: despejos sem ordem judicial, ameaças a militantes e traição de acordos. Ou mesmo a criminalização das greves de policiais militares. O cenário é preocupante.