“Estive no Uruguai e pude ver o porquê de tanta expectativa. A miséria é gritante.”No domingo, 31 de outubro, os uruguaios elegeram Tabaré Vasquez, da Frente Ampla, para a Presidência, um fato que está sendo noticiado pela imprensa mundial como a chegada de um novo Lula ao poder na América Latina. Uma afirmação que merece ao menos uma reflexão.

Que o resultado é “histórico” não há dúvidas. Num país com cerca de 3,3 milhões de habitantes e 2,2 milhões de eleitores, a Frente teve 1.113.615 votos (50,70%), contra 748.130 (34,06%) do Partido Nacional, ou Blanco, e 226.746 (10,32%) obtidos pelo Partido Colorado. Colorados e Blancos se revezavam no poder desde que o país se tornou independente, há mais de 170 anos, em 1830.

Para se ter uma dimensão do grau de expectativas em torno da Frente, basta dizer que seu último ato antes das eleições reuniu cerca de 500 mil pessoas em Montevidéu, cidade com 1,5 milhão de habitantes. Estive no Uruguai recentemente e pude ver o porquê de tanta expectativa. A miséria é gritante. A taxa de pobreza dobrou na última década e a do desemprego já bate na casa dos 13%.

A Frente foi formada em 1971 e já havia eleito Tabaré para a prefeitura de Montevidéu, em 1989. Hoje, ela agrega desde o Partido Socialista, do presidente eleito, até o Movimento de Libertação Nacional, formado em 1985 pelos ex-guerrilheiros tupamaros, passando pelos stalinistas, os democratas-cristãos e organizações burguesas de diferentes matizes.

E é exatamente isso que nos leva a fazer uma comparação com Lula. Mas completamente diferente da que vem sendo feita pela imprensa e, particularmente, pelos partidos de “esquerda”. Tabaré, assim como Lula, “suavizou” seu discurso, fez alianças com setores da burguesia, e deu garantias ao imperialismo de que a dívida externa de US$ 12,5 bilhões é sagrada. Elegeu-se com base em um programa que se assemelha ao que há de pior no governo Lula: a total submissão à perversa lógica do FMI.

Até um Palloci, Tabaré já arrumou. Seu ministro da Economia, Danilo Astori, foi escolhido por ser “bem-visto” em Wall Street e no FMI, ou seja, por defender exatamente a mesma política econômica dos governos anteriores. Neste sentido, o anúncio de sua primeira medida não poderia ter sido mais claro: reunir-se, o mais rápido possível, com funcionários do Fundo, para preparar o acordo que sucederá o atual, que vence em março.

E a pauta é a mais “lulista” possível: a moderação nos gastos públicos, a garantia do aumento de reservas internacionais no Banco Central e a realização de reformas estruturais no país. Projetos que a Frente pretende implementar com a maioria que obteve no Parlamento.

Como a história só se repete como farsa, como já dizia Marx, o que se pode esperar do novo Lula da América Latina é o mesmo que temos aqui: aumento da miséria e da exploração. Conseqüentemente, a resposta dos trabalhadores só pode ser uma: sua organização independente e a luta sem tréguas contra esses planos.
Post author José Maria de Almeida, o Zé Maria, é Presidente Nacional do PSTU e integra a Coordenação da Conlutas
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