A morte de Chávez levanta muitas especulações sobre o futuro político do país e do próprio chavismo como corrente política. Ainda antes da sua morte, Chávez designou o atual vice-presidente da República, Nicolás Maduro, como herdeiro, sucessor e candidato a presidente. No mesmo dia 5 de março, Maduro assumiu interinamente a presidência da República, com o apoio da Assembleia Nacional e das Forças Armadas Bolivarianas.

Novas Eleições presidenciaisem 14 de abril
Segundo a Constituição venezuelana, em seu artigo 233, em caso de morte do presidente da República, novas eleições devem ser convocadas em 30 dias . O Conselho Nacional Eleitoral já marcou a eleição para 14 de abril. Não há nenhuma ameaça de uma suposta conspiração militar de direita ou uma pretensa intervenção imperialista. Por agora, tudo caminha para se resolver nos trilhos da democracia burguesa.
Já estão confirmadas as candidaturas de Nicolás Maduro, pelo PSUV, e de Henrique Capriles Radonski, pela Mesa de Unidade Democrática (MUD), que aglutina a oposição de direita e obteve, nas últimas eleições presidenciais, em outubro do ano passado, 44,31% dos votos (contra 55,07% de Hugo Chávez). Tanto o governo quanto a oposição de direita pregam a paz, a união e o respeito à constituição, na medida em que se debaterão novamente em breve nas urnas.
Dificilmente Maduro perderá as novas eleições presidenciais. A morte de Chávez conspira a favor da vitória do seu herdeiro político que obterá, possivelmente, uma vantagem maior que a do próprio Chávez contra Capriles.Para garantir a eleição de Maduro, o chavismo se mostrará monolítico e inquebrantável. Mas, depois das eleições de 14 de abril, as primeiras trincas e fendas não tardarão a aparecer.
Heterogeneidade
e disputas no chavismo
Como movimento político-social, o chavismo não é nada homogêneo. Socialmente, trata-se de um amalgama de oficiais das Forças Armadas, proprietários privados, intelectuais e militantes dos movimentos populares e sindicais. Sem sombra de dúvidas, uma das suas principais alas é aquela formada por dirigentes oriundos das Forças Armadas, como o tenente reformado Diosdado Cabello, atual presidente da Assembleia Nacional. Cabello é considerado um dos homens mais ricos da cúpula chavista, acusado de enriquecimento ilícito e um dos maiores representantes da chamada “direita endógena”, ou seja, da ala direita do chavismo.
Uma segunda ala seria vinculada aos movimentos populares, sindicais e intelectuais de esquerda. Maduro, de origem civil, ex-militante da Liga Socialista (partido de origem maoísta), ex-dirigente sindical e muito bem relacionado com Cuba e o regime dos irmãos Castro, seria o principal representante desta pretensa ala esquerda do chavismo. Além disso, Maduro nunca foi associado a qualquer escândalo de corrupção. Com este perfil, trata-se do homem perfeito para ganhar os corações e as mentes das massas populares para a sucessão presidencial.
Outra ala com bastante peso é formada por proprietários privados que enriqueceram através de negócios com o Estado, particularmente aqueles organizados na “Empresários por Venezuela” (EMPREVEN). Fazem parte desta ala, inclusive, ex-oficiais do exército feitos burgueses durante os últimos 14 anos, como o próprio Diosdado.
Mas nenhuma destas frações é tampouco homogênea. Muito pelo contrário. Por exemplo, aparentemente não houve nenhuma divergência entre elas na indicação de Maduro como presidente interino e candidato do chavismo às próximas eleições. Tanto que o ministro da Defesa, o almirante Diego Molero Bellavia, em recente declaração comprometeu as Forças Armadas com “a missão de levar Nicolás Maduro à presidência da República”.
O chavismo como movimento político-social é muito parecido com os movimentos nacionalistas burgueses de cunho bonapartista que surgiram na primeira metade do século 20 na América Latina, encabeçados por lideranças carismáticas como Getúlio Vargas, no Brasil; Juan Domingo Perón, na Argentina e Lázaro Cárdenas, no México. Todos estes possuíam uma composição político-social bastante heterogênea, desde alas bonapartistas, democráticas, sindicalistas e socialistas. A morte do grande líder carismático levou (mais cedo ou mais tarde) a lutas internas entre as diferentes alas e perda de força política, a exemplo da completa falência da herança getulista no Brasil contemporâneo; ou mesmo do caso do renascimento do peronismo sob a forma caricata do governo de Cristina Kirchner, atual presidente da Argentina. O chavismo não poderá fugir ao mesmo destino.

Construir uma alternativa
Passadas as eleições presidenciais, possivelmente o maior drama do chavismo não será a luta contra a oposição de direita, mas a disputa entre suas diferentes frações pelo controle do aparato do Estado, das Forças Armadas, da Petróleos da Venezuela (PDVSA), das verbas orçamentárias e dos programas sociais. A deteriorização da situação econômica do país potencializará muito provavelmente estas disputas pelas benesses dos negócios do Estado.
A política econômica do chavismo tornou a economia venezuelana ainda mais dependente do petróleo, responsável atualmente por 96% das exportações do país. Isto é ainda mais preocupante na medida em que a produção petrolífera nestes 14 anos caiu para 2,5 milhões de barris ao dia, quase um milhão de barris a menos de quando Chávez assumiu a presidência. Não há carisma e propaganda capazes de resistirem muito tempo a presente crise econômica, que tem por base a contradição entre a crescente dependência das exportações de petróleo e a queda da sua produção.
Chávez, agora na condição de mártir, não conseguirá ajudar Maduro a impedir que, mais cedo ou mais tarde, mesmo as políticas sociais compensatórias e a redução dos índices de pobreza sofram as consequências da crise econômica e do agravamento das disputas internas entre as diferentes frações do chavismo.
Desgraçadamente, desde 1999, a maioria das organizações de esquerda venezuelana, mesmo de origem trotskista, aderiu incondicional ou parcialmente ao chavismo, sendo incapaz de construir uma verdadeira alternativa operária e socialista. Após a morte de Chávez, o desafio de construir uma organização operária e socialista alternativa ao chavismo, capaz de ganhar influência de massas, está colocada como uma tarefa inadiável.

Post author
Publication Date