Eloá foi vítima do resultado mais bárbaro do machismo, que mata, agride e não mede consequências para retomar o que é ?seu?.Uma jovem de 15 anos, natural de Maceió e residente em Santo André (SP) que, aos 12, começou a namorar com um jovem sete anos mais velho que, após três anos de relacionamento, não aceitava o fim do namoro e invadiu a casa da adolescente e a faz refém por mais de 100 horas. Ao fim do sequestro, a jovem saiu baleada na virilha e na cabeça e morreu no hospital.

Essa foi a história de Eloá Cristina Pimentel, mas poderia ser a de milhares de jovens do país. Quase quatro anos depois do sequestro que comoveu o país, Lindemberg Alves foi ao julgamento e acabou punido com 98 anos de prisão. O julgamento nos faz refletir sobre importantes lições que o caso Eloá nos trouxe.

Um crime de machismo
Eloá foi vítima do resultado mais bárbaro do machismo, que mata, agride e não mede consequências para retomar o que é “seu”. Mas, este é o fim de uma trilha que começa de maneira muitas vezes “sutil”: a proibição da roupa, o controle das ligações, as restrições de amizades e de lugares a frequentar. Muitas manifestações de machismo disfarçadas de preocupação ou “amor em excesso” vão dando lugar à face agressiva da opressão.

Lindemberg chegou a um extremo, mas quantos não reproduzem a mesma ideologia machista em atitudes mais “aceitáveis”? Desde os companheiros que tratam a namorada como “sua propriedade” até aqueles que fazem as piadas machistas na escola ou universidade, chamando as garotas de “gostosas”, como se fossem um pedaço de carne, ou fazendo ranking entre as “mais bonitinhas” para “pegar”.


Eloá tinha apenas 12 anos quando começou a namorar. Este fato foi apenas uma brecha para vários comentários que tentavam, de algum modo, justificar o crime.
Um dos tristes comentários a este respeito foi feito pela ministra Maria do Rosário, da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, que sugeriu, na semana do julgamento, que a família de Eloá também teve sua parcela de responsabilidade ao permitir o namoro. Um verdadeiro absurdo, principalmente vindo de uma mulher, que ao invés de ressaltar a barbaridade do crime de machismo, faz declarações como esta.

A proibição dos pais não impede as adolescentes de se relacionar quando querem. O papel dos pais, assim como do Estado, é o de educar e orientar. A proibição só faz com que o início da vida sexual das jovens seja repleto de culpas e medos. Certamente, se o caso em discussão fosse de um menino, tais comentários não viriam à tona, pois, para o homem, mesmo jovem, toda liberdade deve ser permitida.

A sexualidade entre as adolescentes
A vida de Eloá também é um retrato de muitas jovens, que desde cedo já começam a experimentar relações afetivas e a se depararam com todas as dificuldades impostas à mulher nesta idade.

A média de idade da primeira relação sexual entre as jovens brasileiras é de 15 anos, de acordo com estudo feito por pesquisadores da USP, em 2008. E quase todas as jovens, quando entram na adolescência, se deparam com o conflito que se torna o início da vida sexual.

A sociedade que alimenta a erotização, através da TV, dos bailes funk e das músicas de massa, é a mesma que tenta impor um código moral para a “virgindade até o casamento”. De um lado a igreja, a escola e a família tentam reprimir algo que deveria ser natural: o processo da sexualidade feminina. E, do outro lado, a mídia e os círculos sociais pressionaram e recriminaram aquelas que ainda não transam.

Os homens, se utilizando desta fragilidade, geralmente utilizam o sexo como chantagem para continuar o relacionamento. Quantas meninas não transam somente por medo de ficarem sozinhas? E a todo momento passam pelo medo de serem rotuladas e obrigadas a assumir uma identidade. Se transam, são “putas”. Se forem virgens, são “caretas”. É a esta situação que as adolescentes estão submetidas: à rotulação, ao preconceito e à impossibilidade de experimentarem, com prazer e naturalidade, a descoberta da sexualidade.

A mulher como objeto
Outro grande problema vivido especialmente pelas mulheres jovens é o tratamento da mulher como objeto. A alienação, promovida pelo capitalismo, faz com que as relações sociais se coisifiquem (se transformem em “coisas”, desumanizando o ser humano) e a ideologia machista faz com que esta coisificação atinja especialmente as mulheres.
Hoje, é praticamente uma regra os comerciais de cerveja mostrarem mulheres seminuas.

É mais fácil vender se os homens tiverem a sensação de que estão comprando, junto com a cerveja, as mulheres. É a mesma lógica das propagandas das festas, que oferecem como mercadorias a música, a bebida e as mulheres. Portanto, se a mulher é um objeto nos comerciais e nas festas, ela também é em casa, no trabalho ou na universidade. É esse o raciocínio que faz não só os homens se apropriarem desta ideologia, como também as mulheres absorverem este papel. Hoje, as jovens, desde cedo, são levadas a ter que atingir a beleza perfeita, nos moldes ditados pela mídia. Ter o cabelo liso, ser magra, ter seios e glúteos grandes e uma cintura fina são itens indispensáveis para ser mais bem “comercializada”.

A luta contra a opressão
Eloá foi um exemplo de até onde podem chegar o machismo e a visão da mulher como uma propriedade. Façamos deste exemplo um símbolo para a luta pela libertação das mulheres jovens de toda a opressão imposta pelo capitalismo.

Não podemos mais deixar que milhares de jovens tenham o mesmo destino de Eloá. Para isso, as mulheres precisam ser as primeiras a tomarem consciência da opressão que sofrem, em cada piada machista ou em cada relacionamento ciumento ou violento.  Não devemos nos calar e ser submissas a esta ideologia que inferioriza a mulher.

Devemos combater o machismo a cada dia, reprimindo as atitudes opressoras, denunciando os casos de violência e se solidarizando com cada jovem vítima do machismo. Mas nossa luta só terá um fim com a destruição do sustentáculo da ideologia machista, a sociedade capitalista. E para esta luta, devemos convencer homens e mulheres de combater os resultados nefastos do machismo.