Expectativas com o novo pacote habitacional do governo federal devem ser frustradas. Plano garante lucros de construtoras, sem solucionar a histórica falta de moradias no paísO governo Lula fez conhecer, com festas e fogos, o plano habitacional intitulado “Minha casa, minha vida”. No último dia 24 de março, o presidente e a ministra Dilma Rousseff anunciaram um investimento de R$ 34 bilhões para resolver parcialmente, segundo o governo, o problema do déficit habitacional. Lula fala em construir 1 milhão de casas e solucionar 14% da falta de moradias, que hoje seria de 7,9 milhões de unidades habitacionais.

Evidentemente, a divulgação do pacote adquiriu amplitude, começou a fazer parte das conversas das pessoas simples e produziu enormes expectativas, sobretudo na população mais pobre. Afinal, o plano governamental está direcionado aos que ganham até dez salários mínimos. O pacote prevê ainda que 400 mil habitações (40% do total) seriam destinadas aos que recebem até três salários mínimos, que pagariam uma prestação mensal de cerca de R$ 50.

Antes de festejar, é preciso uma análise mais aprofundada dessa política. É necessário ir além das aparências, na perspectiva de combater as falsas esperanças que dela decorrem.

Sem moradia
De acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o déficit habitacional atinge 7,9 milhões de domicílios. Mais de 90% das pessoas afetadas são famílias com renda de até três salários mínimos, ou seja, R$ 1.390. No entanto, de acordo com o projeto do governo, essa camada da população vai receber 40% dos recursos. A meta de redução do déficit habitacional, portanto, será muito mais baixa do que a anunciada por Lula.

Em nosso país, mais de 52 milhões de pessoas vivem em assentamentos precários; 34,6 milhões vivem sem esgoto ou fossa séptica e 15,6 milhões não têm água encanada. Mais de um terço das moradias no país são consideradas inadequadas.
O resultado se vê na formação dos espaços urbanos das nossas grandes cidades. A esmagadora maioria da população mais pobre vive em barracos e moradias precárias, em ocupações de distantes terrenos nas periferias, sem nenhuma infraestrutura.
 
Sem datas
O plano do governo também não estabelece metas para a construção das casas. Lula chegou a dizer que o projeto “não tem data” e disse para ninguém cobrá-lo por isso.
O que leva à desconfiança de que o governo está somente fazendo um anúncio genérico, sem estabelecer o mínimo compromisso com a sua efetivação. Além disso, a crise econômica está levando o governo a reduzir gastos e diminuir as verbas públicas. Devido à situação da economia mundial, muitas obras de infraestrutura não saíram do papel. É o caso da exploração do petróleo do pré-sal, por exemplo, cujos projetos estão praticamente paralisados devido à falta de recursos.

Podemos, portanto, estar diante de algo que servirá unicamente para reforçar o cacife da candidatura governista nas eleições de 2010.

Seria um equívoco concluir que o governo apresentou um projeto concreto para iniciar uma resposta ao drama do déficit habitacional brasileiro. Mesmo que o governo cumprisse a promessa lançada ao vento, estaria simplesmente executando um plano modesto e o país continuaria com milhões de famílias sem suas casas.
 
Empregos precários
Durante o lançamento do programa, ficou claro que não há lugar para os operários da construção civil. Embora fale em gerar 700 mil postos de trabalho, o governo silencia exatamente sobre algo muito importante: a precariedade das condições de trabalho que atinge mais da metade dos operários da construção civil. 

É nessas obras que o trabalho terceirizado e precarizado adquire os tons mais dramáticos. É aí, por exemplo, que os patrões demitem os trabalhadores com menos de três meses de atividade para não pagar direitos trabalhistas. Nessas obras também estão as empresas mais picaretas, que contratam outras ainda mais picaretas, que rebaixam a situação do trabalhador quase à condição de indigente. E não há no plano do governo nenhuma medida que vise proteger os trabalhadores da precariedade.

Palacete
A crise econômica limita os movimentos do governo na medida em que ele está preocupado em fortalecer o “bolsa banqueiro”, sem esquecer as ajudas nada desprezíveis ao empresariado dos ramos mais diversos. Esse plano habitacional pode se tornar uma forma de seguir apoiando financeiramente os patrões da construção civil – apoiado em um grande apelo popular.

A prioridade real dos dirigentes políticos deste país não é com os mais pobres, mas com aqueles que tudo têm, mas não se envergonham de querer sempre muito mais.

Para ficarmos apenas em uma breve comparação, façamos um paralelo entre o que o governo alardeia para o seu plano – R$ 34 bilhões – e o superávit primário (aquilo que é economizado para ser distribuído aos banqueiros), que somente no ano passado foi de R$ 118 bilhões. Quer dizer, aquilo que o governo economizou para repassar aos banqueiros, num único ano, é quase quatro vezes superior ao que o governo promete investir em habitação. Agora mesmo, a Lei Orçamentária Anual (LOA) destinou R$ 234 bilhões para gastar com juros e amortizações da dívida pública, quase um quarto do orçamento.

Em grande parte, isso explica por que os trabalhadores continuam morando em casebres e os banqueiros em palacetes.

Post author Fábio José, de Fortaleza (CE), e Jeferson Choma, da redação
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