Rio de Janeiro RJ 29 02 2020 Passageiros e funcionários circulam vestindo máscaras contra o novo coronavírus (Covid-19) no Aeroporto Internacional Tom Jobim- Rio Galeão foto Fernando Frazão/Agencia Brasil
Redação

Redação

Quando fechávamos esta edição, o Ministério da Saúde registrava dois casos confirmados de coronavírus e outros 433 casos suspeitos em todo o país. Pelo mundo, o número de pessoas afetadas totalizou 88.257, incluindo 2.996 mortes em 66 países e territórios. A China, onde a epidemia apareceu no final de dezembro, registrou 79.824 casos, incluindo 2.870 mortes.

No resto do mundo, até o dia 1° de março, foram registrados 8.433 casos, com 126 mortos. Os países mais afetados depois da China são a Coreia do Sul (3.736 casos, dos quais 586 são novos, com 18 mortes); a Itália (1.694 casos, dos quais 566 são novos, com 34 mortes); Irã (978 casos, dos quais 385 são novos, com 54 mortes); e Japão (239 casos, dos quais 9 são novos, com 12 mortes).

A doença se caracteriza pela transmissão entre seres humanos e um período de incubação de cerca de duas semanas antes de se manifestar. A taxa de mortalidade é baixa, de cerca de 2%. O que tem preocupado muitos cientistas é o fato de a doença se espalhar rapidamente e ter potencial para infectar um grande número de pessoas. Assim, se o vírus contaminar 200 mil pessoas, por exemplo, ele tem o potencial de provocar 4 mil mortes.

Neste momento, não há uma vacina disponível, nem sequer existe uma previsão. Por todos esses motivos, cientistas e autoridades da saúde pública veem com preocupação a proliferação do novo vírus.

Caos da saúde pública

É evidente que o sucateamento da saúde pública brasileira deixa a população mais pobre vulnerável a uma potencial proliferação do vírus. “O sistema não está bom. O SUS já está trabalhando além do limite, está sobrecarregado e com uma falta de recursos que deve ser agravada com a diminuição do orçamento da Saúde. Em muitos estados, não há governos primando por investimentos na área”, escreveu Cláudia Collucci, especialista em saúde, em artigo ao jornal Folha de S.Paulo.

Não faltam motivos para se preocupar. O já reduzido orçamento da Saúde teve um corte de R$ 9 bilhões em relação a 2019. Isso é consequência do congelamento dos gastos na área social por 20 anos conforme deliberado na Emenda Constitucional 95. Esse dinheiro é tirado da saúde pública para ir direto aos bolsos dos banqueiros, detentores da falsa dívida pública.

O desmonte dos serviços públicos tende a continuar devido à irresponsabilidade e ao descaso dos governos de plantão, defensores incondicionais das políticas de austeridade fiscal que já estão acelerando o sucateamento do SUS. A austeridade fiscal traz como consequência o desmonte das equipes de saúde, o desmonte da vigilância e a despreocupação com estoques de medicamentos e vacinas pelo Ministério da Saúde e pelas secretarias estaduais de saúde.

O principal prejudicado com isso é o povo pobre e trabalhador que depende do SUS para atendimento e prevenção, pois a saúde privada é cara e não tem nenhum foco em prevenção. No entanto, até a classe média e os privilegiados acabam sendo atingidos pelo desmonte do SUS, particularmente no que diz respeito a doenças infecciosas e transmissíveis.

Em 2009, o Brasil enfrentou a gripe H1N1, cujo resultado foram muitos mortos, prontos socorros lotados, longas filas de espera, testes sorológicos não disponíveis e UTIs lotadas.

Outras epidemias

Um dos reflexos do sucateamento do SUS é a explosão de outras epidemias, como o sarampo e a dengue. No ano passado, o Brasil registrou mais de 4.500 casos confirmados de sarampo em 19 estados. O número representa um aumento de 13% em relação ao último monitoramento. Quanto à dengue, ao menos 57.485 casos foram notificados ao Ministério da Saúde em 2020. No ano passado, os casos de dengue aumentaram 600%, com 591 mortes, de janeiro até 24 de agosto.

A eventual chegada do novo coronavírus ao Brasil se somará a essas epidemias e também às gripes e pneumonias que já matam por ano mais de 80 mil pessoas.

SAIBA MAIS

Origem do vírus

Não se sabe exatamente a causa do novo surto. A suspeita é de que a destruição ambiental, associada a feiras para animais selvagens em Wuhan, região da China na qual o vírus surgiu, possa estar relacionada à origem.

Essa suspeita faz sentido. Já se sabe há algum tempo que a destruição das florestas para a implantação de monoculturas intensivas permite a proliferação de novos vírus. A floresta ajuda a manter os vírus potencialmente perigosos sob controle, longe dos humanos. O desmatamento, porém, permite que muitos vetores (animais e insetos) possam propagar os vírus para as cidades.

Um exemplo é o surto de ebola no Congo. Há suspeitas de que a malária – que mata mais de um milhão de pessoas por ano, transmitida por mosquitos, ande de braços dados com o desmatamento. O vírus zika, descoberto em florestas de Uganda no século 20, só pôde cruzar o mundo e infectar milhões de pessoas porque encontrou no Aedes aegpti, mosquito abundante em áreas urbanas, um hospedeiro. O desmatamento e a agricultura intensiva eliminaram as barreiras naturais que normalmente impedem que o vírus estabeleça uma linha de transmissão.

Com as amplas queimadas que aumentam nas florestas tropicais da região amazônica, assim como em partes da África e do sudeste asiático, especialistas expressam preocupação quanto à saúde de quem vive às margens do desmatamento. Eles também temem que as florestas do nosso planeta originem à próxima pandemia. Desse modo, a busca interminável de lucro pelo capital exerce um poder destrutivo sobre o meio ambiente que se volta de maneira mortal a milhares de pessoas que sequer moram perto de uma floresta.

CAPITALISMO

O impacto na economia mundial

Marcos Margarido, de Campinas (SP)

PERU 27 02 2020- O ministério de saúde do Perú apresenta módulos para tratar possíveis casos de coronavírus COVID-19 no Hospital Hipólito Unanue foto Minsa

Baseada no impacto do vírus até agora, a Oxford Economics fez uma previsão de queda do crescimento econômico da China, medido pelo PIB, de 6,1% em 2019 para 5,6% este ano. Isso, por sua vez, reduziria o crescimento econômico mundial em 0,2%, em 2020, para uma taxa anual de 2,3% – o ritmo mais lento desde a crise econômica mundial de uma década atrás.

Isso acontece logo após uma trégua na guerra comercial imposta pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que prometia dar uma folga, tanto à economia chinesa quanto à produção agrícola estadunidense, com a promessa de importação de milhões de toneladas de grãos pela China. Isso agora deve ser revisto, gerando problemas nos próprios EUA.

Ninguém sabe quanto tempo durará o surto de coronavírus, até que ponto se espalhará ou quantos morrerão, mas a tendência ainda é crescente. A presença da economia chinesa no mercado mundial significa que o impacto econômico do atual surto provavelmente excederá o do SARS em 2002. As mudanças na divisão mundial do trabalho, com a introdução da cadeia de valores, na qual um produto depende de componentes produzidos em todo o mundo, formando uma espécie de pirâmide de produção, colaboram com isso. A paralisação da produção de um componente na China pode levar à paralisação de várias fábricas espalhadas pelo mundo.

Isso já pode estar acontecendo. A Apple, que obtém cerca de um sexto de suas vendas da China, anunciou que fecharia suas 42 lojas no país. A Walmart compra grandes volumes de seus produtos de fábricas chinesas enquanto opera 430 lojas no país, inclusive em áreas fechadas por quarentena, com horário de funcionamento reduzido.

NO BRASIL

“Estou adorando”, diz o Rei das Bolsas

O capitalismo aproveita a desgraça alheia para ganhar dinheiro. O coronavírus provocou a queda das bolsas de valores em todo o mundo. Trata-se de um movimento totalmente especulativo que faz um punhado de gente ganhar muito dinheiro.

Na quarta-feira de cinzas, 26 de fevereiro, dia em que as empresas brasileiras amargaram prejuízo de R$ 290,2 bilhões em valor de mercado na Bolsa de São Paulo, o investidor Luiz Barsi disse: “Estou adorando a queda das ações.” Apelidado de “Rei da Bolsa”, ele passou o dia vasculhando o que chama de “oportunidades” e, no final do pregão, havia descarregado mais de R$ 10 milhões em cerca de 1 milhão de ações de empresas.

Tudo isso mostra a necessidade de destruir esse sistema podre que fatura bilhões com a desgraça do povo, enquanto arrasa o sistema de saúde pública e condena milhões à morte.

CIÊNCIA

Brasileiras lideraram sequenciamento do novo coronavírus em apenas 48 horas

Cientistas brasileiros da Universidade de São Paulo (USP) e do Instituto Adolfo Lutz fizerem o sequenciamento genético do novo coronavírus apenas 48 horas depois de confirmado o primeiro caso da doença no Brasil. Esse tipo de informação colabora com o desenvolvimento de vacinas e testes diagnósticos, além de ajudar a entender como o vírus está se dispersando pelo mundo.

Duas mulheres estiveram à frente do sequenciamento. Ester Sabino é diretora do Instituto de Medicina Tropical (IMT) da USP e coordenadora do Centro Conjunto Brasil-Reino Unido para Descoberta, Diagnóstico, Genômica e Epidemiologia de Arbovírus (CADDE), que realiza estudos de epidemias de arboviroses, como zika e dengue. Jaqueline Goes de Jesus é pós-doutoranda na Faculdade de Medicina da USP e bolsista da FAPESP. Ela liderou a equipe que sequenciou o genoma viral junto com Claudio Tavares Sacchi, responsável pelo Laboratório Estratégico do Instituto Adolfo Lutz.

“Ao sequenciar o genoma do vírus, ficamos mais perto de saber sua origem. Sabemos que o único caso confirmado no Brasil veio da Itália, mas os italianos ainda não sabem a origem do surto na região da Lombardia, pois ainda não fizeram o sequenciamento de suas amostras. Não têm ideia de quem é o paciente zero e não sabem se ele veio diretamente da China ou não”, disse Sabino à Agência Fapesp.

Enquanto isso, Bolsonaro ataca a ciência brasileira e corta dinheiro da educação e da pesquisa científica nas universidades públicas, e o ministro da Educação diz que nas universidades públicas só têm “maconheiro e orgia”.