No dia 20 de agosto, completam-se 68 anos do atentado que tiraria a vida de Leon Trotsky por um agente do stalinismo. O assassinato não foi algo inesperado. Era parte de um esforço em eliminar qualquer ligação entre os dirigentes da Revolução de Outubro e as gerações mais jovens

Leon Trotsky lia atentamente um texto entregue a ele por seu assassino. De repente, um golpe violento na cabeça dado pelas costas com uma picareta de alpinista o jogou ao chão.

Mesmo ferido mortalmente, ele se agarrou ao assassino enquanto seus guarda-costas chegavam. Gritou para que não o matassem, para que se descobrisse o mandante do crime.

Era o dia 20 de agosto de 1940. Trotsky foi levado ao hospital ainda lúcido. Em suas últimas palavras, deixou a mensagem de otimismo a seus camaradas em todo o mundo: “Estou próximo da morte, devido ao golpe de assassino político… Por favor, digam aos nossos amigos… Estou certo… da vitória da IV Internacional… continuem”.

Antes de entrar na sala de cirurgia, se despediu carinhosamente de Natasha, sua companheira de muitos anos. Entrou em coma logo depois e morreu no dia seguinte.

O assassino
Ramon Mercader, o nome verdadeiro do assassino, era um agente da GPU, serviço de segurança russo antecessor da KGB. Foi um crime longamente planejado pelo stalinismo. Mercader viajou para a URSS em 1937, lá permanecendo por seis meses. Depois, no México, conseguiu se aproximar pessoalmente de uma secretária de Trotsky, Silvia Ageloff.

A partir daí, se apresentou ao velho revolucionário como um simpatizante de suas idéias. No dia do assassinato, entregou um texto a Trotsky para que ele opinasse. Aproveitando-se de sua distração, assassinou-o pelas costas.

Depois de sair da prisão, em 1961, Mercader foi para URSS, onde foi condecorado com a medalha de “Herói da União Soviética”.

Stalin tenta cortar o fio de continuidade do marxismo
O assassinato de Trotsky não foi algo inesperado. Era parte de uma política consciente do stalinismo de eliminar qualquer ligação entre os velhos dirigentes da Revolução Russa de 1917 com as gerações mais jovens. Era a tentativa de cortar o fio de continuidade do marxismo revolucionário num momento em que se preparava, novamente, uma guerra mundial, com suas conseqüências revolucionárias. Existia a possibilidade de se construir uma alternativa de direção revolucionária ao redor do velho bolchevique russo.

Trotsky pertenceu a uma geração de revolucionários sem precedentes na história. Uma geração que deu respostas teóricas e políticas desde questões relacionadas à organização do partido revolucionário até a construção do poder de Estado pela classe operária.

Ele não foi apenas um dos principais dirigentes da Revolução Russa ou o organizador do Exército Vermelho, como é costumeiramente lembrado. Foi o primeiro a identificar o perigo da crescente burocratização do partido e do Estado operário soviético, que ameaçava as conquistas da Revolução de Outubro.

Dedicou sua vida, a partir da morte de Lenin, a uma luta prática e teórica para libertar o movimento operário internacional da dominação stalinista. Lançou-se numa batalha sem tréguas contra a burocratização e em oposição à desastrosa política da burocracia dirigida por Stalin.

Logo após a ascensão do stalinismo, o revolucionário russo organizou a Oposição de Esquerda e se opôs radicalmente à teoria do “socialismo num só país” defendida por Stalin. Trotsky sustentava que era impossível construir o socialismo limitado às fronteiras nacionais de um país economicamente atrasado como a Rússia. Como Lenin, acreditava que a Revolução Russa era só o princípio da revolução socialista mundial.

Trotsky dedicou os últimos anos de sua vida a construir uma alternativa à desastrosa política dos partidos comunistas, intervindo nos processos revolucionários. Realizou o que em sua própria opinião era “o trabalho mais importante” de sua vida: a construção da IV Internacional.

A perseguição implacável do stalinismo
Em 1927, Trotsky foi expulso do partido, destituído de suas funções no Estado Soviético e, no início de 1928, deportado para o Cazaquistão. No ano seguinte, Trotsky foi banido da URSS e sua condição de cidadão soviético foi cassada.

Trotsky era um homem sem nacionalidade ou cidadania. Começava, assim, uma longa jornada de exílios e expulsões que iniciou na Turquia, passou pela Noruega e pela França, até chegar, finalmente, ao México, em 1937, único país que aceitou o exílio do revolucionário russo.

Quatro anos antes do assassinato, tiveram início os famosos Processos de Moscou contra dirigentes bolcheviques. Neles, foram fuzilados velhos colaboradores de Lenin, como Zinoviev, Kamenev, Bukharin, Antonov-Ovseenko, entre outros. Durante os processos, o próprio Trotsky foi condenado à morte por ser considerado um suposto “agente sabotador do imperialismo”. Nesse período, milhares de ativistas da Oposição de Esquerda já haviam sido atacados, assassinados, presos ou deportados.

A campanha de terror tinha o objetivo de suprimir toda oposição genuinamente socialista contra a usurpação do poder feita pelo stalinismo. O alvo maior do stalinismo era atacar os que estavam junto com Trotsky. Em fevereiro de 1937, Leon Sedov, filho de Trotsky, foi morto em Paris. Às vésperas da fundação da IV, Rudolf Klement, secretário de organização da nova Internacional, foi assassinado, e o projeto de estatutos foi roubado.

Em 24 de maio de 1940, se deu a primeira tentativa de assassinato de Trotsky. Um bando de assassinos stalinistas, liderados pelo pintor David Siqueiros disparou rajadas de balas contra a casa do revolucionário que escapou do atentado.

Na segunda tentativa, conseguiram seu objetivo. Stalin havia, finalmente, liquidado o último dos grandes dirigentes bolcheviques da Revolução de Outubro.

O stalinismo foi julgado pela história
O stalinismo procurava desarticular a recém-fundada IV Internacional. Possui um grande significado o fato de Stalin, que naquele momento dirigia um Estado operário e tinha influência em partidos de massas de todo o mundo, ter de recorrer a um assassinato pelas costas de um velho de 61 anos.

Hoje, o aparato stalinista desabou. Mesmo o que resta dos partidos stalinistas rejeita a vinculação com Stalin. Por outro lado, a IV Internacional sobreviveu e está sendo reconstruída. Obviamente, o assassinato do principal dirigente da Internacional foi uma perda colossal.

Mesmo assim, o stalinismo não conseguiu suprimir o legado teórico e político do revolucionário russo. Suas obras constituem uma extraordinária contribuição para a teoria marxista. Um legado para as novas gerações de revolucionários que mantêm viva a sua luta em defesa do socialismo e da IV Internacional.