Obama aproveitou crise para impor cortes

No primeiro dia de agosto saiu o esperado acordo entre os democratas e republicanos nos EUA para evitar o calote nos títulos do tesouro. Como o teto de 14,3 trilhões de dólares da dívida pública tinha sido atingido, era necessário um acordo no congresso para elevar esse limite. Caso o acordo não saísse, ocorreria o que seria impensável para os mercados: um calote na dívida pública dos EUA, que era considerado o investimento mais seguro do mundo, por ter como garantia o estado da economia imperialista dominante.

Vitória republicana
O acordo foi uma clara vitória republicana. Obama estava de acordo com cortes no orçamento, mas defendia também aumentos nos impostos para as grandes empresas e os mais ricos, que tinham sido beneficiados com grandes isenções por Bush. Mas recuou e aceitou o plano republicano, só com redução de gastos. Um primeiro corte já definido de 973 bilhões de dólares e outro, de 1,5 trilhões a serem determinados por uma comissão mista democrata- republicana até novembro.

O acordo dividiu tanto os democratas como os republicanos. Metade dos parlamentares democratas votou contra o acordo, assim como os representantes do Tea Party (ultradireita republicana). Mas o acordo não foi simplesmente, como está sendo divulgado, uma capitulação de Obama para os republicanos. Na verdade, o próprio Obama mudou sua política, e usou o acordo com os republicanos para legitimar esse recuo.

Como analisava um jornal socialista dos EUA (Socialist Worker): “De fato, Obama não capitulou aos republicanos de direita. Eles o livraram das altas expectativas dos eleitores que o elegeram para trazer ‘mudança´ em meio à pior crise econômica desde a década de 1930.”

Mais um fracasso
O governo norte-americano vinha mantendo uma política expansiva desde o início da crise econômica em 2007. Mesmo quando os governos europeus já giravam para os planos de austeridade, Obama apresentou o chamado relaxamento quantitativo (QE2, na sigla em inglês), lançando mais 600 bilhões de dólares para as grandes empresas. O imperialismo se aproveitava de seu papel hegemônico, tendo o dólar como moeda de reserva mundial, para imprimir dólares e reforçar os bancos norte-americanos. Junto com isso, buscava recuperar terreno nas exportações dos EUA.

De conteúdo, esse plano fracassou. A economia dos EUA, apesar dos brutais ataques aos trabalhadores com a conseqüente elevação da taxa de lucros, não recuperou um nível de investimento que permitisse alavancar o crescimento econômico. Foi se impondo uma clara desaceleração: o crescimento veio baixando em 2010 entre o primeiro e o quarto trimestre (3,9%, 3,8%, 2,5% e 2,3%), recuando ainda mais em 2011 (0,4% no primeiro trimestre e 1,3% no segundo). O desemprego segue alto, com um índice oficial de 9,2%. Na realidade, um em cada quatro trabalhadores norte-americanos está desempregado ou subempregado.

Dívida impagável
Por outro lado, a dívida explodiu, subindo 55% desde o início da crise em 2007. O déficit fiscal anual norte-americano atingiu 1,6 trilhões de dólares, chegando a um limite explosivo. Simplesmente a dívida não pode ser paga. Antes da crise econômica, o governo dos EUA arrecadava 18% do PIB de impostos e gastava 20%, tendo um déficit anual e uma dívida grande mas administrável. Agora a arrecadação alcança 15% do PIB e os gastos 25%. O país imperialista hegemônico mostra sua decadência: tem uma dívida impagável.

Com a economia estagnando e a dívida explodindo, Obama está mudando sua política. Usa o acordo com os republicanos para se aproximar de uma política semelhante às dos governos europeus, com severos planos de austeridade.

No entanto, nem mesmo em relação à dívida, o acordo tem condições de estabilizar a situação. Apesar de impor um corte orçamentário inédito na história dos EUA, não existe perspectiva real de equilibrar essa dívida. Ao contrário, o efeito recessivo dos cortes vai terminar por frear ainda mais a economia, apontando para uma nova recessão. A redução da produção vai implicar em menor arrecadação de impostos e novas crises da dívida.

O que virá?
O efeito recessivo dos cortes vai aprofundar brutalmente os ataques aos trabalhadores nos serviços sociais. Terá também um reflexo duro em estados e cidades já em crise. Existem informes de mais de cem cidades importantes com severos problemas orçamentários para bancar despesas mínimas, além do estado da Califórnia.

O rebaixamento da qualificação dos bônus do Tesouro dos EUA debilita e faz ainda mais instável o sistema de moedas mundial, desencadeando de imediato uma queda generalizada nas Bolsas em todo o mundo. Não há moeda alternativa, assim como não existe um pólo imperialista alternativo. Se existiam dúvidas sobre o tema basta ver a crise do euro.

Até agora, apesar dos ataques duros, não tem havido uma resposta a altura pelo proletariado norte-americano. Agora, com essa nova onda de ataques, teremos de ver se os trabalhadores dos EUA acompanham o proletariado europeu nas grandes lutas já começadas.