Abalos no mercado financeiro são sinais de uma crise bem realEm 2003, enquanto as tropas norte-americanas invadiam Bagdá, o folclórico ministro da Informação de Saddam Hussein, Al Sahaf, tornou-se piada no mundo inteiro por conta de suas mentiras. Em meio aos bombardeios, Al Sahaf declarava aos jornalistas que estava tudo normal e que os americanos não haviam entrado na capital do país.
Tal situação repete-se agora com os responsáveis pela economia mundial. Diante de uma crise no sistema financeiro que fez desabar as bolsas do mundo inteiro nas últimas semanas, FMI e governos tentam espalhar a calma e conter o alarme.

Os bancos centrais das principais potências colocaram dinheiro no mercado financeiro numa ação nunca vista. Entre os dias 9 e 10, o Fed (Federal Reserve), dos Estados Unidos, o BCE (Banco Central Europeu), da Europa, e o Banco do Japão injetaram US$ 323 bilhões nos mercados, na forma de empréstimos. Só o BCE emprestou US$ 130 bilhões a bancos europeus.

Crise nos Estados Unidos
A queda nas bolsas é mais um capítulo da chamada crise imobiliária dos Estados Unidos. Durante a década de 90, o mercado de crédito imobiliário experimentou um crescimento espantoso nesse país. Os bancos ofereciam empréstimos a juros mais baixos tomando imóveis como garantia. Além de comprar casas, uma parte da população hipotecou a sua própria para obter crédito a juros baixos.

Esse mercado cresceu muito e provocou a supervalorização dos imóveis e a multiplicação das linhas de crédito. Os bancos deram crédito mesmo para pessoas inadimplentes ou que não podiam comprovar renda, formando a categoria “subprime”, ou seja, o empréstimo de risco. Além disso, os bancos transformaram os empréstimos em ações, vendendo-os para fundos de investimento no mercado financeiro.

Isso funciona como uma daquelas “correntes” tão conhecidas dos brasileiros, dirigidas por espertalhões, que crescem enquanto existem cada vez mais pessoas dispostas a ampliar a corrente. Agora os sinais de uma próxima crise estão aparecendo – menos pessoas querem comprar casas e mais pessoas não podem pagar esses empréstimos. Se não entra dinheiro em uma ponta, todo o sistema começa a cair. Isso gera uma reação em cadeia que está balançando o mundo financeiro.

A mais recente onda de pânico ocorreu quando o BNP Paribas, um grande banco francês, congelou três fundos de investimento no mercado “subprime” dos Estados Unidos no último dia 9. Tal iniciativa provocou a debandada generalizada dos investidores. Para pagá-los, os fundos são obrigados a vender ações e papéis, forçando a queda nas bolsas e a desvalorização das ações.

Crise financeira anuncia o fim do ciclo
Inúmeros analistas, geralmente ligados a grandes bancos e fundos, afirmam que a crise não oferece perigo enquanto permanecer limitada aos mercados financeiros, como se estes fossem entidades abstratas absolutamente desligadas da chamada economia real. No entanto, existe sim uma crise e ela é bem real.

Se os mutuários não podem pagar suas dívidas, é porque algo ocorre na economia norte-americana. A tão esperada desaceleração parece não ser tão suave como muitos acreditavam. Uma recessão no coração do império teria efeitos devastadores em todo o mundo. Só para se ter uma idéia, as crises que balançaram os mercados no final da década de 1990 tiveram como centro mercados periféricos, como México, Ásia e Rússia.

Isso anuncia a próxima crise cíclica do capitalismo internacional, que poderá vir no próximo período. Com o chão tremendo, os “analistas” financeiros e o FMI correm o risco de ficarem falando sozinhos.

Economia dependente torna o Brasil vulnerável
A queda da bolsa no Brasil reflete o caráter dependente do país em relação aos EUA. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, e o diretor do Banco Central, Henrique Meirelles, por sua vez, reafirmaram o mito dos “fundamentos sólidos” da economia.

Porém, a estabilidade da economia no Brasil está diretamente apoiada no crescimento da economia internacional. Isso se reflete aqui na balança comercial favorável (o país mais vende do que compra), na moeda estável e nos investimentos estrangeiros. A estrutura semicolonial do país, no entanto, arrastará o Brasil na esteira da recessão norte-americana. O país venderá menos para os EUA e para a China, o que afetará a balança comercial. Os investimentos estrangeiros secarão e o dólar subirá.

Segundo reportagem do jornal britânico Financial Times, os investidores já perceberam a fragilidade do país e ensaiam uma debandada. “O Brasil está claramente mais exposto à economia global e aos mercados financeiros globais do que antes”, chegou a afirmar um analista financeiro ao jornal. Um dos motivos para a vulnerabilidade do país, segundo o próprio periódico neoliberal, é a alta dívida contraída no exterior.

O governo afirma ainda que as reservas internacionais (moeda estrangeira mantida pelo Banco Central) asseguram o país contra a instabilidade internacional. No entanto, tais reservas são acumuladas pela venda de títulos públicos, o que, além de garantir lucros aos banqueiros e investidores, aumenta ainda mais a dívida pública. Este é um dos motivos pelos quais a dívida interna vem batendo recordes, já estando ao redor de R$ 1,2 trilhão. A abertura da economia torna o país mais dependente de tudo o que ocorre na economia internacional. E a enorme dívida pública torna essa economia muito mais frágil perante qualquer crise.

A estabilidade econômica foi um dos principais sustentáculos políticos do governo Lula, apesar dos inúmeros escândalos que abalam permanentemente seu mandato. Com a crise que desponta, o governo terá que aplicar ainda mais duramente seu plano neoliberal com as reformas. Isso poderá ajudar a tirar a máscara desse governo de direita, fantasiado de “esquerda”.

A farra dos banqueiros
Nunca antes neste país, como diria Lula, os bancos lucraram tanto. O Itaú anunciou lucro recorde de R$ 4,016 bilhões no primeiro semestre de 2007, um aumento de 35,8% em relação ao mesmo período do ano passado. O banco passou o Bradesco, cujo lucro foi de “apenas” R$ 4,007 bilhões, valor 27,9% superior ao mesmo período de 2006.
Tal recorde viria principalmente do aumento de juros dos empréstimos, que teriam dado aos bancos R$ 45 bilhões. Os bancos tomam dinheiro a juros baixos e emprestam a juros altos, o famoso “spread”, que chega a 34,7%.
Além disso, cada vez mais os lucros dos bancos são conseguidos por meio de absurdas taxas. Em 2006, a população pagou R$ 45,4 bilhões em tarifas, taxas e serviços aos bancos e suas subsidiárias. Com isso, no ano passado, por exemplo, apenas a receita das tarifas cobriu 115% das despesas com folha de pagamento de funcionários. Ou seja, só com os recursos das taxas, os bancos pagam todos os salários e ainda obtêm lucro.

LEIA TAMBÉM:

  • Publication Date