Depois de 26 anos lutando contra uma doença rara, a esclerose múltipla, perdemos nossa querida camarada Silvana. Na ensolarada tarde de segunda-feira, dia 10 de março, ela nos deixou, depois de sofrer uma complicação respiratória. No velório do Cemitério do Araçá, em São Paulo, muitos amigos, familiares, seus lindos e doces filhos Paula, Aninha e Luiz, já adultos, seu querido ex-companheiro Walter, nos abraçamos e choramos junto com muitos companheiros da velha guarda da Convergência Socialista a perda de nossa querida Silvana. Mas muito mais que lágrimas, o que se viu foram sorrisos.

Nos  alegrava muito lembrar da Silvana e daqueles gloriosos tempos da CS, em que lutamos ombro a ombro contra a ditadura militar, contra a repressão, quando juntos nos desbancávamos todos para São Bernardo, no estádio de Vila Euclides, para levar nosso apoio às lutas metalúrgicas. Silvana nos trouxe tudo isso de volta. Porque ela, militante abnegada e, ao mesmo tempo, muito amorosa, simboliza para nós hoje aquela época de nós mesmos e de que tanto nos orgulhamos.

Silvana começou a militar ainda jovem, em São José dos Campos, nas fileiras do PT, como ocorreu com muitos de nossa geração. Era 1979 e a luta contra a ditadura, a repressão e em apoio às greves crescia no Brasil. Silvana logo tomou consciência de que era preciso ir mais longe e, junto com seu companheiro Walter, ingressou nas fileiras da CS e passou a dedicar todos os seus momentos livres (e os não-livres também) que lhe sobravam depois de um dia inteiro de trabalho, à construção do partido revolucionário.

A maior parte de sua vida partidária, Silvana passou dentro das modestas salas que serviam de redação para o jornal Convergência Socialista. Em meio às velhas e barulhentas máquinas de escrever, sobre as quais nos lançávamos com toda fúria a parir artigos denunciando o regime e divulgando avidamente cada uma das lutas  dos trabalhadores, por menor que fosse, nossa pequena equipe de jornalistas revolucionários passávamos horas a fio. A maioria de nós chegava à “redação” no final da tarde, depois de deixarmos nossos empregos regulares. E ficávamos ali, trabalhando incansavelmente, muitas vezes até o avançar da madrugada. Silvana, sempre sorrindo, era a única de nós que tinha carro, um velho gol que ela nunca levava ao mecânico. E depois do “expediente”, nos deixava cada um em sua casa, pra que a repressão não nos pegasse!

Mesmo trabalhando 8 horas por dia e cuidando de seus três filhos pequenos, Silvana estava sempre lá, na nossa petit redação. Era a única de nós que falava italiano, inglês, francês e espanhol. E dominava tão bem o português que era a responsável por corrigir todos os artigos, depois, claro, de ter escrito sua página sobre Política Internacional. Tínhamos plena confiança em seu tino, sua seriedade, sua inteligência. Jogávamos nossos artigos em suas mãos com a maior tranqüilidade, e íamos para a pequena cozinha, preparar o café e os sanduíches que comíamos todos juntos, para renovar as forças e continuar trabalhando.

Sempre dedicada ao partido e mesmo correndo riscos, Silvana abrigou em sua casa vários companheiros que vinham do exterior ou de outros estados brasileiros para os congressos e conferências.  Fazia inúmeras traduções para nossa Internacional e sempre estava disposta a emprestar sua escrita clara, precisa e sem demonstrações gratuitas de erudição para a literatura partidária.

Com sua imensa docilidade, Silvana trazia dentro de si a força de uma militante revolucionária, consciente do tamanho da empreitada à qual estava se dedicando.  Mulher consciente, sabia enfrentar a opressão e defender-se contra os maus-tratos da vida. Com isso, construiu uma família unida. Soube manter uma sólida amizade com seu ex-companheiro Walter, que a respeitava imensamente porque via nela uma companheira de luta para toda vida e todas as horas. Filhos maravilhosos, conscientes e que, cada um a seu jeito, se conservaram militantes ou amigos do partido até hoje.

No velório, Silvana trazia no peito dois broches: um do PSTU e outro da LIT. Suas filhas nos disseram: eram os dois grandes projetos de sua vida, por isso fizemos questão de que ela os levasse no peito.

Silvana se foi. Nos deixou aqui, tristes com sua partida mas ao mesmo tempo firmes e fortes para levar adiante seus projetos, que também são os nossos e que não vamos deixar a meio caminho. Mesmo porque, Silvana nos daria uma bronca daquelas! Ela nos deixa saudades, mas também muito orgulho por termos tido a sorte de conhecê-la um dia e de  termos compartilhado com ela alguns dos melhores tempos de nossas vidas.