Ato exigiu legalização do aborto, fim da violência e da exploração
Diego Cruz

O 8 de Março classista, em São Paulo, superou todas as expectativas da organização. Na manhã deste sábado, centenas de pessoas tomaram a avenida Paulista para resgatar a tradição de luta das mulheres trabalhadoras. Organizado pela Conlutas, o ato reuniu mais de 700 trabalhadoras, trabalhadores, jovens, militantes dos movimentos sociais.

Ao som de músicas e palavras-de-ordem, os manifestantes saíram em caminhada da Praça Osvaldo Cruz até o Museu de Arte de São Paulo (Masp). Legalização do aborto, violência, trabalho doméstico, salários baixos e retiradas de direitos foram alguns dos temas que se destacaram no ato. Esses pontos se expressaram em palavras-de-ordem como “legalizar o aborto, direito ao nosso corpo”, “meninas em cadeias estupradas no Pará, abuso de mulheres não podemos aceitar” e “a mulherada está na rua, a mulherada está aqui, abaixo as reformas do FMI”.

Camila Lisboa, estudante da Unicamp e membro da Conlute, ainda na concentração deixou nítido o caráter da manifestação. “Este ato é uma resposta às governistas da Marcha Mundial de Mulheres que estão fazendo um ato para aplaudir as reformas do governo Lula”, disse.

Um recado ao governo e aos patrões
O divisor de águas que impediu a unidade com a Marcha Mundial de Mulheres (MMM) foi o governo Lula. Enquanto as mulheres da Marcha se recusavam a combater os ataques do governo à aposentadoria, aos direitos trabalhistas, à licença maternidade, ao direito ao aborto, entre tantas outras coisas, as mulheres da Conlutas resolveram ir à luta até as últimas conseqüências para combater o machismo e a exploração.

Referindo-se ao ato da MMM que aconteceria no centro da cidade, Janaína Rodrigues, da Conlutas, disse que “aquele ato da Praça Ramos não é conseqüente porque omite a culpa do governo Lula”. “Este é um ato de oposição aos governos Lula e Serra, um ato declaradamente classista”, deixou claro. Janaína também fez um chamado aos homens trabalhadores a lutarem ao lado das mulheres contra a exploração.

Representando o PSTU, Carol Rodrigues falou que “o verdadeiro socialista é aquele que luta pelo feminismo, que toma em suas mãos as bandeiras das mulheres”. Ela ressaltou as diversas formas de opressão sofridas no dia-a-dia pelas mulheres, destacando índices de violência, subempregos e salários baixos.

Uma luta internacional
O ato contou com a presença da sindicalista da África do Sul Sheri Hamilton. “Eu estou muito orgulhosa de estar aqui hoje, porque esse dia está sendo comemorado lá na África do Sul também”, disse.

Sheri falou que a legalização do aborto em seu país foi conquistada graças à luta incansável das mulheres sul-africanas. Os índices de mortalidade de mulheres diminuíram 90% depois disso. Ela defendeu a luta internacional contra a opressão. “Devemos levar para o mundo a defesa do socialismo, única forma de garantir os direitos”, concluiu.

Cecília Toledo, da Liga Internacional dos Trabalhadores (LIT-QI), fez uma saudação às mulheres do mundo inteiro, destacando haitianas, palestinas, mexicanas e latino-americanas em geral. Ela destacou os ataques do imperialismo no Oriente Médio e a superexploração nas multinacionais e maquiladoras da América Latina. “A luta da mulher é internacional, a nossa emancipação só virá com o fim da exploração, é uma luta sem trégua”, declarou. Para ela, o ato foi “um recado ao Lula, ao imperialismo e a Bush de que não aceitamos a opressão e a exploração, as mulheres estão lutando”

A manifestação teve direito, ainda, a esquetes teatrais e culminou com uma “Festa das Bruxas”. O tema foi uma homenagem às mulheres mortas, violentadas e perseguidas justamente por serem mulheres. E também um grito de negação à mercantilização feminina e à opressão em geral. O tema da festa era o famoso refrão de Rita Lee, da música Pagu: “nem toda feiticeira é corcunda, nem toda brasileira é bunda”.

Unidade para construir uma alternativa
Foi a primeira vez que entidades e organizações de esquerda construíram, em São Paulo, um ato em comemoração ao Dia Internacional de Luta da Mulher separado da Marcha Mundial de Mulheres. A Coordenação Nacional de Lutas (Conlutas) foi a principal impulsionadora da mobilização.

Alguns setores da esquerda, infelizmente, preferiram participar do ato governista, argumentando que essa seria a atividade que reuniria a massa e apostando no fracasso do ato classista. Não foi o que se viu. O ato da MMM aconteceu à tarde, no centro de São Paulo. Segundo dados da Polícia Militar, a Marcha reuniu 800 pessoas. A organização, no entanto, estima que participaram 5 mil.

O 8 de Março classista, convocado pela Conlutas, mostrou que é possível construir uma alternativa para as mulheres trabalhadoras independentemente do governo e das políticas assistencialistas, como o Bolsa Família e outras esmolas. A participação de centenas de pessoas e sua disposição de luta provaram que a luta contra a opressão passa pela luta contra a exploração de toda a classe trabalhadora. E esse ato poderia ter sido ainda mais grandioso – e talvez até maior que o da MMM – se as companheiras do PSOL e da Intersindical tivessem construído junto com a Conlutas.

Participaram, também, diversos movimentos feministas – grupo Vozes contra a Violência, Movimento de Mães sem Creche, entre outros – sindicatos, entidades estudantis, movimentos populares – como a ocupação Pinheirinho, que veio de São José dos Campos -, a Conlute, o PSTU, setores do PSOL e a Liga Estratégia Revolucionária.

Atualizada em 10/3/2008, às 19h20