Punir os repressores do passado é fundamental para lutar contra os repressores de hoje e de amanhãExigir punição exemplar para agentes do Estado que cometeram crimes como prisões arbitrárias, sequestros, ocultação de cadáveres, estupros e tortura não tem nada a ver com revanchismo ou revirar o passado. Tem a ver com garantir o presente e o futuro.

A certeza da impunidade é o que faz com que agentes (policiais, juízes, embaixadores, funcionários do Poder Judiciário e do sistema prisional) continuem cometendo crimes e desacatando a legislação. Ter a certeza da investigação e da punição, mesmo que seja futura, intimidará qualquer funcionário do Estado a cometer crimes e arbitrariedade.

É por isso que os agentes da repressão não querem permitir a apuração e o julgamento dos crimes do passado. Punir os repressores do passado é fundamental para lutar contra os repressores de hoje e de amanhã. Uma necessidade para defender as organizações operárias e populares.

É uma obrigação da presidente Dilma, que já esteve envolvida na luta armada contra a ditadura e foi presa e torturada como muitos combatentes, garantir uma profunda apuração destes crimes e efetivar a punição dos criminosos.

Por uma Comissão da Verdade, Memória e Justiça
A formação desta Comissão Nacional da Verdade é uma conquista da luta de muitos brasileiros que se mobilizaram pela sua formação e também pela punição dos crimes cometidos pela ditadura. Mas também é cercada de limitações.

A primeira delas é que a comissão é indicada direta e totalmente pela presidenta Dilma, e não pelas organizações de direitos humanos e do movimento sindical e popular, portanto, carece de independência. Isso passa a ser um problema quando identificamos que até o momento o governo teve uma política, no mínimo, tímida em enfrentar os golpistas.

Além disso, a Comissão institui um longo tempo de investigação (de1946 a 1988, abrangendo o período do Estado Novo até a Constituição Federal), como um pequeno número de membros para averiguar tantos crimes em um curto período de dois anos.

Mas sua maior debilidade é que somente terá poderes para investigar os crimes cometidos, e não de aplicar punições aos que cometeram estes crimes.
O Brasil precisa de uma Comissão da Verdade, Memória e Justiça que, além de identificar os agentes da repressão policial, civil e militar, determine a responsabilização de cada um dos envolvidos nos crimes, realize seu julgamento e dê punições exemplares aos culpados.

Mesmo assim, as investigações da Comissão da Verdade podem servir de base para a punição dos criminosos com as mudanças a serem feitas na Lei da Anistia. Para isso é necessário que organizações de direitos humanos, sindicatos e entidades populares se mobilizem para que uma profunda investigação seja feita, exigindo a abertura dos arquivos secretos e documentos sigilosos das Forças Armadas, do SNI e do Itamaraty, além da identificação de todos os funcionários envolvidos, de policiais a embaixadores.

A Comissão da Verdade também deverá se pronunciar oficialmente se o que houve no país foram atos terroristas ou uma luta de resistência dos setores do povo brasileiro contra um regime de exceção.

Romper o limite da Lei de Anistia
Em 2010, o Supremo Tribunal Federal tomou uma decisão de que a Lei da Anistia impediria julgamentos de atos praticados durante o regime militar. Essa decisão, além de incorreta, pois reverte o conceito de como devem ser julgados os crimes contra a humanidade, é ilegal. Uma decisão judicial não pode estar acima da defesa dos cidadãos, nem servir para proteger criminosos ou encobertar crimes.

Os tribunais penais internacionais há décadas trabalham com o postulado de “crime contra a humanidade”, e o Brasil o reconhece sendo signatário de convenções que protegem os direitos humanos.

Por isso, a Comissão Interamericana da OEA decidiu que o Estado brasileiro deve investigar a morte do jornalista Vladimir Herzog, ocorrida no DOI-Codi de São Paulo, em 1975. Assim como condenou o Brasil, em dezembro de 2010, pelo desaparecimento de militantes na Guerrilha do Araguaia. Este organismo determinou, entre outras coisas, que o Estado faça a investigação plena e puna os responsáveis por detenções arbitrárias, torturas e desaparecimentos de 70 pessoas entre 1972 e 1975.

Tortura Nunca Mais
No Brasil, nenhum torturador nunca foi julgado, tampouco punido. Cadáveres continuam ocultos. Arquivos das Forças Armadas ainda não foram abertos.

Somente em 2008, a Marinha liberou a documentação da Revolta da Chibata, junto com uma nota onde diz que foi uma rebelião ilegal sem qualquer amparo moral ou legitimo.
Apenas em 1993, as Forças Armadas reconheceram oficialmente a Guerrilha do Araguaia.

Esta é a referência criminosa para os funcionários da repressão que deve ser imediatamente transformada.

Remover o entulho autoritário
O Conselho de Direitos Humanos da ONU pediu para que Brasil trabalhe para a supressão da Polícia Militar, acusada de numerosas execuções extrajudiciais.

Isso porque o modelo policial brasileiro está esgotado, fundamentalmente porque foi montado nos anos da ditadura militar para a segurança do Estado totalitário, baseado na ideologia da segurança nacional. O decreto-lei 667, de 2 de julho de 1969, atribuiu ao Ministério do Exército o controle e a coordenação das Polícias Militares por intermédio do Estado Maior do Exército em todo o território nacional.

Ocorre que a ditadura foi derrubada pelo povo brasileiro, mas seu aparato de repressão continua funcionamento sobre a mesma estrutura e base ideológica.

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