O governador do estado de São Paulo, João Dória, participa da solenidade de abertura do Congresso do Latam Retail Show 2019. Foto: Governo do estado de São Paulo
Marina Cintra, de São Paulo (SP)

Marina Cintra e Dênio Sarôa, de São Paulo (SP)

O governador do estado de São Paulo, João Doria (PSDB), mandou recolher o material didático elaborado pela Secretaria da Educação que fora distribuído no início do semestre aos alunos do 8º ano do Ensino Fundamental da rede estadual de ensino. O motivo para o recolhimento da apostila foi um texto na disciplina de Ciências em que se apresentava os conceitos de sexo biológico, identidade de gênero e orientação sexual, apresentando a definição de termos como “transgênero”, “cisgênero”, “homossexual” e “bissexual”.

Um trecho do texto registra: “podemos dizer que ninguém ‘nasce homem ou mulher’, mas que nos tornamos o que somos ao longo da vida, em razão da constante interação com o meio social”. Também no texto há orientações sobre gravidez e doenças sexualmente transmissíveis. Segundo Doria, em seu Twitter, o governo teria sido alertado “de um erro inaceitável no material escolar dos alunos do 8º ano da rede estadual”, levando o governador a solicitar ao Secretário de Educação o imediato recolhimento do material e apuração dos responsáveis por não concordar e nem aceitar “apologia à ideologia de gênero”. Em nota, a Secretaria da Educação de São Paulo afirma que o termo “identidade de gênero” estaria em desacordo com a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) do MEC e com o Novo Currículo Paulista aprovado em agosto, e que a apostila é complementar ao estudo dos alunos. Vale ressaltar que, em 2017, o governo Temer retirou o termo “orientação sexual” da BNCC para o Ensino Infantil e Fundamental da educação básica brasileira.

A medida adotada pelo governo paulista na última semana causou alvoroço em todo o estado, pois segundo alguns relatos de professores, em algumas situações as aulas foram interrompidas por funcionários das escolas, que solicitaram aos alunos que depositassem as apostilas em sacos pretos para que fossem recolhidos, conforme orientação do Secretário da Educação, Rossieli Soares. O Ministério Público em São Paulo (MP-SP) instaurou nesta quarta-feira (4), um inquérito civil para apurar o recolhimento e a inutilização de material didático. A Promotoria vê “possível violação do direito à educação”, “infração aos princípios constitucionais do ensino” e “eventual lesão ao erário” na decisão de recolher o material destinado para adolescentes do 8º ano do fundamental das escolas estaduais.  Não foi só em São Paulo, mas também no Rio de Janeiro, onde o prefeito Marcelo Crivella mandou recolher HQs que contavam a história de dois meninos que se apaixonavam. Na opinião do prefeito, aquilo também é conteúdo “impróprio”.

O governador de São Paulo, em julho desse ano, anunciou também que queria fazer um projeto para “aumentar a segurança” nas escolas. De acordo com o governador, esse projeto seria para colocar policiais militares fora de serviço para fazer ronda nas escolas e também policiais para fazer palestra nas escolas. No mesmo dia, anunciou também que vai levar à Assembleia Legislativa propostas com medidas punitivas para alunos com atos violentos ou que depredem a escola.

Essa é uma lei muito parecida com a já implementada no Chile, conhecida como “lei aula segura”, que serve para punir os alunos transgressores. Sabemos muito bem que isso serve de margem à repressão aos estudantes que lutam, que se organizam dentro de suas instituições de ensino. É só olharmos o exemplo chileno, em que no último mês a juventude estava lutando em defesa da educação pública e foram reprimidas dentro de suas escolas, por policiais militares utilizando bombas e cachorros. Vários alunos menores de idade ficaram feridos.  Além de tudo isso, Doria já declarou algumas vezes ser a favor do “Escola Sem Partido”, projeto esse que busca reprimir estudantes e professores.

Numa situação de crise do capitalismo, em que os governantes dizem não ter dinheiro para educação, saúde, moradia, entre outros, é muito contraditório que os governantes mandem retirar apostilas que custou milhares de reais para serem produzidas e distribuídas. É tão contraditório que o próprio Ministério Público Estadual mandou devolver a apostila aos alunos.

Para piorar ainda mais a questão, estamos vivendo um cenário em que a violência contra os LGBTs, as mulheres, os negros vêm aumentando. O Brasil é o país em que mais morrem pessoas LGBTs no mundo. Em 2018 foram registrados uma morte a cada 20 horas por assassinato ou suicídio de pessoas em razão da LGBTfobia. Na noite do último dia 6, em Fortaleza (CE), um homem trans de 20 anos foi amarrado em um poste e assassinado com três tiros na cabeça. Logo depois da execução teve o corpo arrastado, segundo testemunhas.  Esse é mais um exemplo da situação de vulnerabilidade e violência em que se encontram as LGBTs.  Dessa forma, a ação de Dória e de Crivella devem ser veementemente repudiadas! Ações como essa, bem como as diversas declarações LGBTfóbicas de Bolsonaro e seus ministros, contribuem para o aumento da violência, sem falar que tudo isso também é censura e devemos também repudiar a ingerência conservadora do governo e do MEC dentro das instituições de ensino.

Bolsonaro, Doria e Crivella estão na contramão das reais necessidades dos estudantes, professores e da comunidade. Todos estão aliados a projetos conservadores e de aliança com empresários, que querem cada dia mais transformar a educação em mercadoria, para servir de lucro.

Nós defendemos mais verbas para a educação pública! Somos contra qualquer tipo de privatização, seja na educação básica, através da reforma do Ensino Médio ou nas universidades, através do “Future-se”! Dizemos não a qualquer tipo de repressão ou censura dentro das escolas e universidades, é preciso ter debates dentro das escolas de gênero e sexualidade, bem como aulas de história da África e dos afrodescendentes, que é uma forma de também combater os preconceitos na sociedade como um todo. É por isso que precisamos ser contra o projeto “Escola Sem Partido” e contra a Polícia Militar dentro das escolas. Precisamos de uma greve geral na Educação!

E, por fim, defendemos escolas democráticas, em que os alunos, funcionários e professores possam escolher sobre os rumos da escola e da educação! Esse é apenas um começo para termos uma educação mais decente, entretanto, só através de uma revolução que teremos um outro tipo de educação, realmente voltado para a sociedade. Venha nessa luta com a gente!