Más condições do clima, altos custos dos combustíveis e grande demanda são citados como os fatores que elevaram os preços dos alimentos em todo o mundo. No entanto, poucos relacionam esse problema à crise econômica que começou nos Estados Unidos e começa a se espalhar pelo mundo.

Além disso, a especulação com os produtos agropecuários (as chamadas commodities) é grande. Basta ver como os preços dos alimentos no mercado internacional chegaram a níveis absurdos, enchendo os bolsos dos empresários do agronegócio no Brasil, por exemplo. Nessa jogatina, os consumidores mais pobres, a grande maioria, levam a pior.

Na África, onde a situação de pobreza é gritante, os preços de alguns alimentos básicos subiram mais de 50% nos últimos meses. O arroz, por exemplo, base da alimentação de muitos países, deve ter produção recorde este ano, segundo a FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação). O crescimento está próximo de 3,6%, ou 23,2 milhões de toneladas. No entanto, os preços devem seguir altos.

Seguem alguns episódios de luta dos africanos por comida e sobrevivência.

SENEGAL: Em 30 de março, a polícia usou bombas de gás lacrimogêneo e porretes elétricos para dispersar a manifestação organizada pela Associação de Consumidores do Senegal (ASCOSEN) para protestar contra a alta recente do preço do arroz, do óleo e do sabão. Segundo autoridades de Dakar, a manifestação estava proibida. Pelo menos 24 pessoas foram presas. A organização de direitos humanos RADDHO condenou os atos das forças de segurança, que classificou como “inomináveis”.

Abdoulaye Bathily, um dos líderes da oposição, declarou que o Senegal é uma bomba que poderia explodir a qualquer momento. O governo tratou de colocar toda a culpa no “fenômeno mundial” da fome e acusou a oposição de incitar os jovens à baderna.

O presidente Abdoulaye Wade disse, no fim de abril, que não havia nem haveria fome no Senegal. Ironicamente, ele disse isso na inauguração de um modelo de fazenda destinado a ressuscitar a agricultura no país.

No dia 26 de abril, milhares de pessoas protestaram pacificamente em Dakar, carregando cestos vazios de arroz, tomate e outros alimentos para mostrar que estavam com fome. Também traziam cartões vermelhos, simbolizando o desejo de que o presidente deixe o cargo. Foi o primeiro protesto nos últimos três anos sem repressão por parte da polícia.

Após a violenta manifestação de 30 de março, o governo passou a semear uma dúvida: haveria fome no país ou apenas uma crise alimentar similar a que outros países do mundo estão vivendo? O presidente ficou incomodado porque o protesto foi associado à fome, o que atinge sua imagem no exterior e sua popularidade interna. O presidente até prometeu diminuir o preço do arroz se reeleito, mas o preço da commoditie só aumenta.

Em artigo na imprensa local, o diretor do Banco Mundial no Senegal, Madani Tall, disse que os preços dos alimentos no país estão 24% acima da média africana e são os mais altos do oeste da África, com exceção da Nigéria e do Cabo Verde.

SOMÁLIA: Soldados abriram fogo e mataram pelo menos duas pessoas e feriram várias outras no dia 5 de maio quando milhares protestavam em Mogadício contra os comerciantes de alimentos que recusavam as velhas notas de 1.000 “shilling”, que valem menos que 74 centavos de dólar. O país vive uma espiral inflacionária.

BURKINA FASO: Sindicatos iniciaram uma greve geral de três dias em 13 de maio contra a alta dos preços de alimentos e combustíveis. Milhares de pessoas marcharam até a capital Ouagadougou num barulhento protesto. Em fevereiro, mais de 300 pessoas foram presas em manifestações. O governo se moveu para cortar taxas de importação e para subsidiar cereais e tentar amortecer os efeitos dos altos preços.

MARROCOS: Quatro sindicatos fizeram greve de um dia em escolas públicas e outros serviços do Estado em 13 de maio para protestar contra a alta dos preços. A paralisação foi vista como um teste na batalha entre governo e sindicatos ao redor da crise de alimentos para uma greve geral prevista para 21 de maio.

CAMARÕES: Pelo menos 24 pessoas foram mortas em protestos que emergiram em fevereiro e que foram relacionados parcialmente ao crescente custo de vida. Ativistas de direitos humanos estimam as mortes em 100. O governo subiu salários públicos e suspendeu impostos de gêneros alimentícios básicos.

COSTA DO MARFIM: A polícia usou gás lacrimogêneo no fim de março para dispersar manifestantes contra a alta dos preços na capital comercial, Abidjan.

MOÇAMBIQUE: Pelo menos seis pessoas foram mortas em protestos em fevereiro contra os altos preços de combustíveis e o custo de vida. O governo concordou em cortar o preço do diesel para microônibus e táxis.

ÁFRICA DO SUL: Cerca de 5.000 membros de uma federação sindical chamada COSATU (congresso de sindicatos sul-africanos, entidade ligada ao partido comunista do país) marcharam em Joanesburgo, em 17 de abril, para protestar contra os altos preços de alimentos e da energia elétrica. A inflação de gêneros alimentícios subiu 14,1% apenas em fevereiro.