Dirlei Leme da Fonseca, dedicou grande parte de sua vida à militância revolucionária

No ultimo dia 24 de maio, depois de uma incansável luta contra o câncer, faleceu a camarada Dirlei Leme da Fonseca, também conhecida como Zeca. Foram oito anos de luta contra a doença que começou na mama, passou para os ossos e nos últimos meses se alojou no cérebro.

Zeca tem uma história importante relacionada ao início do corrente morenista no Brasil. Recontá-la é uma forma de mostrar para as futuras gerações que nossas lutas não são em vão.

O início da Militância
Em 1973, depois de ver vários de seus amigos perseguidos e até mesmo presos pela ditadura militar, Zeca resolveu sair do país e foi viver em Córdoba na Argentina. Aqui no Brasil ela tinha contato com uma das rupturas do Posadismo, em especial com Arnaldo e Júlio Tavares, que diziam que ela deveria procurar os morenistas quando estivesse por lá.

No mesmo ano que chegou ao país entrou em contato com o partido em um piquete de jornais na universidade. Alí começaria uma longa trajetória de lutas sempre vinculadas à Liga Internacional dos Trabalhadores.

Militava na faculdade de Arquitetura e fazia parte da equipe que atendia as centenas de estrangeiros que buscavam ingresso na Universidade Nacional de Córdoba. Organizava, dirigia suas lutas e captava para o partido. Sua maior alegria era quando recebia Independência Operária, impresso no Brasil, em mimeografo a álcool pela Liga Operária.

No final de 1974 quando já se preparava o Golpe Militar que viria em 1976, esteve presa durante várias semanas acusada de ser parte da conexão internacional da guerrilha.

Em 1975, na maior greve geral contra o peronismo na época, a Greve Geral contra o Rodrigazzo. mais uma vez foi detida.

No final desse ano voltou ao Brasil.

A volta ao Brasil
Voltar ao Brasil naquela época não era muito alentador. A ditadura que atuava com rudeza ainda teve tempo de matar Herzog, o operário Fiel Filho e produzir o massacre contra o antigo PCdoB na Lapa, alem das prisões do MEP e a repressão a Liga Operária em 77.

Isso, como ela sempre disse, não a assustava. O que realmente assustava é que tínhamos um longo caminho a percorrer. Na reunião com a direção da Internacional e a representante do Brasil, Zezé havia dito que já éramos grandes. Quantos? 44 militantes. E realmente já era um grupinho de propaganda considerável para a conjuntura do país. Era o início da corrente morenista no país.

Trabalhadora Metalúrgica
Ao voltar para o país, em 1976 ingressou na metalúrgica Italmagnésio, em Santo Amaro e vivia na estrada do M´Boi Mirin. Misturando trabalho de fábrica com o trabalho de bairro.

A militância na época da ditadura era mais lenta e contraditoriamente mais intensa, pois sabia-se do risco que isso representava.

Em 1977 nasce seu filho Gustavo que recebeu esse nome para homenagear ao Jarrão, um militante perseguido pela ditadura militar. Para ela os filhos de militantes deveriam receber nomes de lutadores operários como forma de homenagear aqueles que ousavam levantar a cabeça e lutar pela revolução socialista.

A militância pela construção do PT na Baixada Santista
Em 1978 foi viver em Santos e foi membro dos sucessivos diretórios municipais do PT até 1984 quando saiu da cidade, pois já não conseguia emprego na região. Foi fundadora do Comitê Brasileiro de Anistia, seccional Santos.

Participou e codirigiu importantes lutas, entre elas, a Greve do Porto de Santos, em 1980.

A ditadura já em decadência mesmo assim não parou de persegui-la. Há pouco tempo ao pedir os informes do SNI para os processos de anistia víamos como os órgãos de informação se preocupavam com sua militância. Eles relatam uma reunião “fechada” em sua casa para discutir o tema portuário, com oito pessoas das quais quatro tem seus nomes revelados e obviamente entre os outros quatro há pelo menos um infiltrado na tal reunião “fechada” em sua casa.

A militância em Curitiba
Em 1984 transferiu-se para Curitiba aonde seguiu militando com a juventude, funcionários públicos municipais e previdenciários. Militou até o início do PSTU.

Em 1987, já havia caído a ditadura militar, estávamos no governo Sarney, mas os longos braços do aparato policial militar da burguesia ainda seguia seus passos conforme os relatos do SNI. A chamada Operação Condor, um operativo das policias políticas da America latina se preocupava com suas relações com a oposição paraguaia no exílio. Revolucionária e internacionalista conseqüente, ela sempre se relacionou com a oposição paraguaia no exílio até a queda de Stroessner em 89.

Afastada do partido, seguia lendo os materiais da LIT e do partido. Concordando ou discordando sempre tratou de seguir os passos da organização. Quando tinha alguma discordância da linha dizia com humildade: “essa é minha opinião, mas se o partido precisar pode contar comigo”.

A Doença
Há 10 anos o câncer começou a manifestar-se e nos últimos 8 anos começaram as quimioterapias. Foram anos difíceis de sua vida quando praticamente interrompeu seu ritmo de vida e parou de trabalhar. Para não “pirar” com a doença como dizia se dedicou à pintura primitivista retratando a sua cidade Ibitiuva, uma região canavieira do Estado de São Paulo e o modo de vida e trabalho dos canavieiros.


Um dos quadros de Zeca

Mesmo com as limitações seguiu atenta a vida do partido. Em 2007 escreveu sobre a invasão da sede nacional no site do partido:

Muitos anos militei nas fileiras do trotskismo, desde a época de Moreno no PST Argentino. Neste momento não posso de deixar registrado meu repúdio a este ataque violento ao nosso partido. Ataque comandado pelo burocrata Luiz Inácio da Silva. A mobilização permanente é nossa grande e maior arma.
Exigimos de Tarso Genro uma resposta imediata.

Zeca, de Ribeirão Preto (SP)

A despedida
Há um ano o câncer se manifestou no cérebro. O sofrimento intensificou-se. Mesmo assim seguiu preocupando-se pela revolução socialista, pelo partido, pela política da LIT nos países.

Um dia antes de morrer disse a sua filha o que já havia afirmado várias vezes: quero ser enterrada com a bandeira do meu partido.

E assim foi. Em todo o velório a bandeira do PSTU cobria parte de seu corpo e por fim a bandeira foi colocada dentro do ataúde e dessa maneira acompanhando-a como ao longo dos últimos 38 anos.