O machismo é uma ideologia. Um sistema de falsas ideias que cria a falsa verdade de que as mulheres são seres inferiores aos homens. Essa falsa verdade foi incorporada histórica e culturalmente pela sociedade em que vivemos. Dela, se reproduz ações coletivas e individuais condizentes com a ideia de inferiorização das mulheres. É isso que ajuda a explicar as diferentes condições entre homens e mulheres, a desigualdade nos direitos, nos salários, no trabalho, no respeito perante a sociedade, na quantidade de assassinatos e violência contra as mulheres, na responsabilidade com o trabalho doméstico etc.

Mas a expressão dessa ideologia se manifesta de forma diferenciada entre mulheres de classes sociais distintas. Todas as mulheres estão submetidas à inferiorização proporcionada pelo machismo, mas a condição de classe permite o acesso a direitos, salários, condições sociais diferenciadas que faz com que o machismo seja amenizado sobre as mulheres burguesas em comparação com o machismo sobre as mulheres trabalhadoras.

Isso acontece porque a ideologia machista é desenvolvida e sustentada pelo sistema político, econômico e social capitalista. O motor da forma de organização da sociedade e suas ideologias – costumes, crenças, ritos, valores etc. – está relacionado ao modelo de desenvolvimento material da sociedade. Dessa forma, a depender da necessidade da produção capitalista, as mulheres serão mais ou menos incorporadas por este sistema.

Nesse sentido, enfrentar os problemas até hoje proporcionados pelo machismo ao conjunto das mulheres através de medidas por dentro do sistema capitalista é um enfrentamento curto, limitado, sequer mantido para as mulheres burguesas. E em se tratando das mulheres trabalhadoras, as medidas por dentro do capitalismo são mais curtas ainda, pois pouco interferem no elemento central de sua condição de vida: a condição de explorada pelo sistema capitalista.

A violência contra a mulher, por exemplo, está sendo tratada como uma pandemia, definição da própria ONU de que há um surto global de violência contra as mulheres e de que 7 em cada 10 mulheres ainda sofrerão com agressões físicas e sexuais. Ou então, o exemplo da diferença salarial entre os sexos, em que desde 1919, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) condena a discriminação salarial por sexo, porém as mulheres ainda seguem ganhando menos do que os homens, realizando a mesma função, em todas as partes do mundo e em qualquer posto de trabalho.

Essa realidade questiona uma premissa da carta de intenções políticas e econômicas do ideário capitalista: o de que todos devem ter os mesmos direitos e devem ser tratados como iguais. Desde a formação do sistema capitalista, isso não tem valido para os setores oprimidos, como as mulheres, negros, indígenas, nacionalidades oprimidas, LGBTs etc.

Essa incapacidade de o capitalismo respeitar suas próprias “regras” está relacionada ao fato de que essas regras são formais, ou teóricas e de que o que vale mesmo é o desenvolvimento do lucro. Ou seja, se for preciso utilizar a inferiorização histórica das mulheres para elas receberem menos e isso, portanto, contribuir para o desenvolvimento da taxa de lucro dos empresários, isso vai ocorrer.

Com isso, não há conquista por igualdade, democrática, que se sustente. Por isso, as medidas no interior do sistema capitalista são extremamente curtas e não resolvem o problema da maioria das mulheres, as que além de oprimidas, são exploradas pelo capitalismo.

Dessa forma, a luta pela libertação completa das mulheres depende de uma transformação radical da sociedade. As mulheres que são favorecidas por pertencerem à classe dominante não buscam essa via de libertação, porque sua condição de exploradoras é o que baliza suas ações políticas. As mulheres trabalhadoras, em contrapartida, só podem alcançar igualdade, respeito e libertação na medida em que o sistema que as explora é transformado. A principal experiência histórica com o socialismo demonstrou a capacidade deste sistema em garantir direitos mínimos que o capitalismo nega historicamente às trabalhadoras. E, para além disso, demonstrou a capacidade desse sistema em colocar as mulheres trabalhadoras com papéis centrais na construção de um mundo novo.

Para atingir a este objetivo, a classe trabalhadora e por consequência as mulheres trabalhadoras precisam se organizar de forma coerente com os seus objetivos. Pela falta de condições mínimas de igualdade entre homens e mulheres no capitalismo, muitas mulheres assumem formas de organização condizente com seus objetivos estratégicos. Aquelas mulheres que acreditam que o capitalismo pode resolver os problemas das mulheres, acabam por propor formas organizativas que reúnem todas as mulheres, ou seja, de todas as classes sociais.

Para aquelas que acreditam que a saída fundamental dos problemas das mulheres só se dará através da revolução socialista, a forma organizativa mais adequada e coerente é aquela que organiza a luta concreta, por mais direitos, igualdade, como creches, salário igual, legalização do aborto, contra a violência, mas também a que luta pela transformação socialista da realidade. E quem se organiza em torno disso são apenas as mulheres trabalhadoras, as que defendem o lado da classe trabalhadora na polarização social instituída pelo capitalismo.

Parte das ações da burguesia para seguir dominando e explorando a classe trabalhadora é criar mecanismo de divisão da classe trabalhadora. O machismo é um desses mecanismos, pois com essa ideologia, os homens da classe trabalhadora também oprimem as mulheres trabalhadoras, tratando-as como seres inferiores, como suas subalternas dentro e fora de casa, como seres apolíticos, que não podem se envolver em temas políticos e sindicais. É muito importante que as organizações da classe trabalhadora tenham consciência disso e medidas de combate ao machismo no interior da classe trabalhadora.

Dessa forma, a organização estratégica para que as mulheres trabalhadoras possam buscar a transformação socialista da realidade é a organização em um partido político revolucionário, socialista e democrático. Esse é o instrumento fundamental de organização de homens e mulheres trabalhadoras. Entretanto, sob a estratégia dessa organização, podemos e devemos desenvolver táticas de organização que busquem aproximar mais mulheres trabalhadoras para a luta política e sindical.

Os sindicatos são fundamentais nesse sentido, pois são uma referência na organização da luta dos trabalhadores no Brasil. É necessário que os sindicatos desenvolvam medidas que permitam uma maior presença das mulheres nas atividades, nas ações, nas lutas, na filiação ao sindicato, etc. Medidas específicas devem ser desenvolvidas, porque as mulheres tem dificuldades específicas para se envolver com a luta política e sindical.

Além de batalhar para fortalecer o trabalho nos sindicatos, nós do PSTU construímos o Movimento Mulheres em Luta como mais uma tática de aproximar as mulheres trabalhadoras, como mais uma forma de tentar quebrar as barreiras do machismo que faz a classe trabalhadora ficar dividida e que faz com que muitos sindicatos não assumam efetivamente a luta das mulheres trabalhadoras. Também construímos o MML como forma de apresentar às mulheres trabalhadoras que se referenciam em outros movimentos de mulheres que buscam saídas por dentro do capitalismo, de que é necessária uma alternativa de organização que aponte que a luta das mulheres trabalhadoras só pode ser efetivamente vitoriosa se tiver como objetivo final a luta pelo socialismo.