Uma situação política e social explosiva e uma imensa crise institucional varrem o paísO processo mais avançado se dá em Oaxaca, onde uma greve do sindicato de professores e a ocupação do Zócalo – principal praça da cidade – por reajustes salariais transformaram-se numa insurreição popular.

Em junho, o governo de Ulises Ruiz Ortiz, do PRI (Partido Revolucionário Institucional), tentou desalojar violentamente o acampamento com ajuda da polícia estadual. Em resposta, milhares de trabalhadores, camponeses, estudantes e a população dos bairros pobres da cidade solidarizaram-se com os professores. A realização de um massivo levante popular derrotou o governo.

Na ocasião, Ulises ficou paralisado. A população, por sua vez, organizou a APPO (Assembléia Popular dos Povos de Oaxaca) que se transformou, de fato, em um poder paralelo e levantou a bandeira do “fora Ulises”. Desde então, o governador organizou uma série de provocações com bandos que resultaram numa intervenção armada em Oaxaca e na morte do jornalista norte-americano Brad Will, além do desaparecimento de dezenas de pessoas.

O governo federal de Vicente Fox entrou em ação e enviou a Polícia Federal Preventiva (PFP), criada com objetivo de reprimir conflitos sociais, para invadir a cidade no dia 27 de outubro. Apesar de ocupar a praça, a repressão não conseguiu desmobilizar a APPO. No dia 2, a população repeliu a ofensiva da polícia e a impediu a tomada da Universidade Benito Juarez, ocupada por estudantes e trabalhadores.

O governo Fox vacilou durante meses em intervir em Oaxaca e “nacionalizar” o conflito. Isso porque temia repercussões negativas durante a batalha eleitoral entre o candidato presidencial de seu partido, Felipe Calderón, e o opositor Andrés López Obrador, do PRD (Partido da Revolução Democrática). Após as eleições também encontrou dificuldade para esmagar a mobilização, pois o governo viu-se diante de uma profunda crise institucional, iniciada após as denúncias de fraude nas eleições presidenciais. O governo federal então resolveu esperar mais um pouco e, uma vez anunciada a “vitória” do candidato governista, resolveu intervir em Oaxaca.

Congresso da APPO
No último dia 15, a APPO realizou um congresso que reuniu mais de duas mil pessoas e aprovou a manutenção do “fora Ulises”. O congresso confirmou a existência de uma ampla vanguarda combativa que sustentou a luta contra a PFP. Entre as principais resoluções aprovadas está a formação de um Conselho Popular com 260 pessoas.
O congresso também aprovou um plano de ação para recuperar o centro de Oaxaca e obrigar a PFP a abandonar a região. A data de retomada das mobilizações é o próximo dia 25, mas já no dia 20 foram registrados confrontos entre ativistas da APPO e a polícia.

A outra ponta da crise
O outro lado da crise mexicana começou depois das fraudulentas eleições presidenciais realizadas em 2 de julho e que deram a “vitória” para Calderón, candidato da direita tradicional e do governista PAN (Partido da Ação Nacional).
Há um vasto histórico de fraudes eleitorais no país. Por mais de 70 anos o PRI manteve-se no poder em função desse mecanismo. Desta vez, as fraudes foram denunciadas pelo candidato opositor López Obrador. De julho a 14 de setembro a capital mexicana foi tomada por bloqueios de ruas e avenidas, um acampamento na principal praça e protestos que reuniram milhões em protestos contra a fraude.
Mesmo com o país dividido, a justiça eleitoral decidiu “reconhecer” a vitória de Calderón. Desde então Obrador, que tinha convocado os protestos anteriores, resolveu não chamar nenhuma manifestação pública. Apenas no dia 20 de novembro – aniversário da Revolução Mexicana de 1910 – o oposicionista convocou um grande ato para “tomar posse no seu governo paralelo”.

No próximo dia 30, Calderón tomará posse como presidente e sucederá seu colega de partido Vicente Fox. Para a ocasião, a direção do oposicionista PRD não está convocando nenhuma mobilização, bloqueios de ruas ou assembléias.
Frente a uma total ilegitimidade, o governo Calderón certamente será muito mais frágil e terá margem de manobra ainda mais reduzida em relação a Fox. Isso não significa, porém, que Calderón vá abandonar sua política de tentar acabar com as mobilizações de Oaxaca com sangue e repressão.

O conservador tentará realizar um governo a serviço dos patrões e dos interesses dos Estados Unidos – país com o qual tem total sintonia, inclusive sobre o tema da imigração de mexicanos para o vizinho do norte.

Situação revolucionária
O sentimento de mudança no México tem particular relevância depois do fim da ditadura civil do PRI. Por mais de 70 anos, esse partido esteve no poder. Nos anos 80 e 90, o PRI adotou a política neoliberal imposta pelos EUA, privatizou a grande maioria das empresas estatais e acabou com a reforma agrária e com direitos dos camponeses conquistados na Revolução de 1910.

O regime ditatorial do PRI acabou em 2000, quando o partido perdeu as eleições presidenciais para o PAN, que se tornou a nova opção política da burguesia mexicana e do imperialismo frente à decadência do PRI. O PAN apelou para a mesma fraude eleitoral e reprimiu violentamente os trabalhadores para defender os interesses dos grandes burgueses mexicanos e do imperialismo.

É preciso seguir na luta e não dar trégua aos governos do PAN e do PRI. As mobilizações massivas devem se estender por todo o país.

López Obrador condenou a repressão em Oaxaca e sua ocupação por forças federais, e exigiu a renúncia de Ulises Ruiz. Mas é preciso sair do terreno das intenções e ir para a ação. Obrador é hoje o principal dirigente de massas do país, com grande influência política. É sua obrigação convocar manifestações contra a repressão em Oaxaca.
Ao mesmo tempo, os ativistas e movimentos sociais do mundo inteiro devem prestar a mais ampla solidariedade internacional com o povo de Oaxaca e repudiar a repressão do governo.

Post author Bruno Sanchez, de São Paulo (SP)
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