Durante os últimos dias, o julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o pedido de abertura de processo contra os 40 “mensaleiros”, tomou boa parte da atenção do país. O julgamento já é considerado o maior da história da instituição e da política nacional.

O procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, apresentou seu relatório acusando os “mensaleiros” com um farto cardápio de corrupção. Fernando de Souza, disse que todos os 40 corruptos têm absoluta ciência do que estão sendo acusados e que as denúncias apresentadas mostram claramente o “submundo do crime”. Ele ainda apontou responsabilidades diretas ao ex-ministro da Casa Civil, José Dirceu, no envolvimento com esquema, por sua influência política. “É notório que ele [Dirceu] exercia influência política, sempre teve e ainda tem grande importância nas deliberações do Partido dos Trabalhadores”, afirmou. Ele ainda mencionou que o empresário Marcos Valério tinha acesso livre com Dirceu. Também citou uma reunião de diretores dos bancos BMG e Banco Rural com o ex-dirigente do PT Delúbio Soares e com Marcos Valério.

O “mensalão” paralisou o governo Lula em 2005 e produziu a maior crise política do seu mandato. Com base no inquérito criminal 2.245 do STF, procuradores da República no Distrito Federal afirmam que o esquema era sustentado por três núcleos: central, publicitário e financeiro. O central era controlado diretamente por dirigentes do PT, o publicitário, por Marcos Valério, e o financeiro, por executivos do Banco Rural. As investigações apontam que foram movimentados no esquema algo em torno de R$ 55 milhões.

Os advogados dos “mensaleiros”, como se era de esperar, desqualificaram as acusações e as classificaram como “ineptas” e como “peça de ficção”.

Livrando a cara
Até o final dessa semana, quem se safou por enquanto foram os “graúdos” envolvidos na denúncia. Com exceção do ex-ministro Luiz Gushiken, os principais políticos do esquema do “mensalão” tiveram a primeira denúncia rejeitada. Entre eles, José Dirceu e sua patota – Delúbio Soares, José Genoino e Sílvio Pereira, o núcleo PT.

A denúncia acusava a participação em irregularidades no repasse de cerca de R$ 73 milhões pelo Banco do Brasil à Visanet. Segundo os ministros, a conduta do ex-deputado não está nem minimamente descrita, motivo pelo qual não se pode deflagrar o processo penal.

Toga justa no STF
Um episódio no mínimo bizarro aconteceu em meio ao julgamento. Enquanto os advogados defendiam seus corruptos clientes, os ministros Carmem Lúcia e Ricardo Lewandowski foram flagrados por fotógrafos quando realizavam uma suspeita conversa pela intranet do Supremo num programa de bate-papo – uma espécie de MSN.

Os diálogos sugerem a combinação de votos entre os membros da instituição, além da troca de votos por cargo e favores políticos. No diálogo, Carmem diz que sabe que o ministro Eros Gral iria votar contra a abertura do processo ao “mensaleiros”. No entanto, os dois ministros também se mostram preocupados com quem vai assumir a vaga de Sepúlveda Pertence, ministro do STF que vai se aposentar em breve. O principal candidato a vaga é Carlos Alberto Direito, ministro do Superior Tribunal de Justiça. Direito conta com o apoio de cabeças coroadas do PMDB e está sendo bancando pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (AL), Waldir Raup (RO), líder do PMDB, Romero Jucá Filho (RO), líder do governo, e Nelson Jobim, ministro da Defesa.

A conversa entre os dois revela apenas que o modus operanti do STF. Por traz de toda a formalidade e das pomposas togas, a instituição é exatamente igual a outras instituições do Estado burguês. Quer dizer, na Justiça também se barganham e se trocam cargos por favores políticos. Isso porque quem nomeia os ministros do Supremo é o presidente da república, que submete seus indicados ao Senado. Mas quem indica os nomes ao presidente são os partidos políticos de base parlamentar, ou seja, o loteamento dos cargos não é uma exclusividade dos ministérios ou das estatais.

A “boquinha” também atinge a Justiça. Como se não bastasse, a aprovação dos indicados pelo Senado também se submete a mesma lógica. Lá, acordos pra livrar a cara de parlamentares envolvidos em denúncias de corrupção são também usadas moeda de troca das nomeações. Talvez por isso o STF não tenha condenado quase nenhum político em todos esses anos.

O que é ficção?
Certamente não são as denúncias. Tampouco toda corrupção praticada pelos “mensaleiros”. Como comprova a própria historia recente do STF, é pouco muito pouco provável, as chances são de fato remotíssimas, de alguém que mesmo que processado seja punido. Por tanto, todo o julgamento poderá ser apenas uma “ficção”.

Se todos os parlamentares fossem investigados, não há dúvidas de que viria à tona toda a sujeira e as maracutais dos políticos com empresários, banqueiros e todo o tipo de lobistas, que tomam conta de todas as instituições. O “mensalão” revela apenas a ponta do iceberg do funcionamento do Estado burguês.

Terminado o julgamento, as práticas de corrupção, o loteamento de cargos os lobbies de grande empresários continuaram. Pois no regime capitalista, esse é o jogo, essas são as regras.