“Onde estão os nossos Amarildos”, questionam manifestações realizadas nesse 22 de agosto

No último dia 22 ocorreu a Marcha Nacional Contra o Genocídio do Povo Negro. Com um chamado realizado pelo grupo ‘Reaja ou será morto, reaja ou será morta’, da Bahia, diversas organizações em várias capitais realizaram atos, como no Rio de Janeiro, São Paulo, Recife e Maranhão.

Há mais de um mês sem novas notícias, o sumiço de Amarildo de Souza, o pedreiro negro e morador da Rocinha desaparecido em uma operação policial da UPP no morro carioca, trouxe à tona uma realidade muito presente no cotidiano de centenas de milhares de jovens e trabalhadores negros: o sofrimento nas periferias das grandes capitais com a violência policial e a criminalização da pobreza.

As manifestações dos últimos meses são reflexos das contradições acumuladas, fruto de uma política econômica adotada pelo Governo Federal, estaduais e municipais, que vêm privilegiando banqueiros, os megaeventos e as grandes empresas, em detrimento dos investimentos nas áreas sociais. Assim, como parte das jornadas de junho e julho, as periferias e bairros em todo o país também tem ido às ruas denunciar suas condições precárias de vida, pois são aqueles que sofrem diretamente com a violência policial e a ausência de políticas públicas eficientes de transporte, moradia, saneamento básico, saúde e educação.

A luta contra a violência policial e as péssimas condições de vida encontrou em agosto um denominador comum na figura de Amarildo, aprofundando, inclusive, a percepção de que antes de ser pobre e sofrer os reflexos da exploração, os trabalhadores e jovens são negros; carregando consigo os fardos e as conseqüências de uma política de Estado influenciada por mais de 400 anos de escravidão.

A pobreza no Brasil tem cor, e é preta. O trabalho terceirizado, de limpeza, doméstico, de segurança, no setor de serviços, tem cor, e é negro. A violência policial não é indiscriminada, é dirigida a um grupo social mais vulnerável e entre eles os negros são maioria, a dita “cor padrão” dos inquéritos policiais.

Vivemos em um país onde, a cada 25 minutos, um jovem negro é morto de forma violenta e onde temos a terceira maior população carcerária do mundo. Mudam-se os senhores, as senzalas, os açoites, mas a exploração, a opressão e a negação ao direito ao futuro e a uma vida digna permanecem mais latentes do que nunca.

A ideia de que vivemos em uma sociedade miscigenada em que o racismo não existe e todas as raças vivem harmoniosamente no capitalismo, cai por terra ao nos depararmos com números assustadores que comprovam não só nosso genocídio, mas também a “inclusão marginal” do negro no capitalismo.

Luta continua no dia 30
No dia 22 de agosto nós, do PSTU, em conjunto com Movimento Nacional Quilombo Raça e Classe, fomos às ruas em diversos estados exigir uma outra política de segurança pública, que não mate a nós jovens e trabalhadores pelo simples fato de sermos pobres e negros. Exigimos a desmilitarização da polícia, e que a segurança pública esteja baseada na construção de uma nova polícia, democrática, eleita nas comunidades e que esteja sob o controle dos trabalhadores. Além disso, é preciso encarar de frente o problema do mercado do tráfico de drogas, avançando para a legalizando das drogas sob controle do Estado, visando destruir a sustentação financeira do crime organizado. Só assim poderemos pôr fim à matança e a repressão em massa protagonizada pelas UPP´s, pelos esquadrões da morte, pelo tráfico e as milícias que atuam nos morros e favelas.

Fica evidente que, por mais que os governos neguem a existência do racismo e atuem para nos embranquecer e dissolver as questões específicas de nós, negras e negros, apenas como problemas oriundos das desigualdades sócio-econômicas e do dito “mérito e esforço individual”, tal discurso só serve para acobertar suas práticas discriminatórias e racistas e para que a burguesia consiga aplicar com mais rigor seus planos neoliberais, impondo um nível de exploração superior ao conjunto da classe trabalhadora. Não há capitalismo sem racismo!

Por isso, seguiremos nas ruas e teremos, no dia 30 de agosto, mais um episódio de nossa luta contra a exploração e a opressão capitalista, em defesa da nossa memória e identidade, na luta pela verdadeira igualdade racial; onde não sejamos mais exterminados, nem criminalizados, onde tenhamos salário igual para trabalho igual, onde tenhamos direito ao transporte público de qualidade, moradias dignas, atendimento de saúde quando necessitarmos e a possibilidade de termos uma educação de qualidade e o sonho da universidade pública, possa tornar-se realidade!

Confira o que rolou nos estados:

Rio de Janeiro
Cerca de 300 pessoas participaram do ato que saiu da Rocinha, sendo organizado em conjunto com a família do Amarildo, o pedreiro negro de 43 anos e pai de 6 filhos desaparecido há mais de um mês em uma operação policial da UPP. O ato seguiu em direção ao Leblon, passando em frente à casa do governador exigindo a desmilitarização, o fim das UPP´s e o Fora Cabral.

São Paulo
Cerca de 300 pessoas saíram do Teatro Municipal participando da marcha questionando “Cadê o Amarildo?”, ” Quem matou Ricardo?” entre tantas outras vítimas do genocídio do povo negro. Aos gritos de “Chega de alegria a PM mata preto todo dia“, os  manifestantes marcharam até à Câmara Municipal, denunciando a tentativa de vereadores de homenagear a ROTA com a honraria Salva de Prata. O ato foi organizado pelo Comitê Contra o Genocídio da Juventude Negra e diversas entidades e coletivos do movimento negro.

Maranhão
No Maranhão aconteceu um ato-show na Praça Quilombo Cultural Lagoa Amarela com cerca de 100 pessoas.  O “Cadê Amarildo” foi combinado com o “Fora Sarney”. Diversos grupos de rap como Mano Magrão, MC Alcino, Alemão, Gíria Vermelha, o cantor de MPB Luís Lima, além de skatistas faziam suas apresentações alternados com as falações. O ato contou ainda com a presença do presidente nacional do PSTU e membro da executiva da CSP Conlutas, Zé Maria.

Recife
Cerca de 400 pessoas pararam o trânsito e deixaram o recado: “Cadê os tantos Amarildos de Recife?” A marcha contra o genocídio se unificou na luta em defesa do transporte, protagonizada pela juventude e em especial pelos trabalhadores e moradores de Xambá. A luta continua contra o genocídio e em defesa do transporte público de qualidade, pelo fim dos verdadeiros vagões negreiros causados pelo caos do transporte.