Entre os ativistas discute-se o que fazer nas eleições, e estão aumentando os que acham que se deve votar no PT, “para evitar a volta da direita”. Mesmo com todos os problemas que muitos reconhecem, Lula é “operário”, um “governo de esquerda”. A reeleição de Lula seria então um mal menor, para evitar que a direita volte ao poder. Entre os ativistas das estatais, é comum ouvir que, “se a direita voltar, vai privatizar a Petrobras, o Banco do Brasil, a Caixa Econômica Federal etc.”.

O “mal menor”, no entanto, é o mal maior. Esta é uma das mais velhas tradições conservadoras da “política” brasileira: para evitar o surgimento de algo novo. Apresenta-se algo que poderia ser “ainda pior”, para que não se mude nada. Não pode ser que se lute por mudar o país, e se aceite um dos mais velhos chavões dos políticos corruptos e partidos dominantes brasileiros.
Em primeiro lugar, não é pela origem do presidente que se define o caráter de classe do governo, e sim pelo programa e política aplicados: a quem beneficia sua política econômica, a relação com os movimentos sociais e com o Estado burguês.

Lula é operário, mas seu governo serve ao imperialismo, aos grandes banqueiros e às multinacionais. Bush não pára de elogiar Lula, e o ajudou diretamente na sua sustentação na crise de 2005. Os lucros dos bancos bateram recordes históricos com o governo petista, superiores aos conseguidos com FHC.

Não houve mudança real da vida dos trabalhadores. Os índices de desemprego seguem altíssimos, e só não aumentaram mais pelo crescimento cíclico da economia. Os salários continuam arrochados, e Lula só elevou um pouco mais o mínimo neste ano por causa das eleições. Mesmo assim, não existe nenhuma diferença de qualidade entre os reajustes de FHC e os de Lula.
Aos trabalhadores e jovens que estão caindo no conto de que afinal “Lula defende os pobres”, é necessário explicar que o governo aplica com o Bolsa-Família, o mesmo receituário do neoliberalismo: cortar salários e empregos por um lado, e por outro distribuir migalhas com os planos de compensação social. Assim, diminuem os custos das empresas, e o Estado tem condições de ampliar seu controle sobre setores mais pauperizados, recriando a dependência populista. Isto não é uma prática da esquerda, mas a aplicação das recomendações do Banco Mundial, que vem desde FHC.

A atitude do governo Lula perante os movimentos sociais, em um sentido, é semelhante à de todos os governos burgueses. Não atende a nenhuma das reivindicações mais importantes, nem dos sindicatos (deixando os salários arrochados), nem do MST (reforma agrária paralisada), nem do movimento estudantil (universidades públicas seguem sucateadas, e os estudantes sem passe-livre). Em outro aspecto, é bem diferente dos governos de direita, mas para pior: por sua origem, Lula coopta os movimentos e entidades dos trabalhadores, corrompendo-as e integrando-as ao governo. Foi assim com a CUT e a UNE, está sendo assim agora com o MST.
Por último, o governo Lula está completamente integrado ao Estado burguês, defende suas instituições, como Forças Armadas, Justiça e Congresso. Além de defender, incorporou todos os vícios do Estado, como a corrupção generalizada.

O governo de Lula é da burguesia, com cara de operário. É o que chamamos de governo de Frente Popular, que a burguesia usa para impor a mesma política econômica, utilizando o prestígio da liderança dos trabalhadores. Assim se consegue impor o que nem os governos de direita fizeram, como a reforma da Previdência. Nesse sentido, é também um governo de “direita” e não de “esquerda”. Por esse motivo, “evitar a direita” é uma boa proposta, mas significa não apoiar nem Lula, nem Serra/Alckmin.

Aos trabalhadores das estatais temos que dizer que o que pode evitar a privatização ou não dessas empresas é a luta dos trabalhadores. Nem FHC, em oito anos, conseguiu privatizar a Petrobras, o BB e a CEF e nem Lula em seu primeiro mandato. Mas ambos privatizaram setores dessas empresas, com a terceirização de serviços. A possibilidade de um governo futuro (seja Lula ou PSDB) vir a privatizar uma delas vai depender do grau de mobilização que tivermos. E para avançar nessa luta, é preciso também tomar a direção dos sindicatos das mãos da CUT, fortalecer a Conlutas, e construir uma alternativa de esquerda – diferente tanto de Lula como da oposição burguesa – que defenda o fim dessas terceirizações, e que as direções dessas estatais sejam eleitas pelos próprios trabalhadores.

O fantasma da “volta da direita” não deve assustar ninguém, pois significaria a mesma política econômica de Lula, assim como a mesma corrupção. Somos radicalmente contra a direita, mas não nos rendemos a essa ameaça, para evitar enfrentar o atual governo da direita, o governo Lula.

A grande guerra entre os aparatos do PT e do PSDB-PFL é para ver quem vai ocupar os cargos no Estado, e não a defesa de programas diferentes. Os grandes defensores do “mal menor”, de “evitar a volta da direita”, são os parlamentares do PT, os que ocupam cargos muito bem remunerados, que podem perder seus privilégios. Não estão defendendo os interesses dos trabalhadores, mas os deles próprios.

Nos anos 80, o MDB (o antecessor do PMDB) travou uma violenta batalha contra o voto no PT (na época um partido classista), para que se mantivesse o MDB como único pólo de oposição, e evitar “a vitória da direita”, naquele momento a ARENA.

Aceitar o “mal menor” é aceitar que não se pode mudar nada neste país. A única forma de criar algo novo é romper com o velho. Neste caso, o velho é aceitar a falsa polarização PT x PSDB-PFL. Não se pode repetir o mesmo. Depois de toda a crise política, com toda aquela indignação, não se pode voltar atrás, e legitimar novamente esses partidos. Eles são os defensores dos banqueiros, da subordinação à Bush, da corrupção, do desemprego, do arrocho salarial. E esses não são males menores.

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