No dia 13 de maio na França mais de um milhão de franceses foram as ruas em varias cidades do país contra a reforma da Previdência proposto pelo governo de Jacques Chirac. No dia 25 uma outra manifestação em Paris reuniu mais de 600 mil manifestantes, no entanto o governo se nega a recuar em sua reforma, que será votada em 28 de junho.
A resposta dos sindicatos foi a convocação de greves parciais nos transportes e na educação e anunciou para o dia 03 de junho uma greve geral dos servidores públicos.
O artigo que segue, informa sobre a greve do dia 13 e nos explica os pontos principais da contra-reforma.

Com o projeto de contra-reforma do sistema de aposentadorias e, em seguida, da Seguridade Social, o governo de Chirac e do primeiro-ministro Raffarin lançou um ataque contra conquistas sociais que datam de 1945. É lógico que, nesse quadro, assistamos a um brusco assenso da luta de classes, já que a classe operária não está disposta a deixar-se despojar de conquistas que significaram uma melhora considerável em suas condições de vida. Retroceder sobre a questão das aposentadorias significaria que os trabalhadores deveriam preparar-se para renunciar à Seguridade Social.

Até 1993, todos os trabalhadores tinham que contribuir durante 37,5 anos para poderem aposentar-se com a idade de 60 anos, recebendo uma pensão de patamar máximo. O objetivo da contra-reforma é aumentar os anos de contribuição, elevar para além de 60 anos a idade legal de aposentadoria e rebaixar os valores das pensões. As finalidades são, por um lado, fazer com que a patronal economize seus “gastos” e, por outro, transformar o sistema de Previdência Social em um sistema de seguros privados.

Na França, os trabalhadores do setor privado contribuem para a Seguridade Social segundo o princípio da “repartição” ou solidariedade operária entre as gerações. As contribuições dos trabalhadores na ativa são imediatamente revertidas para os aposentados. Em 1993, o governo Balladur fez com que o tempo mínimo de contribuição passasse de 37,5 anos para 40 nesse setor.

Os trabalhadores do setor privado também contribuem para um Caixa Complementar, que é gerido em co-responsabilidade pela patronal e pelos sindicatos. Essas pensões complementares haviam sido rebaixadas em virtude de uma “reforma” estabelecida em 1996 pelo governo de Jupé (de direita). Por sua vez, de 1997 a 2002, o governo de Jospin (de esquerda) divulgou que, devido ao aumento da esperança de vida, muito em breve já não haveria trabalhadores na ativa suficientes para financiar os aposentados.

Graças a isso, Raffarin (de direita) pôde, por sua vez, afirmar a “desigualdade” existente entre os funcionários públicos (trabalhadores que contribuem “apenas” por 37,5 anos) e os do setor privado, pretendendo dizer que os primeiros são privilegiados. O que o governo omite cuidadosamente é que as aposentadorias dos funcionários públicos dependem do Estado. Portanto, os 40 anos de contribuição e as aposentadorias rebaixadas, impostas aos funcionários por essa contra-reforma, significarão enormes economias para o poder público.

Apesar da contra-reforma não atingir, até agora, o conjunto dos trabalhadores, de fato todos os regimes de aposentadoria estão em perigo. O governo vem revelando paulatinamente que, uma vez efetivada a contra-reforma atual, o projeto consistirá em passar de 40 para 42 os anos de contribuição. Em seguida, o montante das pensões e a quantidade de anos de contribuição serão revisados em função da “evolução da esperança de vida”. Isso significará passar a 43, 44, 45 anos o tempo de contribuição, com os valores das aposentadorias diminuindo e com um nível de vida cada vez mais baixo para os aposentados.

A finalidade: os Fundos de Pensão

Os “Fundos de Pensão por Capitalização” são o objetivo estratégico da contra-reforma. Quer dizer: acabar com um sistema baseado na solidariedade operária entre as gerações em favor de um sistema individual, segundo o princípio dos seguros privados. Os mecanismos desses Fundos de Pensão são bem conhecidos. Trata-se simplesmente de captar o máximo de capital (os milhares de euros que até agora são contribuições sociais) para dirigi-lo à Bolsa de Valores e, assim, conseguir um instrumento “competitivo” frente aos fundos norte-americanos e britânicos.
O Partido Socialista, que defende há vários anos uma “reforma” do atual sistema de aposentadorias, difere somente em alguns detalhes dos projetos do governo Chirac-Raffarin. E nenhuma das moções apresentadas ao próximo congresso do PS se opõe à contra-reforma.

E as organizações sindicais?

Claro, o governo conta com o apoio incondicional do sindicato patronal francês, o MEDEF. E, para maior eficácia nesses tempos de contra-reforma, o sindicato patronal tem uma proposta de negociação com o sindicatos de trabalhadores, a chamada “Refundação Social”.

As principais federações sindicais dos trabalhadores se associaram a esta idéia e aceitaram negociar com o MEDEF as premissas da destruição do conjunto das conquistas sociais dos trabalhadores. Aceitando o quadro da “Refundação Social”, os dirigentes sindicais estão abertos a toda a contra-reforma contanto que o governo mantenha as aparências, ainda que haja diferenças entre as três centrais sindicais francesas: CGT, CFDT e, sobretudo, CGT-FO.

Hoje em dia, entretanto, todas as direções têm sido obrigadas a chamar a greve e a se manifestar, já que o governo não está disposto sequer a fazer uma negociação “pró forme” e, sobretudo, devido à enorme pressão dos trabalhadores.
A greve geral na ordem do dia

Em 1º de fevereiro, apesar das muitas dificuldades, milhares e milhares de trabalhadores se manifestaram contra o projeto Raffarin. Em 3 de abril, novo dia de greve e outras tantas manifestações. Veio logo a manifestação do 1º de Maio, cujo tema principal foi a defesa das aposentadorias e o rechaço à descentralização. Mais uma vez, várias passeatas se pronunciaram pela greve geral, especialmente entre os trabalhadores da educação nacional.

Enfim, mesmo sem convocar a greve geral, todas as confederações sindicais chamaram a uma greve em 13 de maio. Mas, como nas manifestações anteriores, a preparação e a mobilização, por parte das direções, não esteve à altura do acontecimento.
Nesse contexto, alguns setores da educação nacional já estavam há algum tempo em greve. Na verdade, em todos os setores os trabalhadores desejam generalizar as mobilizações para chegar à greve geral, em oposição aos movimentos parciais e atomizados. Era essa situação, este estado de espírito, que dominava entre os trabalhadores na véspera da manifestação de 13 de maio.

A jornada de 13 de maio

“Hoje estamos nas ruas, amanhã voltaremos!”. Esta era uma das palavras-de-ordem das 117 manifestações organizadas em todo o país. Havia outras, como por exemplo: “Trabalhadores públicos e privados, todos juntos”; “Capitalização não, repartição sim!”. A participação foi massiva e até as cifras oficiais reconhecem mais de um milhão de manifestantes em todo o país. Os sindicatos anunciaram dois milhões em nível nacional e 250 mil em Paris. Todos os setores estavam representados: o setor público e o privado, velhos, adultos e jovens, ativos e aposentados; lembrando o chamado das manifestações de 1995: “Todos juntos!”.
No momento em que escrevemos essas linhas (o próprio dia 13 de maio), a quantidade exata de grevistas ainda não é conhecida, mas é estimado que pararam 90% dos trabalhadores em hospitais, 70% na educação nacional, 45% nos Correios e mais de 55% dos ferroviários e dos transportes públicos da região de Paris. Estas são as estatísticas reconhecidas pelos empresários (e estão, portanto, abaixo dos números reais).

Alguns setores, como ferroviários, já anunciaram que prolongarão a greve. O secretário-geral da CGT, Thibault, chamou o ministro “a abrir verdadeiras negociações”. A um jornalista que lhe perguntou se sua organização dará continuidade às manifestações, o dirigente respondeu que as assembléias gerais de cada lugar de trabalho decidirão. O secretário-geral da CFDT (confederação de inspiração social-cristã, a segunda em importância na França), favorável às aposentadorias “a la carte”, se declarou “disposto a ir até o fundo para melhorar o projeto” do governo. A CGT-FO, federação com grande peso no setor público, ainda que favorável a “uma reforma”, é a única realmente hostil ao projeto do governo. Entretanto, até agora, não chamou a greve geral.

Todos reconhecem que este é o movimento de greve e manifestação mais importante na França desde a grande greve geral de 1995. Além das reivindicações sobre as aposentadorias, o movimento tenderá de agora em diante a pleitear a questão do governo, questão que as direções sindicais ligadas à defunta “esquerda plural” não podem de jeito algum permitir que se reivindique.

À luz dos acontecimentos, podemos concluir que a jornada de 13 de maio impõe um chamado imediato à greve geral unida.

Post author Teresa e Jean-Louis,
de Paris (França)
Publication Date