Em 2011, a mídia anunciou que pela primeira vez na história, segundo dados do IBGE, a população de negros (pretos e pardos) havia superado a de brancos, chegando a 53,7% da população (97 milhões). Deste percentual, a maioria (50 milhões) é constituída por mulheres negras, um número equivalente ao total de habitantes de países como a África do Sul e a Coréia do Sul. Uma enorme quantidade de pessoas que, historicamente, têm sido marginalizadas e mantidas na base da pirâmide social.

Democracia racial: uma ideologia a serviço do racismo
No Brasil, a classe dominante construiu a ideologia de que vivemos num país democrático e igualitário, sem conflitos de qualquer tipo, particularmente os étnico-raciais. É este o papel do tão propalado mito da democracia racial: distorcer a realidade, afirmando que, aqui, existe igualdade não só racial, mas também de oportunidades de ascensão social.

Decorrente desta ideologia surgiu outra, particularmente perversa para a população negra: a de que basta “esforço” para “chegar lá” e que a situação de extrema desigualdade entre negros e brancos se “justificaria” pela incapacidade “natural” dos negros e negras em fazer este esforço.

Uma ideologia que está na base dos incontáveis estereótipos e preconceitos usados contra negros e negras: somos “naturalmente” vagabundos, malandros, inferiores e inadequados à “civilização” (beirando o comportamento animal). Estereótipos que, ao servirem como luvas aos interesses dos patrões e do sistema, também servem para encobrir a profunda relação entre a estrutura de classes do sistema capitalista e a superexploração a que negros e negras são submetidos.

Por isso desvelar esse mito é parte fundamental para denunciar o racismo que, no decorrer da História, transformou negras e negros em “objetos” ou “coisas” e definiu nosso lugar na sociedade. Algo particularmente cruel no que se refere às mulheres negras.

Uma rima trágica: racismo e machismo
Marcadas pelo racismo e pelo machismo, negras sofrem todo tipo de violência. Em especial a violência sexual. Estupros, abusos sexuais e tentativas de transformação em “objetos de prazer” são parte da herança maldita deixada pela estrutura patriarcal e escravocrata, que garantia aos senhores o poder absoluto sobre o corpo de nossas ancestrais.

Uma estrutura que foi preservada e consolidada na cabeça dos brasileiros, “naturalizando” a violência sexual contra as negras, ao transformá-las num “produto” (a tal “preferência nacional” pelas “morenas” ou “mulatas”), servido como “profissional do sexo” ou peça de exportação.

Essa idéia está associada à ideologia da mestiçagem, que nega a discriminação racial sobre o argumento de que se somos todos mestiços. Além disso, as negras são as que menos têm acesso aos precários serviços de saúde sexual e reprodutiva existentes no país. E, ainda, os serviços médicos raramente levam em consideração a predisposição biológica para doenças como hipertensão, diabetes, miomas uterinos, hipertensão arterial, câncer do colo do útero, anemia falciforme, etc.

As negras formam a maioria das vítimas de violência doméstica, agressões físicas, assassinatos, pressões psicológicas e assédio moral e sexual em todos ambientes em que circulam. Números difíceis de serem apresentados, pois a maioria das agressões sequer é denunciada.

Uma situação que não foi mudada pelos poucos avanços legais, como a Lei ia da Penha ou o Estatuto da Igualdade Racial. A violência machista e racista só tem aumentado, sem que o Estado brasileiro, há uma década gerenciado pelo PT, nada faça de fato para reverter a situação.

É isto que as jogou para atividades mal remuneradas e com péssimas condições, nas lavouras, nas ruas, (como vendedoras e prostitutas, como empregadas domésticas).
Situação particularmente visível no caso do trabalho informal e das empregadas domésticas. Segundo o IBGE, a taxa de negras na “informalidade” é 71% superior à dos homens brancos e 23% delas são empregadas domésticas. Como contraponto à miserável situação decorrente disto, a maioria, (cerca de 60%) chefia suas famílias e ganha até um salário mínimo.

As negras têm baixa escolaridade. Sua renda média é 2,7 vezes menor do que recebe um homem branco; 1,8 vezes menor do que a média das mulheres brancas e 1,3 vezes menor do que a dos homens negros.

Violência sem fim e sem fronteiras
Também no campo, e particularmente nas comunidades quilombolas, o aumento da violência tem acompanhado o ganancioso (e abençoado pelo governo) avanço do agronegócio. E nas cidades temos presenciado e a crescente militarização da segurança pública em detrimento da vida dos indivíduos. Algo que pode ser exemplificado pela tragédia, orquestrada por Alckmin e Cury, que se abateu sob o Pinheirinho. Particularmente sobre suas mulheres e crianças.

Outra violência está sendo praticada contra milhões de mulheres negras: a ocupação do Haiti pelas tropas da Minustah. Antes mesmo do bárbaro caos que tomou o país depois do terremoto, a ONG haitiana Kay Fanm já havia revelado que 72% das mulheres haviam sido violadas e mais de 40% eram vítimas da violência cotidiana.

Só a luta muda a vida!
Assim como tem suas mãos sujas pelo sangue que corre no Haiti, o governo do PT é cúmplice ativo da persistência da combinação de racismo e machismo que vitima as mulheres negras. E o fato de não fazer nada (ou jogar abertamente contra) para impor ações do Estado que revertam esta situação tem raízes nas opções que o partido (atendendo os interesses de seus novos aliados na classe dominante) vez nos últimos anos.

Algo evidente no recente corte, nas áreas sociais (incluindo a Secretaria de Mulheres e de Promoção da Igualdade Racial, cujos orçamentos já são ridículos), de R$ 55 bilhões para pagamento de dívidas públicas.

Diante disto, só há um caminho para resgatar a dignidade das mulheres negras: a organização para o combate à opressão e discriminação históricas e cotidianas. Motivo pelo qual a Secretaria de Negros e Negras do PSTU também impulsiona movimentos como o “Mulheres em Luta” e o “Quilombo Raça e
Classe”.