OITO ANOS DE FHC E DA APLICAÇÃO DAS DIRETRIZES DO PROJETO NEOLIBERAL NOS ANOS 90 DEIXARAM COMO HERANÇA PARA O BRASIL UMA BRUTAL CRISE SOCIAL, COM NÍVEIS DE DESEMPREGO, QUEDA DE RENDA E PERDA DE SOBERANIA NACIONAL SOBRE RECURSOS E SETORES DA ECONOMIA SEM PRECEDENTES NA HISTÓRIA DO PAÍS

A grave situação social do país coloca como uma necessidade a ruptura com o atual modelo e seus mecanismos de dominação sobre o país (os acordos e monitoramento do FMI, a dívida externa).

Nos últimos 14 meses a renda média do trabalhador na Grande São Paulo sofreu queda. Entre os 79,3 milhões de pessoas (1999) com idade superior a 10 anos que possuem alguma renda, os 10% mais ricos recebem 45,7% de toda a renda gerada no país e os 10% mais pobres, 1%. Os 1% mais ricos dessa população recebem 12,5% da renda. Nos últimos cinco anos houve queda de 10,3% do rendimento médio do trabalho, segundo pesquisa PNAD/IBGE.

O censo do IBGE do ano 2000 constatou que 15% da População Economicamente Ativa (PEA) do país está desempregada. Segundo o Dieese, o desemprego na região metropolitana de São Paulo atingiu 18,9% da PEA em setembro de 2002 (algo em torno a 1,8 milhão de pessoas). A mesma pesquisa constatou que no mês citado 37 mil postos de trabalho foram fechados enquanto 24 mil pessoas entraram no mercado de trabalho.
Poderíamos continuar desfilando aqui muitos outros números para comprovar o tamanho da crise social e que o seu aprofundamento é o verdadeiro balanço da era FHC.
Esta é a realidade que o governo Lula encontrará.

Na verdade, esta realidade o governo Lula já está encontrando, na medida em que o PT aceitou realizar a transição com o governo FHC, exercendo uma espécie de co-governo nestes últimos dois meses do ano para negociar o Orçamento de 2003, que tem que ser votado até o dia 13 de dezembro. Os temas centrais em questão são o salário mínimo, a alíquota de Imposto de Renda, o reajuste e os planos de carreira dos servidores públicos federais.

O problema é que a direção do PT e sua equipe de transição estão aceitando a negociação do orçamento de 2003 sem questionar os limites e metas estabelecidas pelo FMI (superávit primário de 3,75% do PIB), e sem falar nos R$ 75 bilhões do Orçamento estimados para o pagamento de juros da dívida pública.

A aceitação do Orçamento do FMI é o primeiro passo para um caminho que irá condenar o governo Lula (ainda que tenha nos temas sociais a sua prioridade) a limitar-se a distribuir medidas paliativas, como a distribuição de cupons para combater a fome, o que poderá não ser nem mesmo uma mudança de qualidade em relação a medidas parecidas aplicadas pelo governo FHC que, como sabemos, não serviram sequer para estagnar a crise social.

ROMPER COM O FMI PARA TER FOME ZERO

Lula elegeu como sua prioridade de governo o combate à fome e a miséria. Afirmou que se ao terminar o seu mandato cada brasileiro estiver fazendo três refeições ao dia, seu governo terá valido a pena.

É uma prioridade justa em um país onde 50 milhões de pessoas (quase um terço da população) vivem na miséria, a mercê do flagelo da fome. A questão a saber é qual o calibre das medidas que devem ser tomadas para que em quatro anos 170 milhões de pessoas tenham o direito garantido de três refeições ao dia (o que não seria uma mudança qualquer).

A saída oferecida pelo novo governo é a do projeto Fome Zero, elaborado pelo Instituto da Cidadania e assumido pelo PT como parte do programa de governo.
O projeto defende várias medidas estruturais a serem tomadas, como reforma agrária e programas de geração de emprego. Mas o que está sendo sinalizado como carro chefe deste programa são as “políticas específicas” (cupons de alimentação e cestas básicas emergenciais).

Ninguém é contra que o Estado faça intervenções emergenciais diante de catástrofes que afetam milhões de trabalhadores, como uma seca do Nordeste. O problema é que a aceitação do orçamento do FMI e do pagamento da dívida externa vai limitar o combate a fome a essas medidas. Não é por acaso que o novo governo já se debate na forma em como seriam distribuídos os cupons de alimentação, ou como remanejar recursos dos gastos sociais do Orçamento para gerir os R$ 5 ou 6 bilhões previstos para serem gastos em 2003 no projeto Fome Zero.

Outro exemplo desse problema: entre as medidas propostas pelo Fome Zero está o aumento do salário mínimo. Mas o futuro governo petista já está desmontando a sua própria proposta de salário mínimo de 240 reais, feita para o Orçamento de 2003: “Quando se discutem propostas que o PT fez, esquece-se que aquele cenário econômico não existe mais, numa situação orçamentária que não existe mais. Em relação à nossa proposta de mínimo de 240 reais, o que mudou foi o agravamento da situação do país. Vamos discutir com a sociedade a situação que estamos herdando, não a situação de um ano atrás”. (José Dirceu, presidente nacional do PT, Folha de S.Paulo, em 5/11/02).

A única coisa rigorosamente nova do ponto de vista do Orçamento foi o novo acordo com o FMI. O agravamento da crise não é em si nenhuma novidade; há um ano atrás, por exemplo, o país estava sob a crise do apagão, que provocou a estagnação da economia e uma nova onda de demissões e arrocho salarial. Além disso, o conceito de que o agravamento da crise diminui a possibilidade de medidas para melhorar a situação dos trabalhadores não é aceitável.

Lembremos que o desemprego continua subindo, a renda caindo e a burguesia se prepara para cobrar o seu pacto social nas reformas que o próprio governo Lula colocou na mesa (direitos trabalhistas, previdenciários, etc).

Os trabalhadores brasileiros e suas entidades devem exigir que o governo Lula tome medidas de fôlego para combater a fome e a miséria.

É possível o Brasil chegar a fome zero, mas para isso será preciso enviar zero centavos para o FMI e os banqueiros

* Colaborou Luiza Casteli

Post author Fernando Silva*, da redação
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