A atitude de Viviana e Benigna, ao lutar pelos direitos de seus filhos e de seus próprios, é uma atitude revolucionária ao subverter a ordem patriarcal vigente e amplia o horizonte para milhares de mulheres paraguaias. Os fatos atuais relacionados à paternidade de Lugo, que surgiram a partir da decisão destas mulheres de enfrentar uma sociedade e um Estado machistas, moralistas, repressores e abusivos, expõe publicamente a realidade de abuso, abandono e condenação que sofrem milhares de mulheres em nosso país, assim como a inacreditável impunidade dos homens que gozam, historicamente, da cumplicidade das instituições.

É necessário denunciar a responsabilidade do Estado ante os 70% de meninas e meninos não reconhecidos pelos pais segundo a mídia. Este Estado condena e vitimiza milhares de mulheres, especialmente as trabalhadoras e pobres, quando reclamam justiça. Não nos é alheia a cumplicidade patriarcal de muitos administradores do poder judiciário e dos mecanismos de justiça, mais ainda quando os casos afetam homens com certo poder, como os padres, os políticos, os militares, os advogados e médicos, entre outros. A permissividade da sociedade com os homens em suas atitudes de caráter sexual e reprodutivo e a consequente impunidade que isso implica, são revoltantes, mas são mais ainda quando a negação da outra pessoas e de seus direitos acontece a partir de uma posição de poder que dá lugar ao abuso, à manipulação, ao engano, à utilização e à chantagem.

Mulheres pobres e abuso de poder
O caso de Benigna Leguizamón é um caso emblemático: uma mulher jovem, pobre, camponesa, mãe solteira, totalmente vulnerável, que recorre à igreja para pedir trabalho e é seduzida e manipulada por uma posição de poder. Nada mais e nada menos do que por ele, o bispo da igreja católica e atual presidente da República, Fernando Lugo, cujo comportamento e posterior actitude são a expressão mais legítima dos mecanismos de opressão à mulher nesta sociedade machista e patriarcal.

Os direitos de meninos, meninas e mulheres versus o “privado”
Nem a paternidade, nem os filhos e filhas são “questões privadas”. A dignidade e os direitos das pessoas são assuntos de interesse e competência de todos e todas, ainda que sua defesa e exigência possam afetar interesses particulares dos poderosos. O questionamento a estas mulheres por “expor desta maneira seus filhos” é feito por conta da aceitação de uma sociedade moralista que discrimina, condena e desconhece os direitos tanto destas mães quanto de seus filhos. A denúncia e exigência são consideradas uma exposição somente para aquelas mulheres ou pessoas que, de alguma forma, buscam resolver suas vidas. Para as mulheres pobres, a dignidade de seus filhos e filhas passa pela alimentação, a moradia, a educação e a saúde a que não têm acesso. Por isso lutam pelo reconhecimento dos direitos de seus filhos, não por egoísmo, como colocam alguns evidentemente em posições mais cômodas.

Abrindo caminho
O Partido dos Trabalhadores saúda a estas mulheres e se solidariza com elas, pois de cabeça erguida saíram a defender os direitos de seus filhos e os seus próprios, abrindo um caminho ao qual têm de somar-se os setores oprimidos e explorados, verdadeiros agentes da mudança. Porém não devemos perder de vista que este, ainda que seja um avanço significativo, não é ainda suficiente. A superação das múltiplas formas de opressão que sofrem as mulheres somente será alcançada quando não houver mais mulheres trabalhadoras pobres e exploradas, além de oprimidas, ou seja, quando conseguirmos uma sociedade sem nenhum tipo de exploração nem opressão.

Chamamos a todas as mulheres que são vítimas deste tipo de abandono e descaso a seguir o exemplo de Viviana e Benigna e a lutar por seus direitos e de seus filhos e filhas e, se necessário, obrigar aos homens, à sociedade e ao Estado a reconhecê-los e criá-los.

Chamamos a todas as organizações de mulheres a ficarem alertas para apoiar estas mulheres em suas justas reivindicações, seja quem seja o pai irresponsável, e a dar continuidade e atenção especial ao caso de Benigna, porque sabemos que neste país recorrer à Justiça, lamentavelmente, não garante nada e menos ainda quando se é pobre e mulher.

Fazemos o jogo da direita?
A partir de nosso posicionamento sobre a situação criada pelos “pedidos de paternidade feitos a Lugo”, o Partido dos Trabalhadores tem sido questionado, uma vez mais, como se estivesse fazendo o jogo da direita. Há quem diga com insistência que estamos facilitando o caminho a Franco. Diante destas reações, somos obrigados a esclarecer o seguinte:

  • A prática abusiva e machista de Lugo e as violações dos direitos dos meninos e meninas que ele perpetrou são inteiramente de sua responsabilidade e creditáveis totalmente a ele.
  • O governo de Lugo, por sua política e por sua composição, responde aos interesses da classe dominante. No entanto, vanguardas inteirras do movimento e da esquerda o consideram seu governo e lhe dão seu apoio, acreditando que ele é o caminho para as mudanças que nosso povo precisa.
  • Como governo burguês, não merece nem nosso respeito, nem nosso apoio. Nem sequer solidariedade com relação ao que as esquerdas luguistas chamam de medidas progressivas, para nós inexistentes.
  • Repudiamos e condenamos a direita, como sempre temos feito, por ser exploradora e opressora, em todas suas expressões: PLRA, ANR, PQ, UNACE e demais aliados menores no parlamento.
  • Propomos reagrupar, urgentemente, as forças do movimento dos trabalhadores e camponeses e a esquerda, não para sustentar o governo Lugo, nem para ser um peão da direita, mas para desenvolver um espaço de classe e socialista que evite o retrocesso dos avanços que o povo conquistou, ou seja, um terceiro espaço de oposição à direita tradicional e ao governo de Lugo, que aponte para um governo operário e popular verdadeiramente revolucionário.