Declaração da Liga Internacional dos Trabalhadores – Quarta Internacional (LIT-QI)O caráter genocida dos ataques realizados pelas tropas israelenses no Líbano e na Palestina ficou explícito nos últimos dias. Um bombardeio israelense contra a cidade libanesa de Qana matou quase 60 pessoas. A metade eram crianças refugiadas num edifício. Um voluntário da Cruz Vermelha declarou: “Posso dizer que é um massacre. A maioria das vítimas fugia das bombas israelenses”.

Os ataques aéreos israelenses das últimas semanas mostram o claro objetivo de quebrar a vontade do povo libanês e destruir, em poucos dias, o resultado de vários anos de esforço de reconstrução deste pequeno país. Por isso, entre outros “perigosos alvos militares”, os israelenses destruíram estradas, centrais elétricas, aeroportos, comércios, a principal fábrica de produtos lácteos do país, uma fábrica de alimentos, duas indústrias farmacêuticas, centros de tratamento de água, igrejas, hospitais e ambulâncias.

Os ataques já causaram a morte de mil libaneses, em sua maioria civis. Em um país com menos de quatro milhões de habitantes, um milhão já abandonou suas casas e cerca de 500 mil deixaram o país. Ao mesmo tempo, o exército sionista está matando em média 25 palestinos por dia nos territórios de Faixa de Gaza e Cisjordânia.

Israel não alcança seus objetivos
Apesar de sua violência genocida, Israel não está conquistando seus objetivos militares e políticos no Líbano. Em primeiro lugar, está muito longe de derrotar militarmente o Hizbollah, como ficou claro na cidade de Bint Jbeil, considerada um dos principais bastiões da resistência. Depois de quase destruí-la, as tropas israelenses sofreram uma emboscada que provocou numerosas baixas e vários tanques incendiados. Ao mesmo tempo, o Hizbollah continua disparando dezenas de mísseis sobre o norte de Israel.

Um analista da BBC de Londres, Bob Watson, disse: “Os mesmos soldados israelenses confessam, surpreendidos pela ferocidade da resistência que encontram e as armas sofisticadas que usam, em particular seus mísseis antitanque. (…) Em conversas privadas, alguns funcionários militares israelenses reconhecem o quanto é pouco provável uma vitória militar sobre o Hizbollah. O máximo que se pode esperar, dizem, é ganhar alguns pontos. Para ter alguma possibilidade de infligir um real dano ao Hizbollah, Israel teria que iniciar uma ofensiva em grande escala por terra, estratégia que até o momento encontra resistência por parte de seus lideres militares e políticos”. (Qué ha ganado el ejército israelí?, La Nación de Argentina, 31/07/06).

O que deveria ser uma “guerra curta” já dura várias semanas e ameaça transformar-se num conflito muito mais longo e cada vez mais custoso. A atual ofensiva terrestre em grande escala desatada por Israel no sul do Líbano aumenta as chances de Israel apostar em uma guerra prolongada.

A armadilha da “força de paz” da ONU
Nesse contexto militar, começa a crescer a alternativa, impulsionada por diversos governos imperialistas europeus, nações árabes e a Igreja Católica, de enviar um contingente de soldados da ONU ao Líbano. A LIT-QI denúncia esta proposta que é, na verdade, uma armadilha do imperialismo para defender seus interesses e os de Israel na região.

A ONU não é neutra nesta luta. Esta organização sempre foi um instrumento das potências imperialistas e, por distintas vias, sempre defendeu Israel. Menos “neutras” seriam as tropas da OTAN.

Recordemos que foi uma resolução da ONU, em 1947, que criou o Estado de Israel e legalizou a “usurpação armada” do território palestino que o sionismo realizava. Durante décadas, as Nações Unidas fecharam os olhos para os crimes do Estado sionista ou se limitaram a aprovar resoluções com limitadas críticas. Em 2004, a ONU votou a resolução 1559, exigindo o desarmamento do Hizbollah. Quem pode acreditar que as tropas francesas ou italianas (prováveis exércitos que serão enviados ao Líbano), quer dizer, de governos imperialistas que sempre apoiaram e defenderam Israel, serão os “guardiões da ‘paz’”?

Na realidade, o envio de tropas pode ter dois objetivos, dependendo do resultado da atual guerra. Caso Israel obrigue o Hizbollah a retroceder ao norte do rio Litani, as tropas da ONU buscarão consolidar esse avanço e empurrar suas forças militares até o centro e o norte do Líbano. Se, ao contrário, o curso da guerra for desfavorável para Israel, as tropas da ONU tentarão impedir uma derrota israelense, retirando os combatentes do Hizbollah da fronteira libanesa-israelense.

Por isso, a LIT-QI se opõe completamente a qualquer envio de tropas da ONU ao Líbano.

Paremos já o genocídio sionista!
Nunca ficou tão claro o caráter racista e genocida do Estado de Israel. As atrocidades cometidas na Palestina e no Líbano levaram muitos dos que sempre defenderam o direito da existência de um Estado judeu, como o argentino Adolfo Pérez Esquivel, Prêmio Nobel da Paz, a afirmar que hoje Israel é um “estado terrorista”.

Um grupo de 45 intelectuais judeus britânicos anunciou, em uma carta enviada ao jornal The Guardian, que renunciam ao direito de todo judeu de ter a cidadania israelense, assegurado pela constituição do país. Na carta, denunciam que o “direito de retorno” é negado aos palestinos que foram obrigados a emigrar em massa. Finalizam dizendo que: “A política de Israel é bárbara, não desejamos nos identificar de nenhum modo com o que Israel está fazendo”.

Saudamos esta valente atitude e acreditamos que ela deve ser seguida por todos os judeus do mundo realmente democráticos que se opõem ao racismo sionista e a seus crimes.

Estes fatos mostram que hoje é possível gerar um grande movimento mundial ao redor de duas reivindicações centrais. Paremos já o genocídio que Israel está cometendo no Líbano e na Palestina! Imediata retirada das tropas israelenses do Líbano e dos territórios palestinos!

Em todos os países, devemos exigir dos governos a imediata ruptura das relações diplomáticas com Israel até que cesse a agressão.
Já foram realizadas numerosas ações deste tipo em muitas cidades e países do mundo. Mas é imprescindível multiplicá-las e massificá-las, incorporando as organizações políticas, sociais e de direitos humanos.

Além disso, outra forma concreta de impulsionar esta campanha é a proposta que fizeram vários sindicatos portuários da Grã Bretanha: boicotar os envios de produtos que Israel exporta.

No caso dos países sul-americanos que integram o Mercosul (Argentina, Brasil, Paraguai, Uruguai e Venezuela), é urgente a exigência aos governos de que rompam imediatamente o Tratado de Livre Comércio que acabam de firmar com Israel. Nenhum acordo comercial com o Estado assassino! No caso dos países europeus, é preciso exigir a imediata suspensão do “tratado de preferência comercial” que têm com Israel.

É possível derrotar o imperialismo e Israel
A realidade atual dos enfrentamentos militares no Líbano, Iraque e Afeganistão demonstra que é possível derrotar o imperialismo e Israel. Pela importância que o fato teria para todos os trabalhadores e povos do mundo, esta é a principal tarefa para todos os lutadores e revolucionários. Pela mesma razão, nesta luta entre o Hizbollah e as tropas sionistas, a LIT-QI coloca-se claramente no campo militar do Hizbollah e pela derrota de Israel, por mais que sejam profundas as diferenças e críticas que temos com a direção desta organização.

Por um grande movimento de resistência unificada libanesa
Israel não conseguiu até agora isolar e debilitar politicamente o Hizbollah. Pelo contrário. Ao assumir a defesa do país contra o agressor, o Hizbollah aumentou enormemente seu prestígio e sua influência. Uma pesquisa do Centro de Estudos e Informação de Beirute (BCRI) indica que 87% dos libaneses apóia o Hizbollah, incluindo seus velhos inimigos (os cristãos maronitas e os drusos).

Tal apoio expressou-se na mobilização diante da sede da ONU em Beirute, logo após o ataque a Qana. Os manifestantes, entre eles jovens cristãos da Frente Patriótica Libanesa, gritaram o nome do líder do Hizbollah e entoaram: “Hoje estamos todos juntos pelo Líbano” e “Todos somos da resistência”.

Por ser hoje a direção indiscutida das massas libanesas, a LIT-QI considera que o Hizbollah tem em suas mãos a possibilidade de concretizar duas tarefas centrais para fortalecer a luta contra Israel. A primeira, e a mais urgente, é a construção de um movimento unificado de resistência militar e política para derrotar o invasor israelense. Um movimento que deve incorporar todos aqueles que estão dispostos a lutar em defesa do país, independentemente de sua crença religiosa (xiitas, sunitas, drusos e cristãos maronitas).

A segunda tarefa é terminar com o reacionário sistema confessional da atual constituição libanesa, que divide a população por crenças religiosas. Este caráter confessional, imposto pelo imperialismo francês na época da criação do país, só serviu para dividir o povo libanês. Hoje, a realidade permitiria criar um Estado libanês realmente democrático.

É especialmente importante a incorporação nesta luta dos mais de 500 mil refugiados palestinos que vivem no Líbano e o reconhecimento de seus direitos políticos, já que hoje são marginalizados. Isto é essencial não só por seu peso social, mas também porque seria uma forma concreta de unir as lutas contra Israel na região.

É necessário assinalar que estas duas tarefas podem entrar em contradição com a ideologia fundamentalista do Hizbollah e com sua proposta de criar um Estado islâmico. Por isso, a única garantia de que tais propostas sejam levadas adiante é a mobilização e a luta das massas libanesas.

Pela unidade das massas árabes e muçulmanas
O prestígio do Hizbollah está se estendendo também ao resto das nações árabes e muçulmanas. Um analista do The New York Times escreveu: “Com centenas de libaneses mortos e o Hizbollah resistindo contra as forças israelenses há mais de duas semanas, a opinião pública em todo o mundo árabe se voltou a favor do grupo terrorista, que converteu o líder do grupo xiita, o xeique Hassan Nasrallah, em um herói popular e obrigou alguns governos a endurecer com Israel”. As mobilizações de apoio ao Hizbollah se estendem cada vez mais, inclusive nos países com ditaduras amigas de Israel, como Egito, Arábia Saudita e Jordânia, ou ocupados militarmente, como ocorreu em Bagdá, no Iraque.

A situação do Oriente Médio agrava-se cada vez mais. Hoje existem na região quatro guerras de libertação nacional em curso: Iraque, Afeganistão, Palestina e Líbano. Esta realidade coloca uma tarefa urgente: a necessidade de unificar o conjunto das massas árabes e muçulmanas em sua luta contra as ocupações imperialistas e Israel.

Pelo prestígio conquistado, o Hizbollah tem uma grande responsabilidade, ainda que até agora tenha atuado de modo muito limitado. O caminho para derrotar Israel foi iniciado quando o Hizbollah atacou um posto militar israelense em solidariedade aos palestinos.

A possibilidade de um triunfo das massas árabes e muçulmanas será maior quanto mais ampla e unida seja a luta. É evidente que, com a unificação das lutas das resistências no Iraque, Afeganistão, Palestina e no Líbano em uma guerra de libertação nacional, o imperialismo e Israel teriam muito mais dificuldades para se impor na região. Por isso, a unidade pode ser a chave para terminar com as ocupações de Iraque e Afeganistão, para derrotar Israel na Palestina e no Líbano e para expulsar as bases militares norte-americanas em países como Arábia Saudita e Kuwait.

Ao mesmo tempo, existem comunidades árabes e muçulmanas em muitos países do mundo e é possível organizar comitês de apoio e solidariedade aos povos iraquiano, afegão, palestino e libanês.

Para ajudar nesta luta, os governos de Irã e Síria devem passar das palavras aos fatos e dar todo o apoio militar necessário. É correto que forneçam mísseis ao Hizbollah, contudo esses países devem e podem fazer muito mais: mandar soldados, brigadas de voluntários, aviões, canhões de defesa antiaérea. No caso do Irã, é necessário exigir que seu governo chame as correntes xiitas no Iraque, sobre as quais tem muita influência, a abandonarem o governo colonial do país e lutar contra as forças de ocupação.

O apoio popular ao povo libanês na região é tão grande que até as ditaduras agentes do imperialismo e amigas de Israel, como Arábia Saudita, Egito e Jordânia, tiveram que adequar suas declarações públicas. É necessário exigir deles também a ruptura imediata com Israel ou, caso contrário, as massas têm todo o direito de pôr fim a esses governos por cumplicidade com os genocidas.

Pelo fim do Estado de Israel
Ao mesmo tempo em que impulsionamos e participamos destas ações unitárias, a LIT-QI sustenta que não haverá paz no Oriente Médio enquanto existir o Estado de Israel, uma das principais fontes do conflito militar permanente na região.

Em primeiro lugar, Israel foi criado como um enclave colonial que usurpou o histórico território palestino e expulsou grande parte de sua população. Segundo, Israel é de fato uma grande base militar do imperialismo contra as massas árabes e muçulmanas: é a quinta potência militar do mundo, com o maior poder de fogo por habitante do planeta. É um Estado que vive da guerra, financiado pelo imperialismo.

Metade de seu orçamento nacional é composto por fundos enviados pelos EUA. Em terceiro lugar, Israel é, de acordo com sua constituição, um Estado racista, cuja legislação só pode ser comparada à Alemanha nazista ou ao apartheid sul-africano.
A feroz repressão aos palestinos e a agressão militar permanente a seus vizinhos são resultado da própria “natureza” de Israel. Não haverá paz na região se esse Estado policial, colonial e racista não desaparecer e se não expulsarmos o imperialismo, começando pela sua derrota no Iraque e no Afeganistão.

Ao mesmo tempo, a LIT-QI expressa que, diferente das correntes fundamentalistas islâmicas como o Hizbollah, que propõem a instauração de um Estado islâmico na Palestina e em outras nações do Oriente Médio, participamos desta luta sob a bandeira de fundação da OLP (Organização para a Libertação da Palestina): uma Palestina laica, democrática e não racista. Esse seria um passo adiante na construção de uma Federação de Repúblicas Socialistas no Oriente Médio.

Secretariado Internacional da LIT-QI (Liga Internacional dos Trabalhadores – Quarta Internacional).
Agosto de 2006

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