PSTU-PE

À 0h do dia 22 de dezembro até às 12h do dia 23, quando houve a suspensão do movimento, a região metropolitana do Recife foi sacudida por uma poderosa greve dos rodoviários, que fez sumir praticamente todos os ônibus às vésperas do Natal. No dia 28 de dezembro teve o julgamento no Tribunal Regional do Trabalho da 6° Região onde, por 8 votos a 7, a greve foi decretada abusiva. Pelo tamanho, força e importância da greve é preciso que a classe trabalhadora e a juventude tirem algumas lições fundamentais desse processo.

1° Lição

A greve mostrou que não há nada de imparcialidade na imprensa, ao contrário, como qualquer empresa capitalista, os veículos de comunicações atuaram durante todo o movimento dos rodoviários para jogar a população contra a luta dos grevistas. O revolucionário negro Malcolm-X dizia que “se você não for cuidadoso, os jornais farão você odiar as pessoas que estão sendo oprimidas, e amar as pessoas que estão oprimindo.

No dia da greve, foi comum a imprensa, principalmente a Globo Nordeste, mostrar imagens dos terminais lotados e ônibus cheios, tentando criminalizar os rodoviários e jogar a população contra os trabalhadores ao afirmar que, com o movimento, se colocava a vida das pessoas em risco de contaminação no meio de uma 2° onda da pandemia. Apesar dessa campanha midiática de difamação, a força e justeza da greve rodoviária era tão forte que muitas pessoas entrevistas declaravam o apoio e se solidarizavam pela luta contra a demissão dos cobradores e dupla função dos motoristas.

Na própria Globo Nordeste, foi feita uma pesquisa virtual em que 67% da população era a favor da luta dos rodoviários. Também foi comum a população desmentir os jornalistas que queriam associar a lotação dos ônibus à greve. Muitos entrevistados diziam “que esse caos é assim todo dia, independente da greve”. Os rodoviários, com sua luta, mostram o caráter de burguês da imprensa e, o mais importante, geraram um sentimento solidariedade e unidade de classe da população com os grevistas que fez frente à campanha de desmoralização dos veículos de comunicação.

2° Lição

O sistema de transporte rodoviário é uma concessão do Estado ao setor empresarial, isso significa que cabe ao governo Paulo Câmara o poder de lei e decisão sobre qualquer aspecto que envolva a frota de ônibus. Em nenhum momento, o governo usou esse poder para impedir as demissões dos cobradores, a dupla função dos motoristas e a superlotação dos ônibus com a redução da frota na pandemia. Ao contrário, o governo do PSB deixou os empresários descarregarem sobre os rodoviários e os usurários do transporte os efeitos da pandemia para atender os lucros da máfia dos ônibus.

Paulo Câmara editou uma portaria que obrigava, via o Consórcio Grande Recife, agência estadual que regulamenta a mobilidade da Região Metropolitana do Recife, que os ônibus não poderiam circular sem cobrador e que os empresários deveriam readmitir todos os rodoviários demitidos durante toda a pandemia. Mas isso só foi uma jogada eleitoral do governo estadual para viabilizar a eleição do seu candidato, João Campos (PSB), para prefeitura do Recife. Em nenhum momento implementou essa portaria. O governo estadual mostrou, com sua ação, que é um comitê para gerir os negócios da burguesia e toda sua ação tinha como objetivo enganar, desarmar e derrotar os trabalhadores em luta. Todo trabalhador consciente deve educar os trabalhadores e a juventude a não confiar em nenhum governo sob o capitalismo, de saber que são seus inimigos e que só se pode confiar na sua luta, força e organização independentes dos governos e dos patrões.

3° lição

Há uma ideologia muito forte e enraizada pela burguesia na cabeça dos trabalhadores de que vivemos um Estado democrático de direito e de que a justiça zela para garantir a igualdade e a conciliação entre patrões e empregados. Mas em momentos como uma greve como a dos rodoviários o véu que encobre o caráter de classe da justiça fica desmascarado.

Quando se fez o primeiro acordo no TR da 6° Região entre empresários e o sindicato dos rodoviários, a justiça não aplicou nenhuma multa ao sindicato que representa os donos de ônibus, a Urbana-PE. Tampouco foi chamada a Polícia Militar para se efetivar a decisão judicial. Logo depois do descumprimento, o Tribunal de Justiça de Pernambuco declarou a portaria do governo Estadual inconstitucional permitindo que os empresários continuassem a demissão em massa de cobradores e a dupla função aos motoristas. Depois da deflagração da greve a justiça não apenas obrigou a que 50% da frota circulasse como estipulou uma multa de 100 mil reais ao sindicato se houvesse qualquer piquete ou mobilização na frente das garagens.

A justiça mostrou quem está ao lado dos ricos na defesa do lucro dos patrões e é muito ágil para acabar com o direito de greve e, da mesma forma, age para criminalizar o movimento como foi a última decisão do TRT da 6° Região que decretou a greve abusiva, uma multa caso o sindicato faça a luta e permitiu os descontos dos dias de greve aos rodoviários.

As leis e a justiça são burguesas e por isso mesmas são defensoras do caráter inviolável da propriedade privada e do lucro. E quando a classe trabalhadora consegue alguma conquista na justiça ou introduzir alguma lei que a beneficie é como subproduto da sua luta, mas mesmos essas são sempre ameaçadas pelas necessidades da burguesia.

4° lição

Quando o governo e a justiça burgueses não conseguiram deter a força da greve apelaram para o último bastião de defesa da propriedade privada: a PM. Nos piquetes de greve nas garagens a PM foi o braço repressivo para intimidar e garantir o funcionamento com os fura-greves. Em muitos momentos, a polícia atacou violentamente ativistas para permite que os lucros dos empresários de ônibus fossem intocados. A Polícia Militar cumpria as ordens de Paulo Câmara, da justiça, mas principalmente do sindicato patronal, inclusive muitos seguranças privados das empresas são policiais que estavam em coordenação com os comandantes das tropas nas garagens. É muito importante que o movimento incorpore sua organização de autodefesa para evitar provocações e garantir a defesa e integridade da luta e dos lutadores.

5° lição

Em toda greve de importância regional como essa, dos rodoviários, é preciso que a classe trabalhadora, especialmente aquelas organizadas no sindicato, façam a avaliação da direção das lutas. No caso especifico, é preciso saber como atuou a direção do sindicato, encabeçada pela corrente interna do PSOL, a Resistência. A política de organizar e deflagrar a greve esteve correta desde o princípio, como uma necessidade para dar uma resposta aos ataques da patronal e do governo de Paulo Câmara. Agora, não podemos deixar de fazer algumas reflexões sobre os erros que, em nossa opinião, foram decisivos e que influenciaram no desfecho da luta dos rodoviários.

A direção/Resistência acreditava que era possível, com a lei aprovada na Câmara Municipal sancionada pelo Prefeito e transformada em Portaria pelo governo do Estado, reverter as demissões e obrigar os empresários a cumpri-la. A realidade da luta de classes mostrou que não bastam leis em acordos entre a justiça, o Estado e os patrões. A única garantia que a classe trabalhadora tem é confiar nas suas forças e nos seus métodos de luta e organização para arrancar conquistas e manter seus direitos.

A declaração política da suspensão da greve, através do Presidente Aldo Lima, por si só, é uma tragédia, ao afirmar que a suspensão de greve para garantir as compras de Natal. Reproduziu-se a mesma lógica que a burguesia utiliza de colocar o lucro acima da vida quando se confirma o aumento do nível de contágio pela Covid-19 no estado.

Outro elemento, não menos importante, é o papel da organização para a categoria lutar. Seria fundamental, desde o início, construir um grande comando de mobilização que juntasse os lutadores de cada garagem com o sindicato, para que todas as decisões fossem construídas coletivamente o que só fortaleceria e aumentaria a força greve e golpearia ainda mais forte a patronal e todos os seus aliados, como o Governo de Paulo Câmara e poderia, com essa força, impor também uma vitória na justiça. Mesmo que a suspensão da greve tenha sido o melhor caminho pela correlação de forças, o erro foi não ter convocado uma assembleia ou algum fórum que a categoria pudesse decidir – algo que aconteceu anteriormente na primeira greve quando a diretoria/Resistência depois de uma reunião com o governo – e não encerrá-la por decreto burocraticamente pela diretoria.

6° lição

A greve mostrou que é fundamental não apenas a manutenção dos cobradores, o fim da dupla função dos motoristas, como também o aumento da frota para evitar o contágio da Covid-19 e a lotação vexatória nos ônibus e terminais de integrações, o passe-livre para estudantes e desempregados. Essas demandas urgentes dos trabalhadores do transporte e da população são impossíveis de ser realizadas enquanto os ônibus estiveram sob o controle dos empresários e da lógica do lucro acima da vida. Para acabar com os ataques dos direitos dos trabalhadores rodoviários e garantir a população um transporte gratuito digno e de qualidade é fundamental tirar das mãos dos patrões com a estatização dos ônibus e colocá-los sob o controle de um conselho popular formado por rodoviários e os usuários como forma de garantir uma gestão democrática e a serviço das necessidades dos trabalhadores e do povo pobre da Região Metropolitana Recife.