LIT-QI

Liga Internacional dos Trabalhadores - Quarta Internacional

Existe uma grande simpatia dos ativistas em todo o mundo pela revolução árabe contra ditaduras pró-imperialistas que oprimem estes países há décadas. Mas em relação à Líbia há uma grande confusão. É ou não parte do mesmo processo? E agora, com a invasão imperialista, de que lado se posicionar?

A primeira confusão acontece porque as correntes stalinistas e chavistas tentam de todas as maneiras convencer que a rebelião do povo líbio é falsa e que Kadafi é um lutador anti-imperialista. Com os métodos típicos do stalinismo, tentam convencer que a Líbia não é parte do mesmo processo árabe.

Mas a realidade entra pela janela, pelas portas e pelo teto. Basta ver as notícias das milícias de trabalhadores e jovens nas cidades rebeladas contra Kadafi, para ver a falsidade dos stalinistas. É a mesma efervescência da Praça Tahrir do Egito, que teve de se armar para enfrentar um genocida. É o que aconteceria no Egito, caso o exército tivesse reprimido a revolução. É o que pode acontecer no Iêmen e no Bahrein, caso a repressão violenta (apoiada pelo imperialismo) continue.

Confusão deliberada
Na verdade, Castro e Chávez confundem deliberadamente o Kadafi de 40 anos atrás com o atual. Ele liderou um golpe militar em 1969 que derrubou a monarquia e nacionalizou o petróleo, tendo seguidos choques com o imperialismo. Já na década de 1990, teve um brutal giro à direita, entregando o petróleo líbio para Shell, British Petroleun, ENI (italiana) e Total (francesa). Tornou-se um grande burguês, com negócios diretos com as multinacionais. Por exemplo, possui 10% das ações da Fiat e 7% do banco italiano Unicredit. Passou a ser recebido com festas pelos governos europeus, como no ano passado, por Sarkozy e Berlusconi.

Kadafi teve um percurso semelhante ao de outras correntes nacionalistas burguesas que capitularam completamente ao imperialismo, como o nasserismo e o peronismo. O Kadafi de hoje não é igual ao Perón que nacionalizou as ferrovias inglesas na Argentina na década de 50, mas ao peronista Menen que implantou o neoliberalismo.

Não é igual ao Nasser que nacionalizou o canal de Suez, mas é igual a Mubarak.
A revolução em curso na Líbia é, portanto, muito semelhante às que estão ocorrendo em todo o mundo árabe. Mas apresenta também algumas diferenças importantes. A primeira é que Kadafi reagiu com uma repressão sangrenta, utilizando métodos semifascistas semelhantes aos de Israel, bombardeando populações civis com aviões. Por esse motivo, a revolução tomou o rumo de uma guerra civil.

Ficará registrado para sempre na história que Castro e Chávez mantiveram o apoio a Kadafi nessa guerra civil. Sustentaram diretamente a repressão e o genocídio do povo, sujando suas mãos com o sangue líbio.

E agora, com a intervenção imperialista?
A segunda diferença é a intervenção militar direta do imperialismo na região. Isso provocou outro tipo de confusão. E agora, o que fazer? Essa é a pergunta que os ativistas se fazem. A maioria está de acordo que é equivocado apoiar Kadafi. Mas a discussão ficou muito mais confusa depois da intervenção militar do imperialismo.

Isso não daria razão aos que apoiam Kadafi?
Não, não dá. O imperialismo não intervém porque Kadafi é anti-imperialista. Ele entregou todo o petróleo do país. Muito menos porque Kadafi é um ditador, já que estão apoiando nesse momento a mesma repressão no Bahrein.

O motivo para a intervenção é porque o imperialismo quer se apropriar diretamente do petróleo e estabelecer uma zona controlada no meio da revolução árabe. Não confia mais em Kadafi, porque não acredita que ele possa estabilizar a região, mesmo que consiga uma vitória militar. É muito provável que, se isso ocorresse, a enorme oposição ao ditador resultasse em uma guerrilha de massas.

Então, como se posicionar em meio à revolução do povo líbio contra Kadafi e à intervenção militar imperialista? Não seria o caso de deixar de lado a luta contra

Kadafi e centrar na batalha contra o imperialismo?
Não. Existem duas guerras, uma contra Kadafi e outra contra o imperialismo. Não se pode resumir a complexidade do problema líbio apenas a uma das guerras, sob pena de uma capitulação grosseira ao imperialismo ou a Kadafi.

Nada melhor para discutir a correção de uma posição política do que levá-la à realidade concreta. Imaginem só a situação hoje de um grupo de militantes revolucionários em Bengazi ou Misrata, bastiões do povo rebelado. Eles não podem deixar de lutar contra Kadafi, que manteve os ataques contra essas duas cidades, matando 90 pessoas.

Seria necessária uma unidade de ação com Kadafi contra o imperialismo? Em termos abstratos sim, mas isso é impossível política e militarmente. O grande obstáculo é o próprio Kadafi. Politicamente é impossível pelo ódio causado entre a ampla maioria das massas líbias pelo genocida Kadafi. Em termos militares, é impossível pela continuidade da agressão das forças do ditador. Por isso, a necessidade das duas guerras.

Aqueles que defendem unicamente o repúdio à intervenção do imperialismo, calando sobre Kadafi, estão situados no campo político e militar desse genocida. São cúmplices dos massacres do Mubarak líbio.

Guerra contra o imperialismo
Por outro lado, a necessidade da guerra também contra o imperialismo leva ao necessário enfrentamento com a direção do Conselho Nacional Líbio, que se autoapresenta como representante do levante contra Kadafi. Esse conselho está apoiando a ação militar imperialista. Essa é uma atitude traidora da causa árabe por abrir as portas para que o imperialismo possa se recuperar do duro golpe que está sofrendo com a derrubada das ditaduras na região. Um território dominado pelas tropas da ONU será um bastião contra toda a revolução árabe.

É fundamental que os lutadores em Bengazi e outros territórios liberados retomem a atitude anti-imperialista que existia na área antes da contraofensiva de Kadafi. Não se pode aceitar a atitude desse conselho, praticamente uma unidade de ação com o imperialismo. Os governos imperialistas têm como objetivo acabar com a revolução árabe. Assim que puderem, as armas norte-americanas e europeias vão se virar contra as milícias armadas da oposição.