Enquanto realizava sua brutal agressão militar aos territórios palestinos de Gaza e Cisjordânia, o exército israelense iniciou uma feroz guerra contra o Líbano. Em ambos os casos, a desculpa foi o seqüestro de três soldados israelenses: um seqüestrado pela organização Jihad Islâmica, na Palestina, e dois pelo Hizbollah, no Líbano.

Os ataques genocidas já provocaram centenas de vítimas civis. A mídia e muitos governos imperialistas (tradicionais cúmplices do sionismo) estão falando em uma “reação desproporcional” por parte de Israel.

Para entender esta “reação desproporcional” e, ao mesmo tempo, compreender por que, em vez de fortalecer Israel, os ataques podem debilitá-lo, é necessário considerar duas questões chaves. A primeira é a crise do conjunto da política de “guerra contra o terror” iniciada por Bush em 11 de setembro de 2001, aplicada com especial intensidade na região do Oriente Médio, diante do fato de não conseguir derrotar um colossal ascenso das massas árabes e muçulmanas. A segunda é o caráter de Israel, um enclave militar imperialista construído, desde sua fundação, como um “estado gendarme”.

No Correio Internacional n0 120, assinalávamos: “Desde o 11 de setembro, o governo Bush tentou retomar a sangue e fogo o controle absoluto sobre o Oriente Médio, acompanhado, com maiores ou menores contradições, pelo imperialismo europeu. A primeira ação desta política foi a invasão do Afeganistão (2001) e a segunda, a invasão do Iraque (2003). (…) Sem dúvida, longe de conquistar o objetivo de controlar a região, a posição do imperialismo está em retrocesso. Apesar de sua dura ofensiva militar genocida e do aumento dos gastos de guerra, ainda não obteve nenhum controle da ‘primeira frente’ no Iraque, acuado por uma resistência militar com apoio de massas, quando vê se reabrir uma ‘segunda frente’ no Afeganistão, país que até pouco tempo parecia dominado.”

A este cenário, se soma agora a crítica situação da Palestina e do Líbano, resultado do fracasso dos Acordos de Oslo e da constituição da ANP (Autoridade Nacional Palestina). Com os acordos, Clinton e Israel buscaram, a partir da capitulação e da cumplicidade da direção da Al Fatah e da cobertura da ONU, desmontar a luta dos palestinos pela recuperação de seu território histórico. O triunfo do Hamas nas recentes eleições palestinas colocou em crise todo este plano político e foi o prenúncio da abertura de uma “terceira frente” na região. Neste caso, a luta militar não é desenvolvida diretamente pelas tropas imperialistas, mas sim pelo seu agente na região, o Estado sionista de Israel.

A razão de fundo desta crise global da política imperialista em toda a região é a existência de um enorme ascenso das massas árabes e muçulmanas, cuja expressão máxima são as guerras de libertação nacional que o imperialismo não consegue derrotar e que, agora, começam a se fortalecer frente a um inimigo que se debilita.

Um informe recentemente, publicado pela imprensa, mostra que 85% dos especialistas em Oriente Médio acreditam que a política de Bush fracassou no Iraque. Esta situação começou a abrir fissuras na própria burguesia dos EUA, com setores que criticam a “unilateralidade” de Bush e buscam “políticas multilaterais” que os permitam sair do pântano iraquiano. O jornal The New York Times, por exemplo, impulsionou uma campanha para fechar a prisão de Guantánamo e acabar com as torturas nas prisões do Iraque.

É necessário, contudo, assinalar que tanto os republicanos como democratas, principais partidos nos EUA, se uniram no Congresso norte-americano para respaldar Israel e que esta posição tem, por enquanto, um apoio majoritário na população do país.

A “reação desproporcional” de Israel aparece, então, como uma tentativa, alentada seguramente pelo próprio governo de Bush, de reverter esta crise e conseguir um triunfo em meio a vários fracassos consecutivos. Por isso, o governo de Bush se opõe a um cessar fogo imediato para dar tempo a que Israel consiga seus objetivos militares.

DÉCADAS DE FÁCEIS VITÓRIAS
O Estado de Israel foi criado pela ONU, em 1947, sob o impulso do imperialismo, legalizando assim o “despojo armado” da maioria do território palestino (55%) que havia realizado anteriormente o sionismo.

Israel nasceu como um “enclave militar” do imperialismo, um “Estado gendarme” destinado a reprimir a luta das massas palestinas, árabes e muçulmanas. Por isso, atualmente é a quinta potência militar do mundo. Seu poder de fogo (que inclui mais de 200 ogivas nucleares) é bem superior ao de qualquer país na região. Tal poderio militar está assegurado pelos EUA, que enviam milhões de dólares a Israel.

Esta “essência” do Estado de Israel explica suas ações e sua política: só consegue existir sob a condição de reafirmar seu caráter de “fortaleza militar”. Qualquer fato que questione esta situação é um fator de crise a ser eliminado.

Durante décadas, o exército sionista e os habitantes de Israel, a partir de sua notável superioridade militar, se acostumaram a conquistar rápidas e avassaladoras vitórias contra os exércitos árabes. Assim ocorreu nas guerras de 1948, 1956, 1967 e 1973. A capitulação crescente das burguesias árabes facilitou ainda mais as coisas para Israel. Com pouquíssimas baixas, Israel e seu exército saíram destas guerras com o moral alto e com maiores territórios.

LÍBANO E A INTIFADA
Esta realidade, entretanto, começou a mudar na década de 1980, a partir da invasão do sul do Líbano. O exército israelense foi derrotado por uma frente de milícias encabeçada pelo Hizbollah. Assim, iniciaram uma longa retirada que terminou em 2000. Foi a primeira derrota militar de Israel, que quebrou seu mito de “invencibilidade”.

Esta derrota do sionismo, somada às terríveis condições de vida nos territórios palestinos, estimulou a primeira e a segunda Intifadas, nos territórios palestinos ocupados. Soldados israelenses, armados até os dentes, tiveram que enfrentar jovens e crianças que lutavam com paus e pedras nas mãos, numa guerra totalmente diferente. A combinação de ambos os fatores abriu uma profunda crise no exército israelense e, por se tratar de sua “instituição básica”, semeou as possíveis sementes da derrubada do “Estado gendarme”.

O imperialismo e os governos israelenses buscaram fechar esta crise por meio dos acordos de Oslo e da criação da ANP. Mas o fracasso desta política, no marco de uma crise global do imperialismo no Oriente Médio, obrigou os EUA e Israel a voltar a aplicar uma política de pura agressão militar.
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