Redação

Alvaro Bianchi, Professor do Departamento de Ciência Política da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), pesquisador do Centro de Estudos Marxistas (Cemarx) e coordenador do Grupo de Pesquisa Marxismo e Teoria Política

Quando se fala de uma ortodoxia marxista, poucos excluiriam Lenin da lista dos mais ortodoxos.[1] A questão depende, entretanto, de como formulamos a resposta à pergunta “o que é o marxismo ortodoxo?”. Vale destacar que para um pensamento crítico a definição de ortodoxia é sempre problemática, pois ela não pode amparar-se em um argumento de autoridade ou de fé. Nesse sentido, a tacanha definição dada por Stalin da ortodoxia do marxismo como “a devoção sincera e proba ao poder soviético” poderia ser útil para um burocrata soviético exigir obediência, mas não para um marxista crítico. A questão não é mais simples quando se trata de identificar um leninismo ortodoxo. Muitos foram os que tentaram estabelecer uma listagem daquilo que constituiria a ortodoxia em termos de leninismo, começando sempre, evidentemente pela concepção de partido, mas suprimindo arbitrariamente aspectos considerados indesejáveis de sua obra. A operação, realizada freqüentemente também com a obra de Marx, produziu resultados contestáveis pela sua parcialidade, servindo mais para justificar as posições político-teóricas dos comentadores do que para revelar o núcleo do pensamento marxiano ou do lenineano.

O incômodo provocado por definições arbitrárias parece ter movido Lukács na sua investigação sobre o marxismo ortodoxo O marxismo ortodoxo, afirma em História e consciência de classe, não se reduz a uma adesão a-crítica aos resultados da pesquisa de Marx, nem à fé na verdade revelada por uma ou outra tese. Contornando esse tipo de formulação, Lukács expõe sua definição de modo articulado em dois momentos diferentes. No primeiro, um momento lógico, ele afirma que a única ortodoxia admissível em matéria de marxismo refere-se ao método. Nessa dimensão metodológica Lukács considera o marxismo como uma teoria capaz de revelar o caráter fetichista das formas econômicas e a reificação das relações sociais. O isolamento de esferas da vida social e a afirmação de especialidades do conhecimento referidas exclusivamente a estas dariam lugar, assim, a um método que insiste na “unidade concreta do todo” (LUKÁCS, 1989, p. 21). De acordo com o filósofo húngaro só é possível apreender a realidade como totalidade concreta. “A totalidade é a categoria fundamental da realidade”, afirma em uma passagem célebre (Idem, p. 24). A categoria de totalidade concreta não dissolveria, entretanto, os diferentes momentos que constituem o real. Antes disso, ela permitiria perceber a autonomia deles como mera aparência e considerá-los na relação dialética que mantêm entre si. É essa relação do momento com o todo que condicionaria a objetividade assumida por todo objeto.

No segundo – um momento epistemológico que abarca o primeiro – Lukács afirma ser o marxismo a teoria que, “pela sua essência, não é mais do que a expressão pensada do próprio processo revolucionário. Cada etapa desse processo se fixa na teoria para se tornar generalizável, comunicável, para poder ser aproveitada e continuada; não é mais que a fixação e a consciência de um passo necessário, e torna-se, ao mesmo tempo, pressuposto necessário para o passo seguinte” (Idem, p. 17). Ou seja, o marxismo permitiria pensar uma realidade que se transforma, a revolução que ele quer fazer, porque essa mesma realidade – essa mesma revolução – é parte dele. Uma ruptura com o método dialético, como aquela levada a cabo por Bernstein, era, assim, essencial para a construção de uma teoria conseqüente do oportunismo capaz de imaginar uma passagem evolucionista, natural e sem luta ao socialismo; mas não de realizar essa transição.

A definição lukácsiana de ortodoxia não é plenamente satisfatória e ele próprio reconheceu mais tarde que ela era excessivamente minimalista. Embora não seja a melhor definição possível ela permite, por razões que ficarão evidentes a seguir, situar Lenin nela. O argumento de Lukács encontrou um destino peculiar. Quando o marxismo procurou se livrar da carga paralisante imposta pelas dogmáticas social-democrata e stalinista, o critério apresentado por Lukács resultou ser inspirador. Mas a apropriação habitual destacava apenas o nível lógico da formulação. Desse modo, indicava-se a possibilidade de um marxismo crítico capaz de se voltar sobre si próprio mas não, necessariamente, de um marxismo revolucionário. Certamente, a definição de Lukács tem seus problemas tanto no nível lógico como no epistemológico. Uma metodologia minimalista que enfatiza de modo unilateral o conceito de totalidade repercute em uma epistemologia desprovida de mediações, na qual a passagem do processo revolucionário, ou seja, da ação do movimento operário, para a teoria revolucionária ocorre de modo direto, sem mediações. Não deixa de ser irônico que Lukács tenha definido o stalinismo de modo ingênuo como uma apropriação do marxismo sem as devidas mediações.

Ao contrário do comumente aceito, a tese da ortodoxia metodológica afirmada por Lukács era menos inovadora do que muitos imaginaram e parece ter sido de uso corrente entre os marxistas russos do final do século XIX e início do XX. Plekhanov, em sua obra Princípios fundamentais do marxismo, já afirmava: “A interpretação materialista da história tem, sobretudo, um valor metodológico.” (PLEKHANOV, 1978, p. 25.) Lenin não diferia nessa questão de Plekhanov e, em sua polêmica com os populistas russos no final do século XIX, colocou a questão em termos muito semelhantes. Assim como outros marxistas de sua época, preocupado com a aparente excepcionalidade do desenvolvimento capitalista em seu país, via-se perante o desafio de apropriar-se seletivamente da obra de Marx, evitando assim transpor mecanicamente os resultados de uma pesquisa sobre o desenvolvimento do capitalismo no Ocidente e a transformação desta numa filosofia da história.
Desse modo, afirmava em Nosso programa, artigo escrito para Rabochaya Gazeta, órgão oficial do Partido Operário Social-Democrata da Rússia (POSDR): “Não consideramos a teoria de Marx como algo completo e inviolável; pelo contrário, estamos convencidos que ela colocou a pedra fundacional da ciência a qual os socialistas devem desenvolver em todas as direções se desejam manter-se em consonância com a vida. Pensamos que uma elaboração independente da teoria de Marx é particularmente importante para os socialistas russos; porque essa teoria fornece apenas princípios diretivos gerais, os quais são aplicados, em particular, à Inglaterra de um modo diferente que à França, na França diferentemente da Alemanha e na Alemanha de modo distinto da Rússia.” (CW, v. 4, p. 211-212.)[2]

A questão assumia importância decisiva no debate russo de então. Assim, discutindo a afirmação feita pelo populista Nicolai Mikhailovski, que atribuía aos marxistas um “esquema histórico abstrato” o qual apagava as particularidades do desenvolvimento econômico e político russo, Lenin afirmava: “Nenhum marxista utilizou jamais, em momento algum, o argumento de que na Rússia ‘deve existir’ capitalismo ‘porque’ existiu no Ocidente etc. Nenhum marxista viu jamais na teoria de Marx uma espécie de esquema filosófico-histórico obrigatório para todos, algo mais do que a explicação de uma determinada formação econômico-social” (CW, v. 1, p. 192).[3] E a seguir, depois de reivindicar o esforço de Plekhanov e seu círculo na análise de relações sociais “sumamente complicadas e confusas”, Lenin concluía: “os marxistas tomam da teoria de Marx, sem restrições, apenas os métodos mais valiosos, sem os quais uma elucidação das relações sociais é impossível” (CW, v. 1, p. 194). A afirmação de Lenin visa, portanto, rejeitar todo dogmatismo.

Era esse antidogmatismo que vinculava Lukács a Lenin. Quando Lukács escreveu seu opúsculo sobre Lenin, em 1924, a abordagem de História e consciência de classe foi retomada. Nele, o materialismo histórico era definido como a teoria da revolução proletária, ou seja, teoria sobre e para essa revolução. “É assim porque sua essência é a síntese conceitual desse ser social ao qual se deve a produção do proletariado e que determina o ser inteiro do mesmo; o é porque o proletariado que luta pela sua liberação encontra nele sua mais clara autoconsciência.” (LUKÁCS, 1974, p. 18.) A relevância de um autor para o marxismo estaria, portanto, na sua capacidade de penetrar esses problemas e de “perceber adequadamente, para além dos fenômenos da sociedade burguesa, essas tendências da revolução proletária que neles e por meio deles elaboram-se até adquirir um ser eficaz e uma clara consciência” (Idem).

O lugar que Lukács atribuía a Lenin na história do marxismo era devido, justamente, a essa capacidade de pensar a revolução: “Lenin jamais generalizou – assim como Marx também nunca o fez – experiências locais privativas da Rússia, limitadas no tempo ou no espaço. Com o olhar do gênio soube perceber, pelo contrário, no lugar e no momento de seus primeiros efeitos, o problema fundamental de nossa época: a iminência da revolução. E todos os fenômenos, tanto russos como internacionais, compreendeu-os e fê-los inteligíveis a partir dessa perspectiva da atualidade da revolução.” (Idem, p. 11-12.)

A “atualidade da revolução” é, sem dúvida um conceito mais exato do que o da “iminência da revolução”. A atualidade não significa a iminência. Enquanto a primeira se afirma no tempo estendido de uma época histórica – a época do imperialismo, com suas guerras, revoluções e contra-revoluções –, a segunda se coloca no tempo acelerado da conjuntura. Mas não nos esqueçamos dos pendores ultra-esquerdistas do jovem Lukács. De todo modo, é esse o fundamento do pensamento de Lenin, segundo Lukács. E é esse fundamento que o conecta de modo decisivo com a teoria de Marx e lhe permite atualizá-la. Como expressão da luta do proletariado, o materialismo histórico somente poderia desenvolver-se plenamente no momento em que essa luta atingisse seu ápice, permitindo a realização de seu potencial e afirmando sua atualidade prática: “No materialismo histórico figura, pois, como condição prévia – já na teoria – a atualidade histórico-universal da revolução proletária.” (Idem, p. 13.)

A relevância de Lenin estaria, portanto, no fato de ter consumado o passo necessário para a concretização do marxismo, “um marxismo atualmente convertido em algo eminentemente prático” (Idem, p. 15). A atualidade da revolução passava a ser a lente a partir da qual Lenin olhava os problemas de seu tempo. Todos eles, inclusive os filosóficos, como demonstra sua vigorosa intervenção no debate teórico da época com sua obra Materialismo e empiriocriticismo, e não apenas aqueles da política cotidiana. O leninismo implica, portanto, um pensamento concreto que se verte completamente em uma práxis revolucionária: “A tradição do leninismo não pode, pois, consistir senão em manter de pé – sem falseá-la nem torná-la rígida – a função viva e vivificante, ao mesmo tempo crescente e enriquecedora, do materialismo dialético. Daí – repetimos – que Lenin deva ser estudado pelos comunistas de maneira similar aquela que Marx foi estudado por Lenin. Deve ser estudado para apreender o método dialético.” (Idem, p. 129.)

A ortodoxia lenineana incorporaria, portanto, uma forte dimensão metodológica, segundo Lukács. Assim como a ortodoxia marxista, o núcleo do pensamento de Lenin também poderia residir em seu método. Tal afirmação foi partilhada por Henri Lefebvre, para quem “Lenin foi também um filósofo. E na nossa opinião, o seu pensamento filosófico é o que nos dá o fio condutor que atravessa toda a obra e a torna compreensível.” (LEFEBVRE, 1969, p. 14.) Essa afirmação não pode ser endossada sem ressalvas. A promoção de Lenin a filósofo era funcional para a política da burocracia soviética. Apresentado como um sistema coerente e imutável, o “leninismo” era para Stalin o “marxismo da era do imperialismo e da revolução proletária. Para ser mais exato, leninismo é a teoria e a tática da revolução proletária em geral, a teoria e tática da ditadura do proletariado em particular.” (STALIN, 1976, p. 3. Ver a crítica de TROTSKY, 1989) Seria essa suposta especificidade do leninismo o que permitiria a Stalin afirmar a possibilidade do socialismo nacional na “era do imperialismo” – hipótese explicitamente rejeitada por Marx e Engels – e reivindicar para si o direito de sucessão sobre o legado de Lenin. Daí que a afirmação do caráter particular do leninismo fosse completada com a remissão do pensamento de Marx e Engels a uma era pré-revolucionária. A operação política que converteu Lenin em um filósofo após sua morte sustentava teoricamente esse absurdo mediante a transformação do leninismo em uma “teoria integral que surgiu em 1903 e passou pelo teste de três revoluções”, nas palavras de Stalin (1974, p. 133-134. Grifos meus). Desaparecia, assim, a ruptura política levada a cabo por Lenin, em abril de 1917, com sua própria concepção de revolução.

Muito embora Lenin não seja o criador de um sistema filosófico – ou de uma “teoria integral” – é possível sustentar a existência de uma reflexão filosófica lenineana e afirmar a necessidade de resgatá-la, por parte de um pensamento crítico. Não se trata de criar mais um fetiche em torno de Lenin filósofo ou da originalidade de seu método (cf.p.ex. ALTHUSSER, 1972.). Daí a apropriação crítica feita aqui da definição de Lukács. Apesar da figura de um Lenin como homem de ação – um dirigente partidário “prático” – ser muito difundida, sua estréia no âmbito do marxismo ocorreu como intelectual. São notáveis os textos precoces de análise das concepções econômicas dos populistas e do chamado “marxismo legal”. Inscrevendo-se como crítica a um marxismo vulgar esses textos, escritos entre 1893 e 1899, constituem uma consistente crítica teórico-metodológica à ideologia política russa e à economia política produzida nesse país (cf. p. ex., CW, v. 1, p. 13-507; v. 2, p. 129-265 e 355-458). A particularidade do marxismo de Lenin nesse período era que nele o método transformava-se em política com a mediação do partido. Nisso, a dialética em Lenin afastava-se decididamente de uma concepção meramente especulativa do real. O método dialético incorporava uma dimensão partidária na medida em que: (1) ele era o resultado e parte do antagonismo social; (2) ele encerrava um programa de transformação da realidade por meio da ação do partido.

A metodologia lenineana recusa, desse modo, tanto o subjetivismo como o objetivismo vulgar. O eco da Methodenstreit alemã ouve-se claramente na Rússia. O debate não reproduz, entretanto, as mesmas linhas divisórias estabelecidas pela Escola Histórica Alemã de Gustav Schmoller e pela nascente Escola Austríaca, de Carl Menger. Assim como Menger, Nicolai Mikhailovski sustentava um subjetivismo radical, afirmando ser o “indivíduo vivo com todas suas idéias e sentimentos” o “agente da história por conta e risco” (Apud CW, v.1, p. 397). Mas a defesa da “neutralidade axiológica” do conhecimento científico – a doutrina da teoria livre de “juízos de valor” –, princípio caro a Menger, era feita por Piotr Struve contra Mikhailovski em nome da objetividade de “tendências históricas invencíveis, que como tal devem servir, por um lado, como ponto de partida e, por outro, como limite necessário para toda atividade orientada dos indivíduos e grupos sociais.” (Idem.) Nada que um marxista vulgar não objetasse ao idealismo.

Mas não era essa a posição de Lenin. Ele recusava a neutralidade axiológica dos chamados objetivistas sem recusar, entretanto, o objetivismo como método. Os objetivistas afirmavam a necessidade, ou seja, a inevitabilidade de um dado processo histórico, tornando-se primeiro prisioneiros e depois apologistas dos fatos. Daí transformarem a crítica ao excepcionalismo do desenvolvimento da sociedade russa, apregoado pelos populistas, em uma defesa apaixonada da modernidade capitalista do Ocidente. Lenin afastava-se decididamente tanto do eslavófilo Mikhailovski como do ocidentalista Struve, negando metodologicamente essas correntes e afirmando as ferramentas teóricas necessárias à análise crítica do desenvolvimento do capitalismo na Rússia. Ao contrário dos objtetivistas, afirmava Lenin, os materialistas remetem-se a uma dada formação econômico-social e às relações sociais antagônicas existentes e, ao fazer isso, dão ao seu objetivismo um conteúdo mais profundo e cheio de significado. Ao invés de se limitarem a afirmar a necessidade de um processo histórico, definem seu conteúdo de classe e sua posição perante ele. A metodologia lenineana é, portanto, uma metodologia partidária. Afirmava Lenin: “Em um caso dado, por exemplo, o materialista não se limitaria a constatar a existência de ‘tendências históricas irresistíveis’ mas apontaria a existência de certas classes as quais determinam o conteúdo de um dado sistema e excluem a possibilidade de qualquer solução que não a ação dos próprios produtores. Por outro lado, materialismo inclui partidarismo, por assim dizer, e impõe a adoção direta e aberta do ponto de vista de um grupo social dado em cada abordagem dos eventos.” (CW, v.1, p. 400-401.)

A diferença entre os marxistas e os objetivistas reside, para Lenin, no fato de que os primeiros não recusam a priori uma tomada de posição e, por isso mesmo, fazem ciência com “espírito de partido” (cf. LABICA et alli, 1977). O conhecimento científico (marxista) da realidade é, portanto, um conhecimento engajado na medida em que se constrói revelando aquilo que a ideologia burguesa tende a ocultar: a relação existente entre as classes sociais.

A análise concreta da situação concreta
O ano era 1904 e o texto aquele, bastante conhecido, no qual Lenin relatava de modo minucioso o 2º Congresso do POSDR e a ruptura entre bolcheviques e mencheviques. Era com referência ao conflito que opôs as frações no interior do POSDR que Lenin afirmava: “Nossa luta não poderia ser entendida sem estudar as condições concretas de cada batalha. E, ao estudá-las, veremos claramente que seu desenvolvimento procede dialeticamente, por meio de contradições.” (CW, v. 7, p. 411.) A seguir Lenin descrevia a transformação das tendências no interior do partido com base “na grande dialética hegeliana, que o marxismo adotou depois de colocá-la de pé” para, depois afirmar: “Um dos princípios básicos da dialética é que não existe verdade abstrata, a verdade é sempre concreta.” (Idem, p. 412.)[4]

A mesma afirmação era feita na resposta de Lenin a Rosa Luxemburg sobre a mesma questão repetiria: “Este ABC [da dialética] afirma que não há verdade abstrata, que a verdade é sempre concreta.” O contexto no qual Lenin repetia sua frase é elucidativo. Argumentava o marxista russo que Luxemburg lhe atribuía “lugares-comuns, princípios e considerações de conhecimento geral, verdades absolutas, e esforçava-se por silenciar a respeito das verdades relativas que se baseiam em fatos rigorosamente estabelecidos e que são as únicas com que eu opero.” (CW, v. 7, p. 477-478, grifos meus) As fórmulas políticas abstratas e universais são sempre falsas para Lenin, que insistia em sua polêmica com Rosa Luxemburg na necessidade de rejeitar soluções universais para problemas políticos concretos.
O que é, então, para Lenin, o método dialético acima anunciado? O método dialético – tal qual compreendido por Lenin – é sintetizado na fórmula “análise concreta”. Esse método tem a função de compreender a “situação concreta” com vistas a sua transformação. Ele é um método que toma partido na medida em que a análise concreta revela as contradições ocultas e tem por objetivo a transformação da realidade analisada. É nesse sentido que a questão da dialética emerge em seu texto. Repetidas vezes Lenin reafirmou de vários modos essa fórmula. E na crítica à revista Kommunismus, com a qual Lukács colaborava, Lenin colocou a questão de modo clássico: “o que constitui a verdadeira substância (Gist), a alma viva do marxismo – uma análise concreta de uma situação concreta” (CW, v. 31, p. 166).
A fórmula lenineana adquiriu contornos precisos a partir de suas investigações filosóficas dos anos de 1914-1916. Foi no decorrer desses anos que ele organiza seus estudos filosóficos e faz os conspectos da Ciência da Lógica, da primeira parte da Enciclopédia das Ciências Filosóficas, das Lições de História da Filosofia e das Lições de Filosofia da História, de G. W. Hegel, bem como de obras de Feuerbach, Lassalle e Aristóteles. Foi dessa época, também, uma série de textos de intervenção política nos quais a dialética ocupou um lugar explícito, como A falência da Segunda Internacional; O imperialismo, fase superior do capitalismo; O socialismo e a guerra; Sobre a palavra-de-ordem dos Estados Unidos da Europa; Sobre a brochura Junius, dentre outros.

Nessa nova abordagem, Lenin enfatizou continuamente a necessidade de substituir a afirmação dogmática pela “análise concreta da situação concreta”. A chave aqui está evidentemente na palavra que se repete. Comecemos pelo fim. A concretude da situação é dada pela especificidade de um momento histórico determinado. O que Lenin exige aqui é que cada situação seja tomada em sua particularidade. “Momento atual”, “momento presente”, “situação imediata” e “situação específica” são alguns dos sinônimos utilizados por Lenin ao longo de sua obra para expressar essa “situação concreta” (cf. p. ex. CW, v. 10, p. 112-119 e v. 15, p. 321-324.). Por meio deles era ressaltado o caráter único de uma situação da qual o sujeito do conhecimento – para Lenin, o partido – é também parte daquilo que deve ser conhecido. Assim, na sua crítica à brochura Junius – pseudônimo de Rosa Luxembug – sobre a guerra ele afirmava: “a dialética marxista exige uma análise concreta de cada situação histórica específica” (CW, v. 22, p. 316). É sintomático que Lenin enfatize essa questão em meio à luta política contra a guerra. Pois não se tratava, para ele, de formular dogmaticamente uma política contra toda guerra e sim contra essa, que estava em curso. Assim, afirmando que na situação de 1916 Rosa Luxemburg encontrava-se correta ao preconizar a luta “contra o fantasma da guerra nacional”, alertava que o “erro seria apenas exagerar essa verdade, fugir à exigência marxista de ser concreto, estender a apreciação da guerra atual a todas as guerras possíveis sob o imperialismo, esquecer os movimentos nacionais contra o imperialismo.” (Idem, p. 308-309.)

Na ênfase dada ao caráter concreto de cada situação encontrava-se a recusa a todo dogmatismo. Trata-se de se aproximar de uma dada situação destacando sua particularidade. Como “síntese de múltiplas determinações”, a situação concreta assume, em dado momento, um caráter singular que precisa ser enfatizado. Suas determinações somente tornam-se inteligíveis quando ressaltada sua condição histórica. Quando Lenin afirma ser seu objeto uma “situação imediata” não está, portanto, a confundir o concreto com aquilo que é imediatamente dado aos sentidos e que, portanto, não constitui senão a aparência de um momento histórico. O caráter imediato de uma situação é dado pela sua atualidade. A situação, como um entroncamento histórico particular de múltiplas determinações, é concreta na medida em que se afirmando no tempo presente é a única que se encontra aberta à ação do partido e que pode, portanto, ser por ele transformada. Quando, por exemplo, Lenin define no começo da Primeira Guerra Mundial a situação como revolucionária foi além da aparência e do pessimismo que esta alimentava nos socialistas do período. Assumindo aquela situação presente como objeto de seu estudo, procurou revelar a relação de forças entre as classes em seus momentos econômico, político e ideológico que se manifestava sob a forma de uma guerra mundial. A análise da situação era, assim, o pré-requisito de uma ação planejada com o objetivo de superar o presente na medida em que permitia identificar de modo preciso aquelas configurações objetivas, ou seja, independentes da vontade do partido (mas não de sua ação), nas quais “a base não queira mais viver como antes” e “a cúpula não o possa mais”, como afirma em A falência da Segunda Internacional (CW, v. 21, p. 213-214). São estas configurações históricas particulares e excepcionais que Lenin denomina de situações revolucionárias. Anos mais tarde repetiria a fórmula: “A lei fundamental da revolução, confirmada por todas as revoluções e, em particular, por todas as três revoluções russas do século XX, consiste no seguinte: para a revolução não basta que as massas exploradas e oprimidas tenham consciência da impossibilidade de viver como dantes e exijam mudanças; para a revolução é necessário que os exploradores não possam viver e governar como dantes. Só quando os ‘de baixo’ não querem o que é velho e os ‘de cima’ não podem como dantes, só então a revolução pode vencer.” (CW, v. 31, p. 84-85.)

A situação é, assim, a expressão de uma determinada relação de forças entre as classes sociais. Ou seja, sua definição é relacional; ela está centrada na posição ocupada pelas classes em um momento particular do antagonismo social. A análise dessas situações particulares permite encontrar os pontos de ruptura nos quais a ação do partido pode alterar a relação de forças dada e transformar a situação revolucionária em revolução. Mas não é à análise concreta da situação concreta que cabe essa transformação, e sim à ação político-revolucionária. Nas fundamentais Cartas sobre a Tática, publicadas como introdução às famosas Teses de Abril, em 1917 Lenin alertava contra o perigo de confundir a análise com a vontade do partido. Na ocasião, afirmava: “O marxismo exige de nós que tenhamos em conta do modo mais preciso e objetivamente verificável a correlação das classes e as particularidades concretas de cada situação histórica.” (CW, v. 24, p. 43.) Mas a precisão da análise não implicava em sua neutralidade. A análise era partidária, portanto, na medida em que revelava aquilo que outros partidos procuravam ocultar sob o véu da ideologia, e não porque transformasse a realidade no sentido indicado pelo partido.

Por sua vez, a concretude da análise é dada pelo seu caráter dialético. O que Lenin exigia neste ponto era, por um lado, que se evitasse todo unilateralismo e, por outro, que a totalidade fosse apreendida em seu movimento. Nesse sentido destacava como categorias fundamentais não apenas a totalidade como, também, seu desenvolvimento. O pensamento dialético não se limita a captar a diferença e a contradição. Ele fixa sua atenção na transição entre as diferentes formas. A razão dialética tensiona as diferenças levando-as a seu extremo, até a oposição. Levadas a esse extremo, elas tornam-se vivas e ativas umas em relação às outras, adquirindo a negatividade que é “pulsão interna do automovimento e da vitalidade. ” (CW, v. 38, p. 143.)

Em suas notas sobre o livro de Hegel, Ciência da Lógica, os elementos da dialética são assim sumariados por Lenin: “(1) A determinação do conceito a partir de si próprio (a própria coisa é que deve ser encarada nas suas relações e no seu desenvolvimento); (2) a contradição na própria coisa (das Andere seiner), as forças e tendências contraditórias em cada fenômeno; (3) a união da análise e síntese.” Mas Lenin parece não ter ficado satisfeito com essa primeira enumeração e, a seguir, apresenta esses elementos de modo mais pormenorizado. Vale a pena citar na íntegra: “Os elementos da dialética: (1) a objetividade da observação (não exemplos, não desvios, mas a coisa em si própria); (2) toda a soma das variadas relações desta coisa com as outras; (3) o desenvolvimento desta coisa (respective [ou] do fenômeno), o seu próprio movimento, a sua própria vida; (4) as tendências (e diferentes aspectos) internamente contraditórias nesta coisa; (5) a coisa (o fenômeno etc.) como soma e unidade dos opostos; (6) luta respective [ou], o desenvolvimento destes opostos, impulsos contraditórios etc.; 7) união da análise e da síntese – a decomposição em partes isoladas e a soma, a adição destas partes; (8) as relações de cada coisa (fenômeno etc.) não só são variadas mas gerais, universais. Cada coisa, (fenômeno, processo etc.) está ligada com as demais; (9) não só unidade dos opostos, mas transição de cada determinação, qualidade, traço, aspecto, propriedade, para cada outro; (10) processo infinito de descoberta de novos aspectos, relações etc.; (11) processo infinito de aprofundamento do conhecimento pelo homem da coisa, dos fenômenos, dos processos etc., dos fenômenos à essência e de uma essência menos profunda a uma essência mais profunda; (12) da coexistência à causalidade e de uma forma de conexão e interdependência a outra, mais profunda, mais geral; (13) repetição num estádio superior de certos traços, propriedades etc. de um inferior e (14) aparente regresso ao velho (negação da negação); (15) luta do conteúdo com a forma e inversamente. Rechaçar das formas, refazer do conteúdo; (16) transição da quantidade pra a qualidade e vice-versa (15 e 16 são exemplos de 9).” (CW, v. 38, p.221-222.)
Os elementos centrais dessa enumeração foram apresentados em um fragmento intitulado Sobre a questão da dialética que sintetiza, em grande medida, seus estudos de 1914-1915 sobre a dialética. Nesse texto, o ponto de partida era o reconhecimento do caráter contraditório do uno como a essência da dialética. Plekhanov e, até mesmo, Engels eram censurados por Lenin devido à pouca atenção que deram a esta questão. É a contradição imanente existente em “todos os fenômenos e processos da natureza (incluindo também o espírito e a sociedade)” (CW, v. 38, p. 360) que constitui a fonte do desenvolvimento da totalidade: “A condição do conhecimento de todos os processos no seu ‘automovimento’, no seu desenvolvimento espontâneo, na sua viva vida, é o conhecimento deles como unidade de opostos. Desenvolvimento é ‘luta de opostos’.” (Idem.) Essa passagem é indicativa do alcance e ao mesmo tempo dos limites da leitura lenineana de Hegel, pois, a respeito dessa mesma unidade, Lenin escreve poucas linhas antes “identidade de opostos”, para a seguir observar, “talvez seja mais correto falar de sua ‘unidade’, embora a diferença entre os termos identidade e unidade não seja particularmente importante aqui” (Idem, p. 359). Mas é justamente num fragmento destinado a expor o conteúdo da dialética que essa diferença deveria ser fundamental.

Apesar da imprecisão terminológica, Lenin enfatiza de modo adequado a contradição. Ela é absoluta, assim como é absoluto o movimento, o desenvolvimento. A unidade dos opostos no interior da totalidade, por sua vez, é relativa, condicional, temporária e transitória, pois apenas existe sob sua forma particular enquanto a luta de opostos não encontrar solução. A diferença entre o caráter absoluto do movimento e o caráter relativo da unidade não era, por sua vez, absoluta para Lenin. Ela era relativa na medida em que para a dialética objetiva no relativo há absoluto.

O Capital de Marx, e a dialética da sociedade burguesa que ele contém era, para Lenin, um modo de exposição exemplar justamente por analisar, a partir da relação mais simples – a troca de mercadorias – “todas as contradições (respective [ou] os germes de todas as contradições) da sociedade contemporânea” e, a seguir, mostrar “o desenvolvimento (tanto o crescimento como o movimento) destas contradições e desta sociedade, no S [somatório] das suas partes singulares, do seu começo até o seu fim.” (Idem.)[5] Na vida social a luta de opostos não é senão a luta de classes, uma luta que se “desenvolve de modo metódico em suas três direções concertadas entre si: teórica, política e econômico-prática”, como escrevera Engels, lembrava Lenin em Que fazer? (CW, v. 5, 1964, p. 372.) Mais uma vez escrevendo sobre a guerra, desta vez em A falência da Segunda Internacional, Lenin afirmava: “A dialética exige que um fenômeno social seja estudado em todos os seus aspectos, através de seu desenvolvimento, e que o aspecto exterior, a aparência, seja remetido às principais forças motrizes, ao desenvolvimento das forças produtivas e à luta de classes.” (CW, v. 21, p. 218) O impacto dos estudos sobre a dialética nesse texto é evidente, assim como em outras intervenções posteriores. No auge da aguda polêmica com Trotsky e Bukharin a respeito dos sindicatos, essa questão reaparece em termos similares àqueles apresentados nos Cadernos Filosóficos. Afirmava Lenin na ocasião: “Para conhecer de verdade o objeto é necessário abarcar e estudar todos os aspectos, todos seus vínculos e ‘mediações’. Jamais conseguiremos isso completamente, mas a exigência da multilateralidade nos protegera contra os erros e a rigidez. Isso, em primeiro lugar. Em segundo lugar, a lógica dialética requer que o objeto seja tomado em seu desenvolvimento, em seu ‘automovimento’ (como afirma Hegel às vezes), em sua mudança. (…) Em terceiro lugar, toda a prática do gênero humano deve fazer parte ‘da definição’ completa do objeto como critério da verdade e como determinante prático do vínculo do objeto com a necessidade do homem. Em quarto lugar, a lógica dialética ensina que ‘a verdade abstrata não existe, a verdade é sempre concreta’, como gostava de dizer depois de Hegel o defunto Plekhanov.” (CW, v. 32, p. 94.)

Chama a atenção que em momentos mais tensos da luta política a concepção metodológica de Lenin apareça com força. Essa aparição é reveladora da força política da metodologia lenineana. O argumento metodológico torna-se, nesses contextos, o mais eficaz para desatar o nó da política, revelando suas determinações. Daí sua presença nos momentos críticos da política, como na situação dos anos 1914-1915. Segundo Michael Löwy, os estudos filosóficos levados a cabo por Lenin após o início da guerra teriam provocado um “corte” no pensamento do revolucionário russo que teria rompido com o materialismo pré-dialético do “velho bolchevismo” e cortado as amarras que o prendiam ao marxismo evolucionista da Segunda Internacional (LÖWY, 1978, p. 130-135). Paradoxalmente o mesmo “corte epistemológico” que Löwy recusa a Marx (tese de Althusser), o atribui a Lenin. Não é necessário alinhar-se com essa tese para concordar com a força dos problemas de pesquisa levantados por Löwy: “Seria necessário um dia reconstruir o itinerário que levou Lenin do trauma de agosto de 1914 à Lógica de Hegel, apenas um mês depois. Simples vontade de retornar às fontes do pensamento marxista? Ou intuição lúcida de que o tendão de Aquiles metodológico do marxismo da IIª Internacional era a incompreensão da dialética?”. (Idem, p. 131.)

Parece indubitável o impacto da leitura de Hegel nos escritos posteriores de Lenin. Mas a tese de um suposto “corte epistemológico” não é capaz de explicar sua trajetória intelectual. A questão é, o que fazer com Que fazer?. Assumida a tese do “corte”, a relação entre a teoria do partido – formulada por Lenin antes de 1914 – e o método dialético ficaria sem solução. Ou a teoria do partido afirmar-se-ia independente do método dialético e, portanto, do próprio marxismo; ou a teoria do partido – como expressão do método dialético no terreno organizativo – seria fraturada pelo mesmo “corte”. Sabe-se que há nuances importantes, nem sempre levadas em consideração, entre a teoria de Que fazer?, escrito em 1903, e Esquerdismo, doença infantil do comunismo, de 1921, por exemplo. Afinal, três revoluções sociais e uma guerra mundial deveriam ter seu impacto na teoria, como de fato tiveram. Mas em seus postulados básicos a teoria do partido permanece em sua essência a mesma: uma organização centralizada de revolucionários profissionais, capaz de fundir o marxismo com o movimento espontâneo e inconsciente da classe operária.[6]

Descontinuidades mais importantes há, entretanto, na teoria política lenineana e, particularmente em sua teoria do Estado e da revolução. A demora em reconhecer o papel dos soviets e a recusa do caráter socialista da revolução russa durante a revolução de 1905 são indicativos dos limites do marxismo de Lenin nos primeiros anos do século XX. Para a superação desses limites foi importante sua leitura de Hegel. Mas ao invés de sugerir que foi unicamente a leitura de Hegel que motivou essas descontinuidades, considero mais prudente afirmar que uma mudança histórica na relação de forças entre as classes – a Guerra e a Revolução – levou Lenin a abordar situações concretas para as quais suas concepções se mostravam claramente inadequadas. Necessitou então construir novas ferramentas teóricas que lhe permitissem levar a cabo uma análise concreta. Daí a importância de sua leitura de Hegel e de sua crítica metodológica ao marxismo da Segunda Internacional.

Referências bibliográficas
ALTHUSSER, Louis. Lenine et la philosophie: suivi de Marx et Lenine devant Hegel. Paris: Maspero, 1972.
BENOIT, Hector. Teoria (dialética) do partido ou a negação da negação leninista. Outubro, n. 2, 1998, p. 47-61.
LABICA, Georges et alli. Práctica política y espíritu de partido em filosofia. México: Roca, 1977.
LEFEBVRE, Henri. O pensamento de Lenin. Lisboa: Moraes, 1969.
LENIN, V. I.. Collected Works. Moscou: Foreign Languages/Progress, 1963-1966. (Citado como CW.)
LÖWY, Michael. Método dialético e teoria política. São Paulo: Paz e Terra, 1978.
LUKÁCS, Georg. História e consciência de classe. Rio de Janeiro: Elfos, 1989.
LUKÁCS, Georg. Lukács sobre Lenin. 1924-1970. Barcelona: Grijalbo, 1974.
MARX, Karl e ENGELS, Friedrich. Selected correspondence. Moscou: Progress, 1965.
MARX, Karl. Capital. Londres, Penguin, 1990.
MAYER, Robert. Lenin and the practice of dialectical thinking. Science & Society, v. 63, n. 1, 1999.
PLEKHANOV, G. V.. Os princípios fundamentais do marxismo. São Paulo: Hucitec, 1978.
STALIN, J. V.. Trotskyism or leninism? Speech delivered at the Plenum of the Communist Group in the A.U.C.C.T.U., November 19, 1924. In: J. V. Stalin. On the opposition. Pequim: Foreign Languages, 1974.
STALIN, J. V.. The foundations of leninism. Lectures delivered at the Sverdlov University. In: Problems of Leninism. Pequim: Foreign Languages Press, 1976
TROTSKY, Leon. Tendences philosophiques du bureaucratisme (novembre 1928). In: Œuvres. 2e.série. Grenoble: Institut Léon Trotsky, 1989, v. II, p. 389-411.

Notas

[1] Uma primeira versão deste artigo foi apresentada no Seminário Lenin: 80 anos, realizado no Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas, em novembro de 2004. O professor Hector Benoit gentilmente leu uma primeira versão deste texto e fez a respeito importantes observações críticas. A responsabilidade pelas idéias aqui apresentadas é, entretanto, exclusivamente do autor.

[2] Utilizamos neste texto as Collected Works (Obras Selecionadas) de V. I. Lenin publicadas em inglês pela editora Progress em Moscou (ver as referências bibliográficas). Por comodidade citamos esta edição como CW, indicando o volume e a página.

[3] O argumento não fazia senão repetir a resposta do próprio Marx ao artigo do mesmo Mikhailovski, publicado no Otiechesviennie Zpiski (c. MARX e ENGELS, 1965, p. 312).

[4] Para Robert Mayer, a idéia de que a verdade é sempre concreta é o princípio essencial da dialética leninista. A fonte desse princípio não seria, entretanto Hegel, mas sim Chernichevski e Plekhanov. (Cf. MAYER, 1999, p. 44.)

[5] Vale lembrar o famoso aforismo formulado por Lenin no Conspecto do Livro de Hegel “Ciência da Lógica”: Não é possível compreender plenamente o ‘Capital’ de Marx e particularmente o seu capítulo I sem ter estudado a fundo e sem ter compreendido toda a Lógica de Hegel. Por conseguinte, meio século depois nenhum marxista compreendeu Marx!” (CW, v.38, p. 180.) Esse modo de exposição era exemplar para Lenin porque revelava a unidade existente ente o singular e o universal, pois o universal existe apenas por meio do singular. Era isso o que permitia que a partir de uma proposição simples destacando uma singularidade, como por exemplo aquela que abre o capítulo I de O Capital – “A riqueza das sociedades nas quais prevalece o modo de produção capitalista aparece como uma ‘imensa acumulação de mercadorias’, e a mercadoria individual aparece como sua forma elementar” (MARX, 1990, p. 125), fosse possível revelar os germes de todos os elementos da dialética.

[6] Sobre a continuidade da teoria do partido em Lenin e seu caráter dialético, ver BENOIT (1998). Texto disponível na Internet: http://www.revistaoutubro.com.br/edicoes/02/out2_04.pdf.