No dia 9 de fevereiro, o Supremo Tribunal Federal definiu que a aplicação da Lei Maria da Penha é válida também com queixas de terceiros. Com essa decisão, não é necessária a denúncia e representação apenas da mulher vítima de violênciaA Lei Maria da Penha foi aprovada em 2006 e significou, do ponto de vista da lei, um avanço importante, pois diferenciou os crimes de violência contra a mulher dos crimes de violência em geral, além de apontar medidas de proteção e amparo das mulheres vítimas de violência. Entretanto, a garantia da efetivação da Lei fica em aberto na própria lei, na medida em que não prevê orçamento e prazos de execução das propostas de construção de Casas Abrigo, Delegacias de Mulheres, Juizados e varas especializadas, etc.

Assim, ao longo de 5 anos de sua implementação, a Lei Maria da Penha configurou-se mais como um projeto de intenções, pois nesse período, apenas 7 novas casas abrigo foram construídas em todo o país e apenas 50 novas delegacias o que, considerando a quantidade de municípios brasileiros, ainda é muito pouco para amparar uma realidade que atinge grande parte das mulheres de nosso país. É neste cenário que se incide a nova decisão do STF.

A quantidade de denúncias realizadas até hoje está longe de condizer com a quantidade efetiva de casos de violência, pois, para muitas mulheres, a denúncia não significa apenas uma ruptura com o agressor, mas também com a família, os filhos, com suas condições de sobrevivência, etc. Além disso, romper com o casamento/relacionamento é também uma ruptura com algumas das regras sociais imposta às mulheres, que cresce e é educada sob a ideia de que seu sucesso está relacionado apenas a um casamento bem sucedido.

Todos esses elementos permeiam a cabeça das vítimas antes de elas resolverem denunciar. A mulher vítima de violência se vê aprisionada apenas a opções injustas: “ou eu denuncio e transformo minha vida em um inferno ou eu sigo no inferno de uma relação violenta que machuca física e psicologicamente, às vezes até sexualmente”.

É por essa realidade que os instrumentos de amparo e proteção das vítimas são cruciais para fazer valer a Lei Maria da Penha. Se todos esses instrumentos existissem, faltaria um elemento importante: a possibilidade de que terceiros possam denunciar, afinal o Estado e a justiça não podem encarar que “em briga de marido e mulher não se mete a colher”.

Com a decisão do STF, avança-se na abordagem do problema, ajudando a romper com a ideia de que se trata de um problema individual ou conjugal. Mas essa medida tem pouca efetividade se não for acompanhada da criação de instrumentos que protejam as mulheres diante de suas decisões, para que elas possam ver no amparo do Estado uma alternativa ao inferno de uma relação com violência física, psicológica, sexual, etc.

O STF está preocupado com a violência contra as mulheres?
Dessa forma, questionamos o fato de o próprio STF não impor medidas relacionadas à proteção das mulheres. E mais, questionamos o fato de esse mesmo STF respaldar ações violentas que incidem drasticamente sobre a vida das mulheres trabalhadoras, como a ação absurda realizada no Pinheirinho, reconhecida legal pelo mesmo STF que pareceu se preocupar com a violência contra as mulheres.

As mulheres também são vítimas de uma violência institucionalizada pelo Estado com a ausência de políticas públicas. A falta de creches, a criminalização do direito ao aborto, os poucos recursos para a saúde, a falta de moradia são consequências violentas de políticas de Estado que não se preocupam com as condições de vida das mulheres trabalhadoras e enchem os bolsos de banqueiros e empresários que atuam, junto aos governos para a privatização da educação, da saúde e de todo tipo de direito social. Por que o STF não interfere com seu poder decisório também nesses aspectos?

Dilma, proteja as mulheres:
Implemente e amplie a Lei Maria da Penha!
Invista mais recursos para os programas de combate à violência!

A responsabilidade da proteção contra a violência e da proteção social às mulheres não se restringe ao STF. O governo tem grande poder de decisão e execução sobre essas ações e o primeiro governo de uma mulher deveria ter isso como uma de suas prioridades.

Em seu primeiro ano de governo, Dilma cortou recursos do programa de combate à violência. Dos 119 milhões previstos, apenas 36 milhões foram repassados e apenas metade disso foi empenhado. Assim, não é possível ter casas abrigo, consolidar uma rede de proteção social que atenda as mulheres que são vítimas de violência, o que por sua vez incapacita qualquer decisão positiva do STF.

Dos investimentos previstos para construção de creches, Dilma programou o repasse de 2 bilhões aos municípios, mas apenas 383 milhões foram repassados e apenas 39 creches foram inauguradas simbolicamente, sem estarem prontas, totalizando ao final de 2011 nenhuma nova creche pronta integralmente.

Além de não encarar o combate direto à violência, com investimento em programas, o governo ajuda a promover a violência consequente da falta de políticas sociais. Às mulheres trabalhadoras, resta a alternativa da luta e da organização conjunta com a classe trabalhadora.

As alterações positivas nas leis, que ajudam no combate à violência contra a mulher ou que interferem positivamente nas condições sociais de vida são fruto de muita luta. Com a decisão do STF não foi diferente, são anos de lutas e embates para que a violência contra a mulher seja abordada de maneira efetiva pelo Estado. Ainda assim, a violência contra a mulher segue sendo uma dura realidade.

O caminho certo é o caminho das lutas
O principal erro que podemos cometer agora é parar de lutar, ou mesmo acreditar que sem luta, o STF ou o próprio governo Dilma venham a atender as demandas das mulheres. O julgamento legal da ação do Pinheirinho pelo STF demonstra que esse órgão tem lado de classe e que este só exerce algo favorável aos trabalhadores sob muita pressão e organização social.

As prioridades do governo federal também demonstram este tem escolhido governar para os empresários e banqueiros e não para as mulheres trabalhadoras, como prometeu em sua campanha. Acreditamos que a união de homens e mulheres trabalhadores através da luta e da organização classista pode construir outra realidade. A realidade de um mundo sem machismo e sem exploração.

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