Wilson Honório da Silva, da Secretaria Nacional de Formação do PSTU

Na quinta-feira, 18 de março, cinco militantes petistas foram presos pela Polícia Federal de Brasília, por terem aberto uma faixa que, reproduzindo uma charge publicada pelo cartunista Aroeira, em junho de 2020, associava a postura genocida do presidente Bolsonaro diante da pandemia ao símbolo do nazismo. Quatro deles foram liberados no dia seguinte (o quinto continuou detido, devido a um processo anterior).

As prisões e o cerceamento da liberdade de expressão já são evidentes e inaceitáveis exemplos de arbitrariedade e autoritarismo. Contudo, há algo ainda pior por trás do episódio: elas se basearam na Lei de Segurança Nacional (LSN), uma das piores “heranças” da Ditadura Militar (1964-1985), quando foi usada para perseguir, prender, torturar e matar, impunemente, quem lhe fizesse oposição.

E isto está longe de ser um caso isolado. Discursos e ameaças têm crescido na proporção inversa da visível queda de popularidade do presidente, apontada em todas as pesquisas mais recentes. Coisas que, de forma alguma, podem ser menosprezadas.

Acuado

Popularidade despenca e ameaças de autoritarismo aumentam

Bolsonaro ainda tem algo entre 25% e 30% de apoiadores, contudo, apenas cerca de 15% deles são considerados seu “núcleo duro” – negacionistas, que compactuam cegamente com sua postura criminosa diante da pandemia, fundamentalistas e saudosistas do regime militar. É exatamente para esta última parcela que ele acena quando encarna, sem máscaras, sua versão mais autoritária.

E os acenos não têm sido poucos nem sutis. Dias antes das prisões em Brasília, Carlos Bolsonaro, vereador carioca e filho “Zero Dois”, havia tentado enquadrar o youtuber Felipe Neto na mesma lei e pelo mesmo motivo. Em janeiro, o ministro da Justiça e Segurança Pública, André Mendonça, também acionou a LSN contra o advogado Marcelo Feller (que defendeu, em um programa da CNN, que o presidente era parcialmente responsável pelas mortes por Covid-19), repetindo o que já havia feito contra o escritor Ruy Castro e os jornalistas Ricardo Noblat e Hélio Schwartsman.

Pouco depois, a Controladoria-Geral da União quis silenciar professores da Universidade Federal de Pelotas, tentando fazê-los assinar um “termo de compromisso” que os impediria de criticar o governo. Mais recentemente, houve, ainda, o ataque orquestrado pelo “gabinete do ódio” contra a médica Ludhmila Hajjar (convidada para assumir o Ministério da Saúde) e a prisão, também em base a LSN, de um jovem em Uberlândia (MG), em função de uma postagem no Facebook.

À lista, podem ser agregados, ainda, ameaças e processos movidos contra um número crescente de jornalistas, artistas e ativistas, país afora.

Entulho autoritário

Varrer a LSN para o lixo da História

No centro destes ataques autoritários está o recurso à funesta Lei de Segurança Nacional. Segundo um levantamento publicado pelo “O Estado de S. Paulo”, somente nos dois primeiros anos do governo Bolsonaro, a Polícia Federal acionou a LSN para abrir 76 processos, um índice 285% maior do que em 2015 e 2016. A prática se tornou tão corriqueira que a Defensoria Pública da União (DPU) e um grupo de advogados acionaram, no dia 19 de março, o Supremo Tribunal Federal (STF), com um pedido para que sejam encerrados todos e quaisquer inquéritos e ações penais instaurados com base a LSN.

Contudo, isto é pouco. E nem mesmo o fato de que a lei foi usada para acusar o deputado Daniel Silveira, por ter xingado os juízes do STF, pode ou deve ser usada em sua defesa. Silveira tem que ser preso por incitar e atuar, concretamente, em defesa da implantação de uma ditadura que liquide com todas as liberdades democráticas.

Ou seja, Silveira merecia estar atrás das grades, acima de tudo, por defender a essência da LSN, utilizada há décadas como um instrumento contra o povo, a classe trabalhadora e todos aqueles e aquelas que lutam.

Sua primeira versão foi criada no início da ditadura de Getúlio Vargas, em 1935, para combater “crimes contra a ordem pública”. Em 1969, foi reeditada como uma “lei antiterror”, na esteira do famigerado Ato Institucional nº 5, e novas versões surgiram em momentos chaves: em 1978, quando a luta contra a Anistia tomava as ruas e o país estava às vésperas do movimento grevista que marcaria o começo do fim da Ditadura; e em 1983, quando explodiu o movimento “Diretas, Já!”.

Desde então, houve várias tentativas de derrubar a LSN, mas todas elas fracassaram em função da covardia dos chamados governos democráticos em tudo que se refere a saldar as contas com o regime militar. Uma situação particularmente vergonhosa no que se refere à história do PT, que teve muitos dos seus enquadrados pela LSN, inclusive Lula.

Em 2014, a Comissão Nacional da Verdade chegou a recomendar a revogação da lei, mas a ideia nunca seguiu adiante.

É por isso que, da mesma forma que torturadores e agentes da repressão continuam soltos e impunes, Bolsonaro e seu governo têm as mãos livres para utilizarem a LSN como forma de intimidação e ameaça contra aqueles que, em número crescente, exigem sua saída. E, por isso, também, que derrubar esta lei é parte importante da luta contra um governo já inquestionavelmente genocida.