A grande burguesia brasileira e seus meios de comunicação tentam criar estereótipos sobre a legalização das drogas com afirmações como: “com a droga legalizada o seu consumo explodirá, pois atrairia muito mais gente para o consumo”.
Ou produzindo caricaturas do tipo: “se a droga for legalizada ‘drogados’ poderão comprar estas substancias em qualquer esquina”, ou ainda: “pedras de crack serão vendidas em botecos de qualquer favela”. Como se o consumo, e principalmente o tráfico, estivesse ligado às camadas mais pobres da população e aos setores mais explorados da classe trabalhadora.

Nada mais falso. A economia da droga movimentou entre 300 a 500 bilhões de dólares no ano passado, abastecendo um mercado de aproximadamente 200 milhões de pessoas, uma quantidade nada desprezível. É um dos mercados mais rentáveis do mundo. 2
Cerca de 90% das receitas do tráfico vão para os bancos e são lavadas no sistema financeiro internacional. Somente os 10% restantes são repatriados aos países produtores e divididos entre os traficantes. A rentabilidade da droga é estimada em cerca de 3.000% enquanto que os camponeses ficam com apenas 0,1% do volume final dos negócios.
Para a realização de toda operação o sigilo bancário é um dos trunfos do narcotráfico, pois assim o sistema financeiro mundial absorve os lucros do crime sem perguntar pela origem. Assim, mais de 40 “paraísos fiscais” (paraíso do capital financeiro) lavam os narcodólares.

Narcotráfico é coisa de grandes capitalistas imperialistas
Para se ter uma ideia, entre 1919 e 1933 vigorou a Lei Seca nos EUA, com a proibição da comercialização de álcool. Com isso houve um crescimento do comércio ilegal promovido pelas máfias, como a de Al Capone, lucrando muito, pois os preços foram multiplicados de três a quatro vezes.

O Brasil é considerado um dos principais corredores de drogas do mundo, e um “mercado em expansão”. Um dos motivos é que vários dos maiores bancos daqui não informaram ao governo sobre contas suspeitas. A expansão do mercado ilegal de dólares (contrabando, narcotráfico) desenvolveu muitos esquemas para remessas ilegais de divisas para o exterior. Um exemplo são as contas CC-5 criadas pelo Banco Central às pessoas que residem no exterior, mas que movimentam dinheiro no Brasil. “Essas contas são o verdadeiro esgoto pelo qual passam o dinheiro sujo provenientes de atividades ilegais para o exterior e que é lavado e reinvestido na economia ‘legal’”, afirma Ney Jansen em Drogas, Imperialismo e Luta de Classe.

O imperialismo e as drogas
Não é novidade que comércio de drogas e o imperialismo sempre mantiveram um grande envolvimento, como testemunha as guerras do ópio (1840 -1860), quando a Inglaterra, gerente do tráfico de ópio, invadiu e derrotou a China para manter seu comércio.

Durante a Segunda Guerra Mundial a OSS (Oficina de Serviços Estratégicos), antecessora da CIA, fez acordos com a máfia italiana e Lucky Luciano, um dos principais traficantes da época. Em troca de informações de espiões nazi-fascistas ele e vários mafiosos foram libertados das prisões. Quando voltou a Itália, em 1943, pelas mãos da OSS, Luciano construiu seu império através da heroína. (José Luiz Del Roio. Itália: operação mãos limpas. E no Brasil? Quando?).

A produção massiva de drogas somente foi possível com a Revolução Industrial. Isso provocou, segundo Corggiola, “a grande transformação das economias monoprodutoras em narcoprodutoras (…) se produziu durante os anos oitenta, quando os preços das matérias primas despencaram no mercado mundial: açúcar (-64%), café (-30%), algodão (-32%), trigo (-17%). A crise econômica mundial exerceu uma pressão formidável em favor da narco-reciclagem das economias agrárias, que redundou num aumento excepcional de oferta de narcóticos nos países industriais e no mundo todo” . (Osvaldo Coggiola, Questões de história contemporânea).

Em dezembro de 1989, 13 mil fuzileiros norte-americanos invadiram o Panamá com o objetivo de controlar o Canal do Panamá e o tráfico pelo canal. Afinal, por essa rota, somente o Cartel de Medellín, com a ajuda de Noriega [ex-ditador deposto pelos EUA durante a invasão], exportou para os Estados Unidos cerca de duas toneladas de cocaína e 500 toneladas de maconha, entre 1984 e 1986. (Drogas, Imperialismo e Luta de Classe, Ney Jansen).

Manoel Antônio Noriega, ex-agente da CIA e chefe da polícia panamenha, participou do financiamento das guerrilhas de direita contra o governo sandinista da Nicarágua, da operação “Irã-contras” (compra de armas no Irã para se financiar a guerrilha contra o governo sandinista), tinha deixado de ser um homem de confiança e queria muitos lucros para si próprio.

Já no Afeganistão, os rebeldes Mujhaidines (base da Al Qaeda de Osama Bin Laden) produziam ópio. A produção passou de 250 para 800 toneladas durante o tempo em que a CIA enviava armas à guerrilha para lutar contra os soviéticos. Os talibãs ordenaram em julho de 2.000 a destruição dos cultivos de papoulas. A produção de drogas foi retomada depois da invasão militar dos EUA ao Afeganistão em 2001. Após a invasão, o Afeganistão superou a Colômbia e se tornou o maior produtor mundial de drogas (principalmente ópio e heroína). Em 2003, o negócio faturou 2,3 bilhões de dólares, mais da metade do PIB do país. O Afeganistão produz atualmente 92% do ópio mundial.(Drogas, Imperialismo e Luta de Classe, Ney Jansen)

E por falar em Colômbia, este país produz cerca de 80% da cocaína do mundo e o narcotráfico representa 10% do PIB. Na década de 1980, com a queda dos preços das matérias primas no mercado mundial, os fazendeiros deixaram de produzir café para produzir cocaína. O governo colombiano autorizou empréstimos externos para eles com dólares trocados por pesos, possibilitando que o narcotráfico ampliasse a atividade econômica. Também deram anistias tributárias, por meio das quais foram incorporados e legalizados os investimentos dos narcotraficantes. Esse plano ficou conhecido como a Ventanilla Siniestra. Nessa época, o mega-traficante Pablo Escobar era deputado e um dos homens mais importantes do país. Políticos, congressistas e presidentes (como Ernesto Samper e Álvaro Uribe) são acusados de terem pertencido e serem financiados pelos cartéis.

Os EUA e a União Europeia investem bilhões de dólares com o chamado “Plano Colômbia”. No entanto, as áreas de cultivos de coca que eram de cerca de 50 mil hectares, entre 1986-1996 e, após o Plano Colômbia, chegaram a 170 mil hectares em 2001.

O processo contra o coronel Oliver North envolvido no caso Irã-contras “demonstraram com nomes e fatos que por vários anos a CIA e a DEA [departamento de narcóticos dos EUA] estiveram em contato com os chamados cartéis colombianos, protegendo, a entrada de drogas nos Estados Unidos. Tal operação servia para encontrar fundos ilegais para financiar as forças opositoras ao governo sandinista da Nicarágua” (San José Mercury News 18/08/1996)

Segundo Gluckstein, “no plano financeiro, o mercado do petróleo e o da droga tem algumas semelhanças. Uma e outra destas mercadorias tem preços que possuem uma relação muito longínqua com o seu custo de produção…Mas a comparação para por aí. Se os petrodólares permitiram criar a dívida dos países dominados, os narcodólares vieram substituí-los para assegurar uma parte do pagamento dessa dívida. E, sobretudo, não se fala das mesmas massas de dinheiro (…) se a relação entre o preço de produção do petróleo e o seu preço de venda no varejo é de 1 para 40, os cálculos efetuados pela Agência americana da luta antidroga (DEA) apontam para uma relação de 1 para 200, para a cocaína, e 1 para 2000 para a heroína.” 1(Daniel Gluckstein. O imperialismo senil).

Guerra à juventude negra e probre
E quem são os mais prejudicados com a expansão deste mercado? Os jovens. Em 2002 foi publicado um estudo tendo por base o envolvimento de jovens no tráfico na cidade do Rio de Janeiro na qual se demonstrou um aumento no número de crimes nos anos 90, e ao mesmo tempo a redução da idade do ingresso das crianças no narcotráfico. A média de 15 a16 anos nos anos 1990 caiu para 12 a13 anos em 2000. Os jovens são em sua maioria pobres, negros e com baixa escolaridade.

Pela legalização das drogas
Sob o capitalismo a droga é uma mercadoria, o tráfico se organiza como uma empresa que objetiva o lucro. Diga-se de passagem, uma empresa com milhões de trabalhadores precarizados, sem nenhum direito trabalhista e vivendo sob um regime do medo, podendo ser torturados ou mortos em qualquer momento.
No tráfico de drogas não existe um “livre-mercado”. A distribuição e a venda são comandadas por um número reduzido de grupos hierarquizados que controlam a fase mais rentável: a transformação da pasta-base em cocaína. (Pierre Kopp, A economia da droga. Bauru: Edusc. 1998.)

Em regiões como a Califórnia, maior produtora do mundo, e no nordeste brasileiro a produção da maconha é comandada pelos latifundiários da droga.
A luta contra o narcotráfico exige a luta contra a lavagem de dinheiro com um ataque a todo o sistema de circulação de capitais. Com punição exemplar aos grandes traficantes; fazendo a reforma agrária nas terras em que se produz droga ilegalmente; confiscando o dinheiro e propriedades advindas do tráfico e da lavagem; acabando com o sigilo bancário e centralizando o crédito nas mãos do Estado através da nacionalização dos bancos.

Além disso, o governo deixaria de gastar bilhões em policiamento e repressão e arrecadaria bilhões com os impostos de quem comprasse drogas em locais legalizados. Estes impostos poderiam ser aplicados em saúde, educação, atividades culturais e recuperação de químicos dependentes

As drogas seriam qualificadas para o consumo: “médico, terapêutico e recreativo”. E os consumidores cadastrados para o consumo com o acompanhamento de um centro de saúde. Com isso, o uso da droga seria “controlado”. Os dependentes químicos se submeteriam a um tratamento público, eficaz e humanitário, com recursos do Estado, que ofereceria uma rede pública com centros de tratamento e profissionais qualificados e bem treinados.

Junto com isso o governo continuara combatendo o consumo através de campanhas educativas que expliquem os malefícios do consumo exagerado de toda e qualquer droga.