Cunha é preso pela Polícia Federal em Brasília
Mariucha Fontana

A prisão de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) causou uma espécie de toque de recolher no Congresso Nacional. Na Câmara dos Deputados, em pouco tempo, os deputados vazaram e derrubaram o quórum.

Temer, que estava no Japão, voltou correndo para o Brasil e a ordem para a base governista foi “silêncio”: não dizer um “A” de comentário sobre a mesma.

Se Eduardo Cunha fizer delação premiada pode vir abaixo não apenas o governo Temer, mas também a maioria do Congresso Nacional. Resta saber se fará e, se fizer, com que grau de “seletividade”. Muitos especulam que entre os primeiros fulminados por Cunha estariam  Moreira Franco (PMDB-RJ), assessor especial de Temer e sogro do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ); Geddel Vieira Lima (PMDB-BA), ministro da Secretaria de Governo  e Eliseu Padilha (PMDB-RS), ministro da Casa Civil do governo Temer.

Em discurso no Senado, Lindbergh Farias (PT-RJ) disse que “se Cunha falar o governo Temer não se sustenta por um dia”.

À prisão de Cunha se soma a delação da Odebrecht fechada com o Ministério Público Federal que deve envolver 50 executivos, além dos donos da empresa, e incluir 120 políticos de todos os partidos. Especula-se que ela pode derrubar Temer e todo o staff que o cerca. Atingiria também o PSDB. Serra já está dentro e a linha 4 do metrô de São Paulo está entre as 38 obras da Odebrecht investigadas na Lava Jato.

O governo Temer tenta acelerar a aprovação das medidas econômicas que o “mercado” quer, com o apoio do judiciário, diga-se de passagem. Quer votar no Congresso a PEC 241 (passou na Câmara e agora será votada dia 28 no Senado) e a regulamentação do Pré-Sal a toque de caixa para ver se mostra força e ganha maior sustentação e unidade da burguesia ao mostrar-se capaz de ser útil para a mesma ainda que impopular.

Temer acha que essa é a garantia para evitar cair, mesmo que venha ficar sitiado por Cunha, Odebrecht, outras delações ou mesmo pelos trabalhadores. Movimento parecido fez Dilma: garantiu a votação no Congresso dos ataques ao PIS e ao seguro-desemprego e a votação no Senado do sistema de partilha no Pré-sal. Mas não foi o bastante. Na época, a maioria da burguesa também achava que seria melhor não ter que trocá-la para garantir suas reformas. Melhor seria manter o calendário eleitoral do regime.

Agora também, por enquanto, a opinião da maioria da classe dominante sobre esse governo é bem expressa pela declaração do ex-presidente FHC no dia 7 de setembro : “Não é uma ponte, é uma pinguela. Mas, se quebrar a pinguela, cai no rio…”.

A linha não é derrubar Temer. Querem “estabilidade” para aplicar suas reformas contra os trabalhadores. Mas, como pinguela é pinguela, já começam a pensar num plano B.  

Do PT ao PSDB, a prisão de Cunha não causou alegria
O PT decidiu não se pronunciar oficialmente sobre a prisão do Cunha, por isso seu presidente Rui Falcão não quis falar sobre o fato.  Segundo a revista Isto É, Paulo Teixeira (PT-SP) um dos vice-presidentes do partido declarou que “não se tripudia em cima desta situação”.

Muitos não veem na prisão de Cunha nada mais do que uma “mera cortina de fumaça para pavimentar a prisão de Lula”. A Lava Jato e o juiz Sérgio Moro teriam levado Cunha à prisão apenas para afastar as denúncias sobre seletividade e perseguição ao PT, para poder assim atingir seu objetivo final, que seria prender Lula ou impedir que ele se candidate em 2018 e “desmantelar” o PT.

Guilherme Boulos, da Frente Povo Sem Medo, em artigo no jornal Folha de São Paulo, é um dos que trabalham com essa lógica dos campos – de um lado está o DEM, o PSDB, o Moro e os EUA, do outro, está Lula, Renan Calheiros e antes Temer (o “golpista”, o Joaquim Silvério dos Reis) e esteve algum dia também Cunha. Por isso diz: “A prisão de Cunha é esperada e desejada há um longo tempo, desde 2015 há provas contundentes de seu envolvimento com a corrupção na Petrobras. Prendê-lo só agora parece ser, porém, uma jogada de Moro para mostrar que a Lava Jato não é seletiva. Dessa forma, cria-se o ambiente para uma prisão arbitrária do ex-presidente Lula”.

O fato é que nenhum dos grandes partidos ficou feliz. O PMDB, óbvio, pode sofrer um terremoto, se Cunha quiser. Nesse caso, não é possível sequer afirmar se sobra alguém para apagar a luz. Mas o curioso é que DEM e PSDB também não estão achando nada muito tranquilo e favorável a Lava Jato, a prisão de Cunha e a delação da Odebrecht.

Basta ver que Gilmar Mendes, ministro do STF que não esconde de ninguém ser PSDB desde que nasceu, anda disparando uma artilharia pesada contra a Lava Jato e o Ministério Público, defendendo a lei de abuso de autoridade. Lei que Renan Calheiros (PMDB), com apoio de todos os grandes partidos (PT, PMDB, PSDB, DEM) querem aprovar, para abafar a Lava Jato.

O delegado Sérgio Moro
O delegado Sérgio Moro

Por sua vez, a operação Lava Jato, o Juiz Sérgio Moro, os promotores do MPF e a Polícia Federal são mesmo dados ao “espetáculo”.  São seletivos, fazem parte dos de cima, desse Estado que todos os dias prende e arrebenta com os pobres na periferia. Eles não são neutros e não merecem aplausos. O ministro da Justiça, ex-advogado do PCC e amigo do Alckmin, é um pateta do MBL. O STF anda fazendo uma reforma trabalhista sem discussão e acaba de ameaçar o funcionalismo público, dizendo que vai cortar ponto dos grevistas. Pertencem todos ao Estado burguês, que, com os de baixo é implacável. No andar de baixo, “estado de exceção” existe faz tempo, aliás cresceu de maneira exponencial sob os governos do PT ao serviço do imperialismo e do capitalismo (mas isso é tema de outro artigo).

À classe trabalhadora não compete escolher o lado da Odebrecht, do Renan, da Kátia Abreu, do Cunha e do Lula-PT ou do Alckmin- PSDB, Alexandre de Moraes (ministro da Justiça), Odebrecht de novo (que está nos dois campos) e da Lava Jato, ainda que muitas vezes eles se misturem. Agora, por exemplo, Gilmar Mendes (STF-PSDB), Renan Calheiros (Senado-PMDB), Temer (Executivo-PMDB); Lula e Dilma (PT), Gleicy Hoffmann e etc. (PT), Rodrigo Maia (presidente da Câmara e do DEM), estão todos juntos na defesa da “lei do caixa 2” e da lei do “abuso de autoridade” contra a Lava Jato, assim como estão contra a “operação Métis” e prisão de membros da Polícia Legislativa. Supostamente, estão unidos na defesa da “democracia” e do “Estado Democrático de Direito”.

As lutas dos trabalhadores e a crise política
Há um acordão geral entre a burguesia em jogar a crise econômica nas costas dos trabalhadores (os governos Dilma e Temer, nesse quesito, não têm grandes diferenças),  mas há  divisão entre os de cima na disputa do poder de Estado e na hora de definir os setores mais privilegiados da burguesia nessa hora de aperto. A profundidade da crise econômica e social alimenta a crise política e a Lava Jato, que é produto dessa crise, ao mesmo tempo é também mais um fator a alimentá-la.

A recente crise e enfrentamento entre parte do judiciário, a PF, o MPF, a Polícia Legislativa e o próprio Senado (o poder legislativo), mostra que a crise política está longe de acabar e não é pequena.

É bem possível  que uma operação “abafa Lava Jato” unifique o grosso do Congresso Nacional e da burguesia  Essa operação abafa, de certa maneira, já começou, porém se ela consegue vingar nos prazos que os principais partidos consideram necessário há que se ver.

A classe trabalhadora, o povo pobre e negro da periferia, a juventude e suas organizações, os sindicatos, os movimentos populares e sociais – mulheres-negros-LGBTs-imigrantes- do campo e da cidade, devem saber que essa crise entre os de cima é mais um motivo para que os de baixo se unam numa Greve Geral para derrubar as reformas desse governo Temer e desse Congresso.

A unificação das lutas pode impedir os ataques aos nossos direitos e abrir caminho para fazer com que sejam os ricos a pagarem pela crise. E para que os trabalhadores possam constituir um governo verdadeiramente seu, através de Conselhos Populares.

Nessa luta, devemos seguir defendendo a prisão e confisco dos bens de todos os corruptos e corruptores.  Mas não depositar confiança na justiça dos ricos e na Lava Jato.

O povo quer que todos sejam julgados e presos, ou seja: também os corruptos do PSDB e do próprio judiciário, além dos corruptos do PT. Não quer nem que apenas Lula seja punido e nem que não se garanta direito de defesa, quer que todos sejam punidos.  Diferente da burguesia e de amplo espectro da esquerda que defendem a impunidade, porque segue atrelada a um dos campos burgueses. É grotesca a posição de uma parte da esquerda que considera “progressivo” o campo burguês (corrupto) do qual o PT faz parte e com o qual governou os últimos 14 anos o Brasil e reacionário o campo da oposição burguesa. Essa esquerda não passa no teste da independência de classe e não consegue ajudar a nossa classe a enfrentar esses dois campos burgueses, para construir uma Greve Geral capaz de botar abaixo as reformas defendidas por estes dois campos, que são as mesmas defendidas pelo imperialismo.

Enquanto uns priorizarem defender Lula e outros a Lava Jato, os debaixo vão perder. Unidade dos debaixo para derrubar as reformas dos de cima e para botar fora todos eles. E abrir caminho para que os debaixo governem de verdade através de Conselhos Populares.

Vamos construir uma Greve Geral com manifestações de rua para derrubar a PEC 241, as reformas da Previdência e trabalhista, a reforma do Ensino Médio, defender o emprego, o salário e nossos direitos.

Por Mariúcha Fontana, da Direção Nacional do PSTU