Conversamos com Laudelina Nogueira de Souza, presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Madeireiras dos Municípios de Rondon do Pará e Abel Figueiredo. Ela nos falou sobre a luta dos trabalhadores e as difíceis condições de trabalho e vida na região.

`FotoOpinião Socialista — Conte-nos sobre a história do sindicato?
Laudelina — Começamos um movimento na empresa, em 1993. Na época o sindicato tinha um escritório dentro de uma empresa. Montamos uma chapa e ganhamos o sindicato. De lá pra cá, fizemos mobilizações e greves, por isso levei uma justa causa, mas conseguimos a reintegração. Em 1996, concorri e assumi a presidência; em 2000, fui reeleita.

Como é ser presidente mulher num sindicato como esse?
Sou mulher, mãe de cinco filhos, e isso faz com que eu enfrente muito preconceito no comando de um sindicato onde a maioria é de homens. O problema não é tanto com os trabalhadores, mas com parte da patronal. Já houve casos de patrão dizer: “O que você está fazendo aqui? Você deveria estar no seu fogão”.

Há ameaças e repressão na sua região?
O problema da repressão é muito grande. Têm empresas onde a gente nem consegue entrar, também recebemos ameaças constantes pelo telefone.

Qual é a situação na base do sindicato, hoje?
Temos cerca de cinco mil trabalhadores, entre formais e informais.

Como é a situação deste trabalho informal?
É trabalho escravo ou semi-escravo. Nas serrarias e nas carvoeiras. Você encontra coisas horríveis. Não tem carteira assinada, não tem 13º, não recebem férias, não recebem quando são mandados embora. Ainda tem o problema do supermercado. O empresário monta um supermercado para o trabalhador fazer compras, mas, quando ele é demitido, acaba não recebendo nada, pois tudo é descontado em dívidas.

Trabalho escravo mal disfarçado…
Sim. E tem mais. Há uma prática de horas extras na qual os trabalhadores têm que trabalhar aos domingos para pagar a alimentação da semana. Alguns trabalhadores nos disseram: “Lá é um Carandiru, quem vai para lá sofre, não pode dizer nada, não pode fazer nada, tem que comer calado, tem horário para dormir, passando das 22h ninguém pode ficar fora dos alojamentos, senão o guarda reprime. É uma prisão”.

Há muitos relatos de violência física?
Sim, muitos. Em outubro, um senhor chegou no sindicato chorando. Ele disse que pegou uma faca para tirar um leite de uma madeira e quando voltou os capangas o pegaram, amarraram e o levaram para a guarita, com uma corda, para enforcá-lo. Ele dizia: “Quando eu já estava com a língua pra fora, um outro cara deu um tiro perto de mim e eu pensei: agora eu já estou morto!”. Depois da maldade, o trabalhador foi solto. Nós fomos até Belém e denunciamos, mas até agora nós não tivemos nenhum resultado.

Quem controla as indústrias de lá?
São cerca de 30 patrões que estão relacionados ao governo do estado e do município. É o setor madeireiro que controla Rondon do Pará, são eles que ditam as regras.

Quais são as principais reivindicações e principais lutas?
Aumento de salários, melhor qualidade de vida, melhores condições de trabalho. O pessoal trabalha e vive precariamente, sem nenhuma proteção. O salário mais baixo é de R$ 245. Tem algumas gratificações, como comissões por função e assiduidade. São coisas que a gente conquistou, mas o salário mais alto não passa de R$ 348.

Vocês têm dificuldades para chegar aos locais de trabalho?
As empresas estão se deslocando da cidade e levando os trabalhadores para 100 Km dentro da mata. Isso dificulta nosso trabalho, porque geralmente eles usam uma guarita a 2 Km do pátio da serraria e dificilmente o sindicato consegue passar. Os trabalhadores ficam lá em turnos de quinze dias.

Há notícias de desaparecimento de trabalhadores…
Sim. Hoje, os trabalhadores de Rondon do Pará não querem mais trabalhar para eles. O que eles fazem? Eles vão para o Maranhão, pegam de 100 a 200 trabalhadores, dizendo que o salário é maior do que é de verdade. E tem caso de trabalhadores que são trazidos e não voltam. Um trabalhador nos procurou e, pedindo sigilo, contou que um rapaz foi demitido e, depois, o capanga da empresa disse que a demissão tinha sido reconsiderada e que ele poderia dormir e retornar ao trabalho de manhã. No dia seguinte, ele não apareceu, não bateu o cartão e ninguém sabe o que aconteceu. Dias depois, uma senhora contou que o marido dela tinha visto um homem ser jogado dentro de uma caldeira para queimar vivo. Não temos provas, mas tenho certeza que são depoimentos verdadeiros.

Mudando de assunto, como foi sua história com o PSTU?
Desde 1994, quando a gente ingressou no movimento sindical, eu já tinha alguma relação com o pessoal do PSTU de Belém, mas, neste mesmo ano, eu me filiei ao PT, pois nós não tínhamos muita opção de escolha no município, naquele momento. Porém, quando o Lula se candidatou, em 2002, as propostas que ele estava trazendo me convenceram que ele não era mais a pessoa que eu tinha que defender. Eu tinha aprendido que era preciso dizer não à Alca, não ao FMI e à dívida externa, e o Lula estava dizendo tudo o contrário.
Vi que eu tinha que sair do partido. Eu acompanhei a candidatura do Atenágoras, para deputado estadual, e vi que a gente tinha que se filiar e trazer o PSTU para o nosso município. No começo, foram apenas quatro, agora já temos um diretório.

Houve um episódio marcante em relação ao palanque do PT durante a campanha?
No segundo turno das eleições, tinha um comício do PT e eu passei e dei uma olhada. E quem estava no palanque? Todos os assassinos estavam lá. O assassino do Lezinho, um sindicalista morto em 2002, estava lá e a viúva dele também. Aquilo me indignou muito. Até me chamaram para subir no palanque e eu disse não. Lá não era meu lugar. Lá estava o Sr. Décio Barroso Mendes, o mandante do crime, algo que foi provado, junto com a esposa da vítima. Como também estavam os mandantes do José de Ribamar, o sindicalista que foi morto há um mês.

E que você acha que irá acontecer daqui pra diante?
O Encontro Sindical Nacional contra as reformas do governo demonstrou que as lutas vão aumentar. Nosso papel, lá entre os madeireiros, é levar a discussão sobre a luta contra as reformas para fazer parte desse enorme movimento que, eu acredito, pode criar uma alternativa de luta para todos os trabalhadores do campo e da cidade.
Post author Por Wilson H. Silva, da redação
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