TVs e jornais não podem citar ou exibir nomes de agressoresEm novembro de 2007, a Barra da Tijuca, na zona oeste do Rio, foi palco de mais uma barbaridade e violência contra as mulheres. Poucos meses após a doméstica Sirley Dias carvalho ter sido confundida com uma prostituta e agredida com chutes e pontapés em um ponto de ônibus, outros três jovens cariocas mostraram que consideram essa agressão algo algo natural e perfeitamente aceitável. Em novembro de 2007, eles usaram um extintor de incêndio para agredir duas prostitutas, como “diversão”. Foram denunciados, julgados e condenados a cumprir pena alternativa trabalhando como garis.

Na época o pai de um deles chocou a opinião pública ao defender a selvageria do filho. “Eles não fizeram nada demais. Foi uma brincadeira de criança”, afirmou. Agora, é a vez do juiz Carlos Alfredo Flores da Cunha, do 9º Juizado Especial Criminal, que proibiu dez veículos de comunicação cariocas de veicular imagens dos três estudantes. Seis emissoras de TV e quatro jornais também não podem fazer qualquer referência ao nome dos envolvidos. Caso contrário, estão sujeitos a multa de R$ 10 mil. Foram censuradas as TVs Globo, Brasil (ex-TVE), Bandeirantes, CNT, Record e Rede TV! e os jornais O Globo, JB, Extra e O Dia.

O juiz ainda determinou que os jovens, cumprindo pena alternativa na limpeza das ruas, sejam fotografados enquanto trabalham. Para proteger os agressores, o juiz também determinou que eles trabalhem em locais diferentes a cada dia e de pouco movimento. Como não estamos na lista, seguem os nomes dos dois maiores de idade: Fernando Mattos Roiz Júnior, 19 anos, Luciano Filgueiras da Silva Monteiro, 21.

Leia abaixo a íntegra da decisão do juiz, publicada pelo site Comunique-se

“Tenho acompanhado em diversos veículos de comunicação a repercussão da decisão do IX Juizado Especial Criminal sobre jovens envolvidos em agressão a uma pessoa na Barra da Tijuca. Primeiramente, são condenáveis os rótulos utilizados em diversos comentários. Pouco interessa a origem ou classe social dos envolvidos, ou a profissão ou gênero a que pertence a vítima: Para ser isenta a matéria deveria relatar um conflito entre dois jovens recém entrados na vida adulta (e por isso penalmente responsáveis) e um outro ser humano (pouco importa se homem ou mulher) que foi agredido. A Constituição Federal de 1988, chamada de Constituição Cidadã, trouxe, dentre outras inovações, mudanças profundas no Direito Penal brasileiro. Passamos de uma justiça meramente retributiva (a imposição de um mal por um mal praticado) para um novo paradigma de Justiça, com a possibilidade de adoção do que se consagrou como ´Justiça Restaurativa´. A regra do art. 98, I da Constituição Federal de 1988 foi materializada na Lei nº 9.099/95, que possibilita, nos crimes cuja pena privativa da liberdade não ultrapassa 2 anos, a solução do litígio através do acordo civil ou da transação penal. O acordo civil implica em alcançar a pacificação social através do acordo de vontades entre as partes envolvidas. De nada adianta, por exemplo, definir apenas resposta penal para um crime de ameaça entre vizinhos decorrente do barulho excessivo produzido em um apartamento, se a causa da desavença permanece. Outros crimes ocorrerão, talvez até mais graves, se houver vencidos e vencedores no processo penal, ao passo que se a Justiça conseguir aproximar as partes em litigio e coloca-las juntas em uma mesa para negociar uma solução confortável para todos, a paz social pode ser alcançada de maneira mais efetiva. Útil para a reflexão trazer o conceito de mediação: processo, a maioria da vezes formal, pelo qual uma terceira pessoa neutra tenta por meio da organização de trocas entre as partes, permitir que esses confrontem seus pontos de vista e procurem com sua ajuda a solução do conflito que as opõe (BONAFÉ-SCHIMITT, Jean Pierre). Em outros litígios, a resposta penal é a adequada, como por exemplo no crime de posse de drogas para uso próprio, ou no caso que envolveu os jovens que praticaram a contravenção do art. 65 da Lei das Contravenções Penais. Todavia, mesmo nesses casos, não se pode buscar apenas na resposta repressiva a melhoria das relações humanas. A pena proposta nunca foi ou será uma humilhação, um menosprezo pelo infrator, mas sim uma resposta do Estado, através do Ministério Público, adequada aos fatos envolvidos. Houve comentários de que a pena foi excessivamente branda e outros apontando que a pena foi excessivamente rigorosa. Houve ainda quem, indignado com a sanção aplicada, questionasse se haveria menosprezo pela função do Gari. Torna-se necessário esclarecer, de plano, que não há nenhum menosprezo pela função do Gari. Bem ao contrário, há reconhecimento de sua importância, já que os jovens foram colocados ao lado de trabalhadores exemplares para que aprendam com eles. Nunca o Ministério Público responsável, como é o caso da representante do Parquet neste Juizado, cogitaria em pensar que qualquer profissão é castigo. Somente porque se reconhece a importância desses profissionais (Garis) este Juizado tem a confiança em colocar qualquer cidadão perto deles para que aprendam a crescer como tal. O art. 198 da Lei de Execuções Penais veda a exposição do réu à inconveniente notoriedade. Houve, de certa forma, uma excessiva exposição dos autores do fato na mídia, o que pode ter efeitos perversos, não só para os próprios autores, como, o que é pior, para a sociedade, que em nada se beneficiará de um debate meramente sensacionalista da Justiça Penal. Assim, como Juiz da execução da transação penal, me cumpre evitar desvios de execução, razão pela qual: 1. Determino a intimação dos principais veículos de comunicação locais (Redes de TV – Globo, TVE, Bandeirantes, CNT, Record, Rede TV – e Jornais de grande circulação – O Globo, Jornal do Brasil, Extra, O Dia), determinando que se abstenham de veicular imagem dos autores do fato, salvo expressa concordância dos mesmos, ou fazer referência aos seus nomes em matérias sobre o fato em análise nestes autos, inclusive via internet; 2. Estabeleço multa no valor de dez mil reais em caso de descumprimento, em favor da Associação Solidários Amigos de Betânia, de endereço conhecido do Cartório; 3. Determino, ainda, que se oficie à gerência local da Comlurb, para que sejam fixadas rotas para cumprimento das tarefas dos autores do fato que evitem locais de aglomeração de pessoas ou de grande fluxo de público, devendo ser evitada a repetição de rotas. 4. Não deverá haver divulgação prévia das rotas. Dê-se ciência pessoal ao Ministério Público e intimem-se as defesas. “

  • Veja, no site da Conlutas, as resoluções do Grupo de Trabalho de Mulheres e GLBT e a moção contra a violência às mulheres

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