John Reed

Reed não esconde a sua paixão e o seu entusiasmo pelos acontecimentos revolucionários“Com imenso interesse e igual atenção li, até o fim, o livro Dez Dias que Abalaram o Mundo, de John Reed. Recomendo-o, sem reservas, aos trabalhadores de todos os países”. Fazemos nossas, também sem reservas, essas palavras de Lenin. John Reed foi um dos mais importantes jornalistas do mundo e mostrou que o jornalismo só alcança sua verdadeira função quando colocado a serviço da luta dos trabalhadores.

Para quem quiser saber o que foi a Revolução Russa, nada como ler o livro de John Reed. Escrito no estilo do jornalismo literário, Reed alcança a perfeição em sua obra ao combinar o mais puro jornalismo com um leve toque romanceado, que não esconde sua paixão e seu entusiasmo pelos acontecimentos revolucionários. O livro foi tão fiel aos fatos que mereceu um prefácio escrito por Lenin, em 1919, dizendo que ele “certamente ajudará a esclarecer o problema do movimento operário internacional”.

John Reed nasceu nos EUA, em 1887. Filho de família tradicional, e acomodada, optou em seguir por outros caminhos. Com grande talento para as artes e as letras, rebelde e de espírito aventureiro, formou-se em Harvard em 1910. Começou a trabalhar como jornalista em uma revista comercial, mas rebelou-se contra o estilo de vida burguês que levava e, em 1913, uniu-se a um grupo de artistas e escritores socialistas que editavam a revista The Masses.

O ano de 1913 ainda não tinha terminado e John Reed já embarcava para o México, como correspondente de guerra. Viveu durante vários meses com as tropas do rebelde Pancho Villa e, em 1914, a cobertura que fez da Revolução Mexicana saiu publicada em livro, com o título de México Rebelde.

Dez Dias que Abalaram o Mundo
Mas foi com Dez Dias que John Reed tornou-se conhecido mundialmente. Este é um dos primeiros livros-reportagem que conhecemos na história da imprensa. Trata dos dias e momentos decisivos da revolução bolchevique na Rússia, em outubro de 1917. Foi a principal cobertura feita por John Reed em sua vida de repórter. Já no título, o repórter procura refletir sobre o que realmente foi a revolução, algo que abalou o mundo tamanha a sua complexidade e extensão.

John Reed cobriu os dez dias decisivos da revolução, quando os operários tomaram o poder, dirigidos pelo Partido Bolchevique de Lenin e Trotsky. No prefácio que escreveu ao livro, em 1919, John Reed deixa claro o período que cobriu: “Este livro é um pedaço da História, da História tal como eu a vi. Não pretende ser senão um relato detalhado da Revolução de Outubro, isto é, daqueles dias em que os bolcheviques, à frente dos operários e soldados da Rússia, apoderaram-se do poder e o puseram nas mãos dos sovietes”.

Enquanto a revolução se aproximava, a vida parecia transcorrer tranqüila nas grandes cidades. O repórter não deixa passar:

“É claro que os teatros funcionavam sem interrupção todas as noites, inclusive aos domingos (…) Grande número de mulheres intelectuais assistia às conferências sobre arte, literatura ou temas filosóficos para principiantes. (…) a vida convencional e fútil da cidade seguia o seu curso, ignorando a revolução tanto quanto possível. Os poetas faziam versos, mas não sobre a revolução. Os pintores realistas pintavam cenas históricas da Rússia Medieval, mas não reproduziam um só aspecto da revolução. As mocinhas das províncias continuavam chegando à Capital para aprender francês e estudar canto”.

Reed lembra que a Rússia enfrentava o pior racionamento de gêneros alimentícios, e que, para comprar leite, pão, açúcar e fumo era necessário esperar numa fila durante horas seguidas. Mas as “mulheres da pequena-burguesia saíam todas as tardes para o passeio ou o chá, levando consigo o minúsculo açucareiro de ouro ou prata e um pãozinho escondido no regalo, repetindo nas conversas fúteis que faziam votos pela volta do czar e pela entrada dos alemães na Rússia. Ou que pelo menos aparecesse alguém capaz de solucionar o problema das criadas”.

Reed não deixa passar a nota bem-humorada: “A filha de um amigo meu chegou um dia à minha casa sufocada de indignação porque uma mulher, condutora de bonde, a havia chamado de camarada”.

A tranqüilidade da “vida normal” era apenas aparente. Do outro lado da cidade, era uma agitação infinita, uma disputa de idéias e de posições políticas. “Durante vários meses”, diz Reed, “em Petrogrado, e em toda a Rússia, cada esquina era uma tribuna pública. Nos trens, nos bondes, em toda parte, repetidamente, surgiam polêmicas e discursos”.

Nesse clima, o direito à informação, à leitura, ao conhecimento era um dos mais reivindicados pelos trabalhadores, camponeses e soldados. “A sede de instrução, durante tanto tempo insatisfeita, lançou a Rússia num verdadeiro delírio de manifestação de idéias”. O jornal assumiu um papel de primeira linha, sendo disputado com avidez pela população.

“Em cada cidade, em cada povoado, nas trincheiras, cada agrupamento político possuía o seu jornal (…) e a Rússia absorvia livros, manifestos e jornais como a areia suga a água. Era insaciável. E não eram fábulas, história falsificada, religião diluída ou novelas corruptoras, mas teorias econômicas e sociais, filosofia, obras de Tolstoi, Gogol e Gorki”, relata John Reed. Essa sede de conhecimento e de informação, que fez do jornal e do livro instrumentos verdadeiramente revolucionários, produziu momentos de intensa emoção no repórter. Um dos mais extraordinários ficou registrado ao final do primeiro capítulo do livro, uma cena que a sensibilidade de Reed permitiu captar e que compõe um retrato fiel do que foi a Revolução:

“Fui visitar postos avançados do 12º Exército, perto de Riga, onde os soldados extenuados, descalços, adoeciam no lodo das trincheiras. Quando me viram, esses homens macilentos, com o sofrimento estampado nas faces, padecendo o frio e a umidade que penetravam pelos vãos abertos nas vestes esfarrapadas, correram para mim, perguntando ansiosos: ‘Você trouxe algo para se ler?’”

Outras obras de Reed
Além de “México Rebelde” e “Dez Dias que Abalaram o Mundo”, John Reed escreveu “A Guerra dos Bálcãs”, cobertura jornalística que fez da Primeira Guerra Mundial, e a coletânea de contos “A Filha da Revolução”. Acaba de sair pela Editora Boitempo “Eu Vi um Mundo Novo Nascer”, pequena autobiografia na qual ele descreve com riqueza de detalhes, e numa narrativa muito interessante, seus primeiros anos como jornalista e seu entusiasmo pela Revolução socialista. Vale a pena!

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