Além das violações trabalhistas denunciadas na construção da Hidrelétrica no Madeira, em Porto Velho o índice de migração foi 22% maior que o previsto, os casos de estupro aumentaram em 208% e quase 200 crianças permanecem fora da escola apenas em uma das vilas. Os dados estão no Relatório sobre Jirau, lançado nessa semana em Brasília. A maior preocupação é que violações desse tipo tendem a se repetir em Belo Monte.

Dois meses após a revolta dos operários na usina de Jirau, em Porto Velho, a Relatoria Nacional para o Direito Humano ao Meio Ambiente entrega nessa semana à autoridades em Brasília, o relatório que aponta inúmeras violações aos direitos humanos na obra. Além do desrespeito à legislação trabalhista e das violações de direitos humanos encontradas, a relatoria constatou que a infraestrutura montada pelos consórcios para a obra é insuficiente. Resultado disso é que centenas de crianças estão fora da sala de aula, a qualidade de vida das comunidades piorou, houve aumento expressivo nos índices de violência, incluindo as ocorrências de estupro, que aumentaram em 208%.

O relatório é resultado de uma missão emergencial realizada em abril, motivada pelo levante dos operários que incendiaram 54 ônibus e 70% dos alojamentos. Apenas na usina de Jirau eram 21 mil trabalhadores compartilhando alojamentos, denunciando surtos de viroses, jornada excessiva de trabalho e outras más condições que a magnitude e a pressa em acabar a obra ocasionaram. As comunidades realocadas reclamam da piora na qualidade de vida: estão em casas de alvenaria de má qualidade, longe de suas terras, onde plantavam e colhiam, e do rio, onde pescavam. Elas afirmam que a renda hoje é muito inferior ao que recebiam antes.

Segundo o Relator para o Direito Humano ao Meio Ambiente, José Guilherme Zagallo, as conseqüências das obras do Madeira constatadas pela relatoria tendem a se repetir em Belo Monte em uma escala ainda maior. A Relatoria já havia realizado uma missão no Madeira em 2008 e também esteve em Belo Monte no ano passado. Na opinião de Zagallo, o Pará, assim como Rondônia, não possui estrutura para receber esse contingente de trabalhadores e migrantes, o que acarretará em mais violações. “O estudo de impacto ambiental de Belo Monte prevê que a população de Altamira vai duplicar com a construção da usina”, afirma o relator.

Na avaliação da Relatoria o Estado Brasileiro não está preparado para essas grandes obras. “Em uma única semana, em março, 80 mil trabalhadores de obras diferentes estavam em greve por más condições de trabalho. Só em Jirau e Santo Antonio, o Ministério do Trabalho fez 2.000 autuações por violações à legislação trabalhista”, afirma o Relator. Tanto as usinas no Rio Madeira como a usina de Belo Monte, no Rio Xingu, são obras de envergadura do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), financiadas com recursos públicos pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

A Relatoria pretende mobilizar autoridades para que o Governo Brasileiro tome as medidas cabíveis que reparem as violações constatadas e evitem novas violações.

Saiba mais sobre a Relatoria:
As Relatorias de Direitos Humanos são uma iniciativa da sociedade civil brasileira, que têm como objetivo contribuir para que o Brasil adote um padrão de respeito aos direitos humanos econômicos, sociais, culturais e ambientais. O projeto foi implantado pela rede Dhesca Brasil em 2002, inspirado no modelo dos Relatores Especiais da ONU.

O desafio dos/as Relatores/as é o de diagnosticar, relatar e recomendar soluções para violações apontadas pela sociedade civil. Para verificar as denúncias acolhidas, as Relatorias visitam os locais realizando missões, audiências públicas, incidências junto aos poderes públicos e publicam relatórios com recomendações para a superação dos problemas identificados.

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