Durante depoimento, Jefferson denuncia gastos de campanha que não são declarados por deputados e nenhum deles contestaNeste dia 30 de junho, o deputado petebista Roberto Jefferson depôs à CPI dos Correios, num debate que só terminou às duas horas da madrugada. O longo depoimento trazia novidades sobre as denúncias do mensalão e gerou polêmica no plenário com os deputados petistas. O deputado chegou ao plenário com um olho roxo, dizendo que um armário de cds caiu e bateu em seu rosto. Também trouxe uma mala, na qual continha documentos sobre financiamento de campanha dos deputados.

Sobre seu envolvimento nas denúncias de corrupção nos Correios, Jefferson tentou desqualificar a gravação em que o ex-funcionário dos Correios Maurício Marinho aparece recebendo R$ 3 mil e dizendo que operava com o aval do deputado do PTB. Jefferson disse que o conteúdo da fita foi deturpado pela edição e atribuiu a gravação ao “braço sujo da Abin“. Na maior cara de pau, o picareta tentou desqualificar as denúncias contra Marinho dizendo que ele é apenas um peixe pequeno, “funcionário do terceiro escalão”.

“Não sou pior e nem melhor do que vocês”
Porém, a maior parte do depoimento esteve ligada ao caso do mensalão e aos financiamentos de campanha. Jefferson trouxe os documentos sobre a declaração de gastos de campanha dos parlamentares e disse que os valores declarados não correspondem à realidade. O deputado disse que “não há eleição de deputado federal que custe menos de R$ 1 milhão ou R1,5 milhão, mas a média aqui da CPI da Câmara dos Deputados, na prestação de contas é de R$ 100 mil“. No caso de senadores, ele disse que “não há uma eleição de senador que custe menos de R$ 2 milhões, R$ 3 milhões“. “A prestação de contas, na média é de R$ 250 mil“, acrescentou.

Ao incriminar os deputados que o inquiriam, Roberto Jefferson expôs a verdade sobre os financiamentos de campanha dos deputados, sem exceção. Pelas denúncias não contestadas, a maior parte, cerca de 90% do financiamento das campanhas eleitorais dos parlamentares, provêm de “caixa dois”, recursos não declarados de empreiteiras, empresários, banqueiros e latifundiários. “As declarações na Justiça Eleitoral não traduzem essa realidade. Nem a minha, porque é igual a dos senhores”, confessou o petebista que completou expondo todo o mar de lama da democracia dos ricos e corruptos: “Vou questionar um por um dos senhores. Vamos ver se nossas práticas são tão diferentes assim“.

Mensalão continuou sendo pago
Sobre o papel de Marcos Valério no caso do mensalão, Jefferson chamou o publicitário de “versão moderna e macaqueada de PC Farias“. O tesoureiro do PT, além de ter sido acusado de ser o organizador do esquema de mesadas, também foi apontado por Jefferson como um dos participantes do desvio de recursos de Furnas para o caixa petista.

Roberto Jefferson afirmou em seu depoimento que o dinheiro do mensalão, depois de certo período, passou a ser sacado em uma agência do Banco Rural no Brasília Shopping. Segundo o petebista, que forneceu até o endereço completo onde era pago a propina, o dinheiro seguiu sendo pago mesmo depois que Jefferson denunciou o esquema ao presidente Lula.

Furnas
Roberto Jefferson já havia afirmado anteriormente que a origem do dinheiro destinado ao pagamento dos mensalões aos deputados da base aliada vinha de desvios em empresas estatais. Isso tem ficado mais claro nas declarações mais recentes do deputado. Em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, Jefferson afirmou que havia uma sobra de caixa mensal de R$ 3 milhões da Furnas, que era desviado e dividido entre o diretório nacional do PT, o diretório mineiro do partido, alguns parlamentares da base aliada e alguns diretores da estatal.

Jefferson disse que ficou sabendo da operação por meio do diretor de engenharia da estatal, Dimas Toledo. Também disse que esse caso pessoalmente para José Dirceu, então ministro da Casa Civil. “Tudo o que Dimas me explicou eu relatei depois com o José Dirceu. Ele confirmou que era isso mesmo”.

Depois das novas denúncias, o presidente Lula afastou os diretores de Furnas citados por Roberto Jefferson, repetindo basicamente o que fez com Dirceu quando Jefferson pediu para Dirceu “sair daí”.

Acareação
O senador Jefferson Peres (PDT-AM) apresentou um requerimento à comissão, que deve ser votado na próxima semana, para que a CPI coloque frente a frente Roberto Jefferson, o deputado e ex-ministro José Dirceu (PT-SP) e o tesoureiro do PT, Delúbio Soares.

Dirceu e Delúbio ainda não prestaram depoimento à comissão parlamentar. Aliás, nem sequer foi votado o requerimento para que eles deponham à comissão. Fato que comprova o caráter chapa branca da CPI. Se a acareação for realizada, só ocorrerá depois que os envolvidos depuserem separadamente.

O sujo, o mal lavado e a água suja
A tática usada pelos deputados petistas foi a de tentar desqualificar as acusações de Jefferson, levantando sua participação no esquema dos Correios e no caso Collor. O primeiro confronto aconteceu com o deputado Henrique Fontana (PT-RS), o primeiro da base governista a usar da palavra. “Para ter coragem, o senhor deveria assumir que participou do esquema de corrupção nos Correios“, afirmou o deputado petista.

“Estou na frente de um homem que mentiu muito“, continuou. “Vossa Excelência foi da tropa de choque do governo mais corrupto deste país“, disse Fontana sobre o período em que Jefferson defendeu o governo Fernando Collor.

Jefferson respondeu, reivindicando sua própria coerência política. Disse que o PTB já era defensor do modelo neoliberal quando apoiava FHC e que continuava a defender esse modelo agora no governo Lula. Jefferson questionou, por outro lado a falta de coerência do PT, dizendo a Fontana que “na minha trajetória de vida fui mais coerente que Vossa Excelência. Eu não cuspo nas minhas bandeiras de luta“, afirmou.

Uma das respostas de Jefferson às acusações dos petistas foi dizer que “não há um filete de água pura num cano de água suja”. Desta forma, o deputado não nega sua participação nos esquemas e afirma que todos ali estão envolvidos nas falcatruas e caixa dois de campanhas eleitorais. A comprovação mais imediata disso foi que, diante de uma das principais acusações de Jefferson de que todos os deputados e senadores tinham gastos de campanha muito superiores aos valores declarados, nenhum dos deputados e senadores presentes contestou a afirmação para se defender. Pelo contrário, prenderam a respiração enquanto Jefferson falava. O picareta, que da noite para o dia tornou-se o novo “paladino” da ética, diz sem escrúpulos que ali no Congresso todo mundo está com o rabo preso. “Aqui ninguém é melhor ou pior do que eu. Estou entre iguais”. A frase síntese da opera bufa da democracia dos ricos é da autoria de Jefferson.