A 12° edição da Parada do Orgulho GLBT (Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais) de São Paulo, ocorrida no último dia 25, foi marcada por lamentáveis episódios de violência contra os ativistas do Bloco Classista Independente e Combativo, da Conlutas. A Associação da Parada de São Paulo (APOGLBT), que organiza e dirige a atividade, vetou o trio-elétrico da Conlutas por motivos políticos e jogou a polícia militar para cima dos ativistas. O que resultou em vários militantes feridos e quatro presos, entre eles Zé Maria de Almeida, da coordenação nacional da Conlutas.

A história se repete
A origem das paradas do orgulho gay data de 1969, quando os gays, lésbicas e travestis que freqüentavam um bar chamado Stonewall, em Nova York, se insurgiram contra a violência da polícia. Eles detonaram uma luta de rua que durou quatro dias. Uma das faixas que decorava o carro de som da Conlutas, assinada pela sub-sede da Apeoesp de São Miguel, tinha como frase: “Stonewall está presente, homofobia se combate com luta!”.

Novamente, gays e lésbicas foram espancados e presos pela polícia, mas agora, vergonhosamente, no dia em que se luta pela igualdade e que se celebra a diversidade. E desta vez, aqueles que se assumem como defensores dos GLBT’s agiram exatamente igual aos fascistas homofóbicos jogando policiais como cães raivosos contra nosso bloco.

O que está por traz do veto da APOGLBT
A violência desmedida da APOGLBT e da PM contra a Conlutas é o resultado inevitável das contradições de classe que atravessam o movimento homossexual hoje.
A parada de São Paulo está entre os três eventos mais lucrativos da cidade.

Mobiliza toda a rede hoteleira, boates, comércio, e um sem número de empresas e serviços para atender o evento. Além disso, conta com patrocinadores como governo federal, Ministério do Turismo, Prefeitura de São Paulo, Caixa Econômica, Hotéis, etc, sendo que em outras edições já contou o dinheiro da IG e da General Motors.
Se por um lado a parada se tornou um negócio milionário, por outro, ela não pode ficar nas mãos de “qualquer um”. Em função disso, a APOGLBT possui direitos de exclusividade na preparação do evento, numa espécie de acordo de “terceirização” feito com a prefeitura. Ou seja, a Associação da Parada simplesmente está privatizando um dia de luta histórico.

Somente após entender esses fatos é que é possível entender os motivos das agressões e prisões na parada. Se do lado da APOGLBT estão grandes empresas, governos, e toda uma lucrativa “indústria gay”, do lado da Conlutas estão ativistas e lutadores que lutam contra estes senhores. É o caso dos companheiros da oposição bancária, os metalúrgicos que lutam contra o banco de horas na GM, os professores que se enfrentam diariamente com o governo Serra, o funcionalismo federal que está na linha de frente na luta contra os ataques de Lula, os estudantes que ocuparam reitorias, inclusive, contamos com uma delegação dos bravos companheiros sem-tetos do Pinheirinho.

Nossos “patrocinadores” foram sindicatos, entidades estudantis e ativistas que trabalharam com dedicação para a preparação de nosso bloco. Temos o orgulho de afirmar que não temos nenhum comprometimento com a “burguesia rosa” ou os governos. Temos autonomia necessárias para levantar nossas bandeiras e não abandonar a históricas reivindicações do movimento.

Diante de uma festa milionária celebrada por grandes empresas e pelos governos, um bloco independente, só poderia representar uma ameaça. E para que não fosse comprometida a relação entre organizadores da parada, governos e burguesia, valeu tudo. Inclusive infringir o direito de livre expressão e manifestação.

Mentiras da APOGLBT
A atitude da Associação da Parada foi simplesmente absurda. Após a agressão, a associação disse que o trio da Conlutas não estava autorizado a participar da parada. Mas o veículo constava até na lista oficial de trios no Portal da Associação. Além disso, foi assinado um contrato com a associação e no dia da parada o carro passou pela vistoria técnica da polícia e da secretaria de transportes. O único argumento que poderia ser utilizado era a falta de uma corda de isolamento que, na ausência de argumentos por parte da APOGLBT, se tornou a desculpa contra a Conlutas. Evidentemente a corda foi obtida e ficamos absolutamente dentro de todas as exigências.

Em nenhum momento houve negociação conosco, os organizadores responsáveis só aceitaram falar com o comando da PM, e deram a ordem de retirada de nosso trio sem maiores explicações. Foi neste momento que estourou a repressão e resultou em violentos espancados contra os ativistas. Uma militante teve a mão quebrada e quatro ativistas foram presos sob as vaias da multidão ao redor.

A APOGLBT lançou uma vergonhosa nota em seu site, assumindo o veto, e repetiu novamente as mentiras sobre falta de documentos e vistoria. Mas não pretendemos fazer esse jogo e entrar nessa falsa discussão. O que queremos sim é debater politicamente com todos os ativistas GLBTs e todos os demais lutadores os rumos da luta homossexual.

Contra a homofobia nossa luta é todo dia
A Conlutas não vai deixar este episódio passar batido. Após o acontecido, já recebemos dezenas de mensagens, prestando solidariedade e manifestando uma total indignação não só com a atitude fascista da APOGLBT, mas com os próprios rumos do movimento.

Queremos agradecer o apoio de todas as organizações e militantes que nos escreveram e reivindicar a solidariedade que existe entre aqueles que são oprimidos. O questionamento à mercantilização e à privatização de nossa luta não parte somente da Conlutas, mas de muitos setores do país, que sabem que há mais vitórias à serem conquistadas do que comemoradas.

A parada de São Paulo somente abriu o calendário de paradas pelo país. A Conlutas irá participar de muitas outras, onde buscará o apoio e a solidariedade dos ativistas e grupos que acreditam que é preciso respeitar o direito à diferença de idéias na luta contra a homofobia. Vamos denunciar o totalitarismo da APOGLBT país afora, exigir o fim do monopólio de organização da parada. Nos últimos dias divulgamos uma nota e uma moção de repúdio. Várias mensagens de apoio e solidariedade à Conlutas, vidas do Brasil e de outros países, criticam não só à atitude totalitária da Associação da Parada como aos rumos do movimento GLBT.
Além disso, é necessário avançar na construção de um campo classista e combativo no interior do movimento GLBT brasileiro. A luta dos GLBTs surgiu contra a violência da burguesia e da polícia. A repressão em São Paulo só nos deixa convencidos da necessidade de reafirmar o espírito de Stonewal.

Post author Douglas Borges, do Grupo de Trabalho GLBT da Conlutas
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