Redação
70 anos da Quarta Internacional

A I Internacional, com Karl Marx surgiu com o início da organização dos operários. Já a II Internacional foi produto de uma época histórica: a reformista, onde a classe operária com suas lutas conseguiu grandes conquistas e organizou grandes sindicatos e grandes partidos operários.

Depois da derrota da Comuna de Paris e do grande avanço da economia capitalista (nas décadas de 1870 e1880) os governos se fortalecem, conseguindo desmoralizar e influir ideologicamente em importantes setores dos trabalhadores, especialmente na Inglaterra e na França, que haviam sido a vanguarda do processo revolucionário anterior.

Contudo, esse desenvolvimento industrial forneceu as condições materiais para lutar pelas reivindicações mínimas, centralmente na Alemanha. Depois de sua vitória na guerra franco-prussiana de 1871, a Alemanha unificada entrou em uma grande expansão industrial, parecida com a que Inglaterra tinha vivido vinte anos antes. Isso favoreceu a luta e a conquista de importantes reivindicações salariais, na legislação social e nas condições de trabalho, etc. Esta situação especial da Alemanha provocou não só um grande fortalecimento dos sindicatos, mas também do partido social-democrata, nome usado então pelos que reivindicavam as teses do marxismo. Nas eleições para a Câmara de Deputados, as votações do partido social-democrata saltaram de 102 mil votos, em 1871, para 493 mil, em 1877. Sete anos depois, o partido obteve 550 mil votos e em 1890 triplicou essa cifra.

Mas as organizações operárias da França e da Inglaterra estavam paralisadas e o sentimento era de desânimo.

A fundação da II Internacional

Ao final da década de 1880, a situação européia começa a mudar. A Inglaterra perde o monopólio do mercado mundial e isso provoca desemprego, miséria, grandes lutas e o surgimento de um novo sindicalismo, de operários não qualificados. Por outro lado, começa um gradual fortalecimento dos movimentos socialistas. Na França, Jules Guesde, destacado dirigente da Comuna de Paris, funda em 1879, junto a Paul Lafargue, o Partido Operário Francês, cujo programa foi escrito com a ajuda de Marx. Na Inglaterra se unem várias sociedades socialistas e marxistas. Organizaram-se partidos operários e socialistas em países como Dinamarca, Suécia, Bélgica, Áustria, Suíça e Itália. E começam a atuar os primeiros grupos marxistas da Finlândia e da Rússia.

Em 1889, no centenário da Revolução Francesa, o governo francês promove uma exposição mundial em Paris.

Ao mesmo tempo, a capital da França recebe 69 congressos internacionais. Um deles, convocado pelos socialistas alemães e franceses, foi o que fundou a Internacional Socialista, a II Internacional.

A Segunda Internacional, diferentemente da Primeira, não foi uma frente única entre organizações operárias, mas uma federação de partidos social-democratas. Marx já havia morrido e quem cumpriu um papel muito importante foi Friedrich Engels. Nos dez anos seguintes, a II Internacional foi aumentando sua influência e prestígio.

Reforma ou revolução

Os partidos social-democratas não eram partidos centralizados. No partido alemão, o mais importante da Internacional, existiam três alas: a esquerda (Rosa Luxemburgo, Karl Liebknecht, Clara Zetkin), a direita (Bernstein, Vollmar) e o centro (Bebel e Kautsky), que detinha a direção.

Os oportunistas, apoiando-se no fato de as condições objetivas ainda não estarem maduras para a revolução, buscaram fazer das lutas por reformas a essência do movimento socialista. Rosa Luxemburgo respondia: “entre a reforma e a revolução social existe, para a social-democracia, um vínculo indissolúvel. A luta pelas reformas é o meio; a revolução social, é o fim.”

Esta luta entre oportunistas e marxistas não ficou apenas no plano teórico e se entendeu ao conjunto da Internacional. Na França, a luta chegou ao máximo quando Alexander Millerand, membro do partido Socialista Independente, aceitou em 1889 o cargo de ministro da Indústria. Era a primeira vez que um dirigente socialista entrava num governo burguês. Esse fato provocou a divisão do partido.

Nesta polêmica, a esquerda e o centro atuaram juntos e derrotaram politicamente os revisionistas dirigidos por Bernstein e Vollmar. No congresso da social-democracia alemã, realizado em Dresden, em 1903, foi aprovada uma resolução que afirmava: “O congresso condena terminantemente os esforços dos revisionistas por mudar a linha tática que se aprovou com êxito no passado e que se deriva da idéia da luta de classes, substituindo a política de conquistar o poder derrotando nossos inimigos por uma política de concessões a ordem atual (…) O congresso declara: (…) que o Partido Social-democrata não pode lutar por uma cota de poder dentro do governo da sociedade burguesa”.

Em 1904, em Amsterdan na Holanda, o Congresso da II Internacional também adota esta resolução. Esse congresso, com 444 delegados, mostrou que a II Internacional se converteu em um grande movimento mundial. O peso da Segunda aumentou com a Revolução Russa de 1905, quando a jovem classe operária desse país, dirigida majoritariamente pela social-democracia, mostrou ao mundo seu potencial revolucionário.

O oportunismo se impõe

A revolução de 1905 moveu correntes revolucionárias em toda a Europa e atuou contra os oportunistas. Contudo, quem triunfou foi a contra-revolução. Leon Trotsky, sobre as conseqüências da vitória dos revisionistas na social-democracia alemã disse: “os esforços da ala esquerda do partido de levá-lo a uma política mais ativa foram infrutíferos. O centro dirigente se balançou mais e mais até a direita, isolando a esquerda. O conservadorismo, curado dos golpes recebidos em 1905, se recuperou totalmente.”

Entre 1906 e 1914, a Segunda começou a se transformar, e pouco a pouco se foi impondo a perspectiva reformista. O programa mínimo, formado apenas por reivindicações econômicas e imediatas, foi se convertendo no verdadeiro programa do partido. O programa máximo, baseado na luta revolucionária, passou a ser usado apenas nos discursos dos atos de Primeiro de Maio.

As bases materiais do revisionismo oportunista

Tudo estava ligado ao surgimento e fortalecimento do imperialismo. Os grandes lucros extraídos da exploração dos países coloniais e semi-coloniais permitiram que as grandes potências fizessem algumas pequenas concessões a seus trabalhadores, melhorando o seu nível de vida. Assim surgiu a aristocracia operária, que foi a base social de fortes burocracias políticas e sindicais.

Na medida em que crescia seu bem estar, os dirigentes políticos e sindicais se isolavam dos sofrimentos, misérias e aspirações das massas arruinadas e empobrecidas dos povos coloniais. Bernstein, a máxima expressão do setor oportunista, argumentava que necessariamente existiam duas classes de povos: os dominadores e os dominados. Alguns povos, dizia ele, eram como crianças incapazes de se desenvolverem.

A Primeira Guerra Mundial e a morte da II Internacional

Em outubro de 1912, Montenegro declarou guerra contra a Turquia. O perigo de um conflito mundial estava claro. A Internacional marcou um congresso extraordinário na Basiléia, para 24 e 25 de novembro. Foi aprovado por unanimidade um manifesto que chamava a enfrentar a guerra imperialista.

Em julho de 1914 o império austro-húngaro deu um ultimato à Servia. Os partidos da II Internacional puseram em prática o primeiro mandamento do Manifesto de Basiléia: “Se a guerra ameaça estalar (….) vamos desenvolver todos os esforços com o objetivo de prevenir por todos os meios que se considerem efetivos”. Em 29 de julho quando as tropas austríacas entravam em Belgrado, foram organizadas imensas manifestações contra a guerra, na Alemanha, Áustria, Itália, França e Bélgica.

Os dirigentes social-democratas confiavam que essas ações obrigariam seus governos a recuar. Mas não puderam impedir a guerra entre os países imperialistas. A Segunda Internacional e seus partidos teriam que colocar em prática o segundo mandamento do Manifesto da Basiléia: “utilizar com todas as forças a crise econômica causada pela guerra, para sublevar as massas e precipitar assim a queda do domínio de classe capitalista”. Era a prova de fogo. Havia que enfrentar o próprio imperialismo.

A II Internacional, porém, não passou na prova. A maioria dos dirigentes de todos os partidos terminou votando a favor dos créditos de guerra. Somente dois partidos não votaram a favor de seus próprios governos, os russos e os sérvios. Na Alemanha, o único deputado social-democrata que votou contra os créditos de guerra e que chamou os operários e soldados a voltarem as armas contra seus próprios governos foi Karl Liebknecht. O restante da social-democracia, segundo Rosa Luxemburgo, era “um cadáver mal cheiroso”.

Assim morre a II Internacional. Era necessário recomeçar a batalha. Sobre isso Trotsky em “A Guerra e a Internacional” escreve: “A II Internacional não havia vivido em vão. Havia logrado fazer um gigantesco trabalho educativo. Nunca antes na história existiu algo semelhante. Haviam educado e aglutinado ao seu redor as classes oprimidas. O proletariado agora não tem que começar desde o princípio”.

Recomeçando a batalha pelo internacionalismo

Em setembro de 1915 se realizou, em Zimmerwald, na Suíça, uma conferência internacional dos setores que estavam contra a política assumida frente a guerra.

Participaram 44 delegados, entre eles Lênin e Trotsky, que descreve a reunião da seguinte maneira: “Nos acomodamos como podemos em quatro carros e tomamos o caminho da serra. A população ficava olhando com gestos de curiosidade essa estranha caravana. A nós tampouco deixava de fazer graça que, cinqüenta anos depois da fundação da I Internacional, todos os internacionalistas do mundo puderam caber em apenas quatro carros. Contudo, naquela brincadeira não havia o menor ceticismo. O fio histórico se rompe com bastante freqüência. Quando ocorre tal coisa, não há nada o que fazer além de reatá-lo de novo”.