Passeata indígena durante o FSM
Rogério Marques

Movimento indígena lança carta de denúncia ao governo e desmente o discurso de Lula no FórumO movimento indígena do Brasil, representado por diversas entidades, lançou neste fórum uma carta de denúncia intitulada “Lula, a omissão venceu a esperança!”. Um dia depois do discurso de Lula no Fórum, no qual o presidente ressaltou avanços na política indigenista, as lideranças desmascaram os falsos dados e escancaram a situação de desrespeito em que vivem as tribos indígenas no país.

Lula citou em seu discurso a homologação de 44 terras indígenas. Porém, a homologação é o último estágio do processo de demarcação, no qual o presidente apenas deve assinar o papel. Para avaliar a política indigenista, é preciso ver quantas áreas foram declaradas, pois esse é o primeiro estágio do processo de demarcação. O número de declarações se limita a 11. Por esses dados, o governo federal nesses dois anos demarcou menos terras indígenas que o governo ditatorial de João Batista Figueiredo.

Segundo Jecinaldo Barbosa, da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), “existe uma frente anti-indígena no Congresso Nacional, formada por políticos latifundiários. Apesar de todas as esperanças, esse, como outros governos, continua a serviço da elite, enquanto a questão indígena continua na mesma situação”.

“Já se passam dois anos de governo e tudo continua: massacres, extermínio, silêncio e impunidade”, lamentou Marcos Xucuru, membro da Associação dos Povos Indígenas do Nordeste (Apoinne) e filho do Cacique Chicão, assassinado em 1998 com seis tiros por lutas pelas terras dos Xucurus.

Anastácio Peralta, líder guarani-kaiowá e membro da Comissão de Direitos Indígenas do Mato Grosso do Sul também denunciou: “o governo só faz aquilo que eles chamam de ações compensatórias e se esconde atrás delas. O que resolve é a demarcação e ampliação das nossas terras e isso eles não fazem”. Anastácio completa: “a política que está aí não tem resolvido nem pra nós nem para o país”. Os palestrantes também criticaram a FUNAI e sua prática paternalista.

Massacres impunes
Sob este governo, mais de 50 índios foram assassinados individualmente, comunidades foram queimadas, líderes foram ameaçados e seqüestrados, tudo isso impunemente. Das terras que ainda não foram homologadas (não passaram por todo o processo de demarcação), muitas sofrem com invasões, em que fazendeiros e garimpeiros chegam a criar de forma artificial um município dentro da área demarcada.

Um dos exemplos é a área de Raposa Serra do Sol, onde tal processo de invasão inclui violência, mortes de indígenas, enfim, a destruição de comunidades inteiras. Em novembro do ano passado três comunidades foram massacradas. A área de Raposa Serra do Sol está demarcada desde 1998 e esperava em 2003 somente pela homologação do presidente. Com a pressão dos políticos de Roraima, a portaria de homologação foi anulada.

Marinaldo Makuxi, do Conselho Indígena de Roraima (CIR), afirma que “esse governo está negociando nossas terras com esses fazendeiros. Dizem que se demarcarem nossas terras vão impedir o desenvolvimento do estado. Mas, hoje, quem impede o desenvolvimento do estado é a corrupção entre os fazendeiros e políticos”.

Um projeto anti-indigenista
Em dezembro de 2004 entrou na pauta do Senado um Projeto de Lei que altera os procedimentos de demarcação de terras indígenas. O PL 188/2004 determina que a demarcação seja submetida à aprovação do senado e prevê a convocação do Conselho de Defesa Nacional caso a terra indígena esteja em faixa de fronteira.

Além de criar mais dificuldades e trâmites para o processo de demarcação, que atualmente já é longo, o projeto trata os indígenas como uma ameaça à soberania nacional.

Amazônia – O argumento de que a demarcação de terras indígenas põe em risco a soberania nacional ocorre devido às áreas indígenas que existem na Amazônia e que ficam em regiões de fronteira. Alguns usam a defesa da demarcação para defenderem a internacionalização da Amazônia.

Jecinaldo responde: “não queremos a internacionalização! Nos sentimos brasileiros como qualquer um no país. Mas é preciso que o governo cumpra suas responsabilidades com a comunidade indígena para que não se abra espaço para os mal-intencionados intervenham, comprem líderes locais e façam o que fizeram com o cupuaçu por exemplo. Isso só acontece pela ausência de uma política indigenista do governo brasileiro”.

Antes de encerrar o debate e fazer a leitura da carta de denúncia do governo, Jecinaldo afirmou que “o movimento indígena classifica o governo Lula como um governo traidor de suas origens”.