Governador João Doria, durante Reunião virtual do Comitê Empresarial Econômico Foto govesp
Fábio Bosco, de São Paulo (SP)

Fábio Bosco, de São Paulo

Há um mês, a população paulista assiste ao governador João Dória (PSDB) e ao prefeito Bruno Covas (PSDB) realizarem coletivas de imprensa diárias cercados de especialistas.

Em meio a promessas de quarentena, leitos hospitalares, contratação de pessoal de saúde, testes, máscaras, álcool gel e caixas d’água, uma dura realidade vai se impondo: quarentena parcial, subnotificação, falta de leitos, fome e mortes.

Subnotificação

No último dia 13 de abril, às 12h30, o governador Dória e sua equipe anunciaram o avanço da pandemia em São Paulo: 8.895 casos de contaminação e 608 mortes.

Neste mesmo dia a imprensa trouxe duas notícias.

A primeira foi um levantamento realizado junto aos cartórios de registro civil de São Paulo e do Brasil. Esse levantamento constatou um aumento substancial de casos de óbitos por pneumonia e insuficiência respiratória no mês de março deste ano em comparação com o mesmo mês de março de 2019. Em São Paulo esse número foi de 1.280 óbitos. No Rio de janeiro foi de 282 e no Brasil foi de 2.239. Esses óbitos somados aos óbitos certificados elevam o total no estado de São Paulo a 1.888, um número qualitativamente diferente do anunciado pelas autoridades.

A segunda foi um estudo realizado pelo Núcleo de Operações e Inteligência em Saúde (Nois) que fazem estimativas quanto à subnotificação. Segundo esses cientistas, o número de casos notificados é de apenas 8% do número real em todo o país, o que aponta um número ao redor de 300 mil contaminados. Em São Paulo a subnotificação é ainda maior: a notificação é de apenas 6,5% do número real. Nessa estimativa, o número real de pessoas contaminadas no estado de São Paulo é de 136 mil pessoas.

Ambas as informações, muito importantes para acompanhar o avanço da pandemia e suas características como a letalidade, a população de risco, a chegada nas comunidades superpopulosas, passaram desapercebidas pelo governador.

Testes

O governador que prometeu “testar, testar, testar” tem um resultado pífio: ainda hoje são realizados apenas 1,2 mil testes por dia frente à promessa de 2 mil feita pelo governador. E ainda há um estoque de 15 mil testes não apurados.

A previsão é que a partir do dia 24 de abril o número de testes subirá para cinco mil por dia e a partir de 18 de maio para oito mil por dia.

Considerando que somos 46 milhões de paulistas, será a paciência dos paulistas a única a ser testada.

Fica a dúvida: o estado de São Paulo não previu o desenvolvimento do surto quando, pelo menos desde janeiro, o coronavírus já estava em diversos países? Não foi possível planejar a fabricação ou aquisição de insumos para produzir centenas de milhares de testes nem fortalecer os laboratórios públicos para apurar esses testes?

Leitos hospitalares, respiradores, máscaras, álcool em gel, água

Apesar de números diversos serem anunciados a cada coletiva, o fato é que a ampliação dos leitos de UTI será de 7200 para 9500. Nem é preciso comentar que estes leitos serão insuficientes a curto prazo e tampouco está claro se todos contarão com respiradores. A improvisação e voluntarismo com relação aos respiradores talvez se resolva, não por uma ação planejada do governo, mas sim pela ação de laboratórios universitários de engenharia que desenvolveram a toque de caixa respiradores por valores módicos e de outras instituições que estão reparando um número significativo de equipamentos que estavam há tempos encostados sem manutenção.

A alegação para a falta de máscaras para o pessoal da saúde é que fornecedores de países distantes estão incapacitados de exportá-las. Mas o que impede a indústria paulista de fabricá-las?

A falta de álcool em gel gratuito para toda a população não se explica no estado que é o maior produtor de álcool do mundo.

E a falta de água em vários bairros em toda a grande São Paulo? O governador esqueceu de determinar à Sabesp que mantenha a pressão da água durante a madrugada para que todos tenham água potável em suas casas?

Quarentena parcial

É patético assistir o governador culpar a população por não ficar em casa. A pergunta a ser feita é porque essa população não fica em casa.

Uma parte sai de casa para trabalhar já que o governador não exigiu dos patrões de setores não essenciais que deixassem os trabalhadores em casa com vencimentos integrais durante a pandemia.

Outra parte sai de casa porque vive sem condições de isolamento já que há três ou mais pessoas em pequenos cômodos, sem recursos para sobreviver e às vezes sem nem mesmo água potável.

No dia 14, a imprensa noticiou que a adoção de algumas medidas em favelas poderia reduzir o número de mortes em até 26 mil em São Paulo. Quais são essas medidas? Remoção de famílias para equipamentos públicos e hotéis; insumos de higiene; renda básica; estruturas de emergência de saneamento; expansão de UTIs e máscaras faciais. O estudo foi feito por equipe do Insper em conjunto com o coletivo “Favelas contra o coronavírus. Por que nenhuma dessas medidas foi pensada pelo governador ou pelo prefeito de São Paulo?

Nesse mesmo dia, o prefeito Bruno Covas anunciou que está em estudos a transformação de 4 escolas municipais nas comunidades de Paraisópolis e Heliópolis em hospitais de campanha totalizando mais 320 leitos. Por que será que não planejou isso há quatro meses? Achou que o surto de coronavirus não atingiria comunidades sem saneamento básico como afirmou o presidente Bolsonaro?

Anteriormente o governador Dória já anunciara a concessão de R$ 55 por mês para estudantes carentes da escola pública que ficaram sem acesso à merenda escolar. Apenas R$ 55 que foram suspensos pelo Tribunal de Justiça no dia 15 de abril.

A questão é o capitalismo

Ao observar a improvisação geral na qual o governo estadual e a prefeitura enfrentam a pandemia alguém pode se confundir e pensar que é apenas falta de competência.

A julgar pela qualidade da equipe que os assessora, que tem por trás de si as melhores universidades e hospitais do país, a razão da improvisação está nas políticas públicas passadas e presentes em defesa dos interesses dos grupos econômicos privados.

Afinal, por que os recursos públicos para os bancos são superiores aos destinados ao SUS?

Por que foi aplicada uma quarentena parcial em São Paulo senão para possibilitar o funcionamento de várias indústrias e serviços privados?

Por que Dória não utilizou seus recursos legais para impedir a onda de demissões em São Paulo?

Por que não se obrigou a indústria paulista a produzir álcool em gel e máscaras em quantidade para distribuir gratuitamente para toda a população?

Por que não se complementou a renda básica de meros R$ 600 provida pelo Governo Federal?

Por que não se determinou que a Sabesp mantivesse a pressão da água para garantir o abastecimento regular das comunidades?

Neste momento em que uma pandemia se combina com uma depressão econômica, as grandes empresas nacionais e internacionais disputam não apenas o orçamento público como também todos os ramos da economia. Os governos em todas as esferas – federal, estadual e municipal – em todo o país estão vinculados a esses interesses econômicos que são priorizados em relação ao direito à vida, ao emprego, à moradia, à saúde e à educação da população.

A verdade é que o capitalismo mata. Nas crises isto se torna mais dramático e visível.

Trabalhadoras e trabalhadores tem se auto-organizar e lutar pelo poder

Frente a este cenário, toda iniciativa de auto-organização tem que ser apoiada e expandida. São trabalhadores que querem ter direito de ficar em casa sem redução de salário. São as comunidades que se organizam para garantir a distribuição de alimentos e materiais de higiene. São os protestos exigindo políticas públicas dos governos.

Essas iniciativas precisam de um programa mais amplo para que seja feito todo o necessário para derrotar o coronavírus e salvar vidas.

Temos que lutar pela estatização dos hospitais privados para que todos possam ter acesso e pela ampliação dos leitos UTI.

Temos que lutar pela expropriação das indústrias que forem necessárias para produzir álcool em gel, máscaras, respiradores e tudo o que for necessário para o combate à pandemia.

Este também é o momento de agir. Para reduzir a superlotação nas comunidades temos que fortalecer os movimentos por moradia e ocupar prédios vazios e hotéis.

A solução para a água está na aliança operário e popular na qual os trabalhadores da Sabesp controlem a distribuição de água de forma a garantir a água para os bairros populares.

Para pôr fim às demissões e redução de salários, temos que seguir o exemplo dos operários italianos que fizeram uma onda de greves. Onde a greve não resolver, ocupar as fábricas e empresas.

Estas ações precisam se coordenar para a verdadeira solução: a conquista do poder político pela classe trabalhadora na qual esta governe democraticamente através de conselhos operários e populares de acordo com as necessidades da maioria da população.

Este é o programa socialista pelo qual luta o PSTU. Vamos juntos transformá-lo em realidade.