O país africano está sob intervenção francesa com a velha desculpa de “combate ao terrorismo”

Desde o dia 11 de janeiro, o Mali está sob a intervenção francesa, com o apoio das principais potências imperialistas (EUA, Alemanha e Inglaterra) e também do Conselho de Segurança da ONU. A justificativa do presidente François Hollande, do Partido Socialista francês, é o “combate ao terrorismo”. Nada mais falso. Da mesma forma que os Estados Unidos invadiram e ocuparam o Afeganistão e o Iraque, a intervenção do imperialismo francês não tem outro objetivo a não ser o de manter o controle sobre sua ex-colônia e impedir que o povo Tuareg, que luta pela sua autodeterminação, consolide os avanços que conquistaram em sua luta.

O imperialismo francês fala em impedir que se instale a “barbárie” dos salafistas (facção islâmica tradicionalista). A desculpa da intervenção, a luta contra os “extremistas islâmicos”, não é outra coisa que a luta do imperialismo francês pela manutenção das fronteiras definidas de forma arbitrária quando as potências imperialistas dividiram o continente de acordo com seus interesses. E, no mesmo sentido, para que as suas empresas sigam controlando as fontes de matérias-primas na região. Estamos, assim, diante de uma guerra de agressão colonial, levada pelo imperialismo francês e pela ditadura militar fantoche deste imperialismo, cujo objetivo é o massacre do povo Tuareg.

Um pouco de história: a independência e os Tuaregs
O Mali tornou-se colônia francesa no final do século 19. Em 1960, conquistou sua independência. Apesar de, num primeiro momento, o país estreitar laços com a ex-União Soviética e ser dirigido por nacionalistas, o controle francês da região sempre esteve presente. Após a crise das dívidas dos anos 80, este controle ganhou mais força através da privatização e da presença de multinacionais no ramo da telefonia (Orange), na produção e distribuição de eletricidade (Bouygues), nas minas, na produção do algodão etc.

Um dos problemas que afeta o Mali, decorrente da presença imperialista na África a partir do século 19, foi justamente a divisão entre povos que habitavam a região, a exemplo dos Tuareg: um povo seminômade que habita a região entre Argélia, Mali, Níger, Líbia, Chade, Burkina Faso e Nigéria. Estima-se que existam cerca de 1,5 milhões de Tuareg. Desde a independência do Mali, os conflitos com os Tuareg foram constantes, pois este povo reivindica a construção de seu próprio Estado nacional.

A primavera árabe e os conflitos no Norte do Mali
A derrota e a morte de Kadafi em outubro de 2011, cuja parte do seu exército era composta por populações Tuareg, teve duas consequências para a região norte de Mali: o deslocamento de uma parte dos combatentes defensores de Kadafi e também o deslocamento das armas para os grupos Tuareg da região.

Neste sentido, quatro grupos tiveram relativo reforço a partir do final de 2011: o Movimento Nacional de Libertação do Azawad (MNLA), grupo laico que luta pela autodeterminação dos Tuareg; o grupo Ansar Dine, de orientação salafista; o grupo Al Quaeda do Magreb Islâmico (AQMI) e sua cisão, o Movimento pela Unidade e Jihad na África do Oeste (Mujao), ambos de orientação islâmica, também. Os três últimos possuem alguma relação com a Al Qaeda.

No início de janeiro de 2012, o MNLA começou uma ofensiva tomando as cidades de Ménaka, Aguelok e Tessalit. A esta ofensiva, juntaram-se os outros grupos, principalmente, o Ansar Dine.

Devido aos conflitos e à instabilidade na região norte do país, o governo de Amadou Toumani Touré fez um deslocamento de tropas para sufocar a luta pela autodeterminação do povo Tuareg. O exército de Mali foi derrotado pela rebelião do povo Tuareg. Um golpe de Estado, em 22 de março, liderado pelo capitão do exército Amadou Sanogo, poucos dias antes das eleições e apoiado pelo imperialismo francês, preparou as condições para a ofensiva imperialista.

No final de maio, principalmente o MNLA e o Ansar Dine declararam o Estado independente de Azawad, que não foi reconhecido por nenhum outro país da região. Este é o verdadeiro pano de fundo da intervenção: o reconhecimento do MNLA e do Estado Azaward se converteram no centro do problema.

No intervalo entre o golpe e a proclamação do Estado Azaward, os grupos salafistas iniciaram sua ofensiva, tomando cidades do norte (como Kidal, Gao e Tombuctú). Ao não reconhecer o Estado Azaward, o imperialismo francês cria as condições para o isolamento do MNLA. Em finais de junho de 2012, o Ansar Dine e o Mujao (com o apoio do AQMI) avançaram sobre as áreas controladas pelo MNLA. Este último acabou perdendo controle da região, que passou a ser dominada pelos “islamistas radicais”.

Enquanto isto, há uma reorganização do próprio governo no Mali, patrocinada pelo imperialismo francês. Em 20 de agosto de 2012, por exigência da Comunidade Econômica dos Estados Africanos do Oeste (CEDAEO), foi formado um governo de “união nacional” (dos 31 ministros, 18 faziam parte do governo anterior ao golpe e quatro ministros são ligados à junta militar que deu o golpe). Este “novo governo” tomou como objetivo o combate aos “rebeldes do norte” para garantir a unidade do Estado do Mali.

A preparação da intervenção francesa
Neste cenário de conflito nacional, a França foi aos poucos abrindo as portas para uma intervenção armada. O antigo chefe da diplomacia francesa do governo Sarkozy, Alain Juppé, já tinha declarado, em fevereiro de 2012, que o centro de interesses era a “integralidade do território do Mali”. A política do governo Hollande seguiu o mesmo caminho. Uma das manobras do governo Hollande foi conseguir a aprovação da ONU em outubro de 2012 para a preparação de uma intervenção no Mali. Em 20 de dezembro, o Conselho de Segurança aprovou o envio de militares para “estabilizar” a região.

Abaixo a intervenção imperialista francesa!
O verdadeiro objetivo do imperialismo francês é garantir a divisão da África tal como ela foi concebida, há mais de um século, pelos imperialismos: separando povos com tradições e línguas próximas para garantir o bom funcionamento do saque imperialista realizado pelas empresas francesas.

Neste sentido, são absurdos, as declarações do Partido de Esquerda e do Partido Comunista Francês, principais organizações da Frente de Esquerda, de que a intervenção francesa é “inquietante”, que deveria ser feita sob a bandeira da ONU ou que deve ter somente o papel de “impedir” o avanço dos grupos rebeldes à Bamako, capital de Mali. A questão central, no entanto, não é quem dirige a intervenção estrangeira, mas a própria intervenção imperialista. Mais uma vez, o Partido Socialista se coloca à frente da defesa dos interesses coloniais da França e apoia o seu próprio imperialismo.

É necessário desmascarar a política do Estado imperialista francês com uma ampla campanha contra a intervenção imperialista e desmascarar a união sagrada que em nome dos “direitos humanos” poderá promover mais uma matança na África.

Post author Renato Cesar e Ricardo Ayala, de Paris
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