Por favor, não me tomem por mestre em ciências históricas ou Ph.D. em antropologia e sexualidade. Também não imaginem que este texto tenha o peso de uma tese, já que ele sequer possui os elementos necessários para a composição da mais simples monografia ou resenha científica. Não se deixem levar pelo título pretensioso e pomposo, pois provavelmente deverei cometer alguns erros que talvez me levem ao descrédito de uma leitura minuciosa e atenta.

Porém, peço encarecidamente aos possíveis leitores deste trabalho redigido sem nenhuma técnica e despido de exaustiva pesquisa que por um instante coloquem de lado seus apontamentos lingüísticos e rótulos acadêmicos. Peço isto porque este texto não foi escrito com a finalidade de informar, esclarecer ou teorizar nada, ele não passa de um solitário desabafo com o – provavelmente – inútil fim de volatizar minha indigestão e asco.

Sadismo: s.m. (o) 1. Perversão sexual em que alguém só sente prazer se infligir dor física ou moral ao parceiro. 2. Prazer com o sofrimento alheio.
Não me contive. Ao ver a morbidez toscamente pornográfica a que prisioneiros iraquianos estavam sendo submetidos nas mãos de soldados pertencentes às “tropas de paz”, tive que correr ao dicionário e verificar em pormenores o significado da palavra sadismo.

Ao constatar de modo verossímil os sentidos mais usuais desta infeliz palavra, sussurrei de ódio estarrecido: “sádicos”. Antes de haver me deparado com as famigeradas e vergonhosas fotografias, os maiores temores que eu sentia em relação à guerra eram relativos a baixas humanas conseqüentes da utilização desgovernada de artefatos bélicos nucleares, químicos ou biológicos, aviões tombando contra prédios, correspondências mortais, crianças órfãs e mutiladas por minas terrestres, povos dizimados. Mas, aquelas fotos… aquelas fotos me trouxeram um medo novo, perverso e inquietante.

Medo de que nossa humanidade já esteja tão banalizada aos olhos dos senhores que buscam a qualquer custo o poder, que a miséria humana tenha realmente se tornado motivo de escárnio e riso. O que estão a fazer de nossos corpos e nossa nudez? Sim, pois éramos nós todos que, despidos, nos amontoávamos naquelas fotografias grotescas como dominós caídos, fazendo parte de um jogo de azar onde a chibata ou o fuzilamento não seriam tão dolorosos quanto a tortura de termos arrancado pelas mãos de nossos algozes o direito de preservarmos nossos pudores.

Como se inspirados pelas lendárias histórias acerca de Vlad, o Empalador, soldados americanos deram forma às suas intoleráveis taras fazendo destas o estandarte de um insaciável imperialismo que tem suas presas vampirescas fincadas nas artérias de todas as nações que não se rendem à vilania de um déspota boçal e tirânico que, convenientemente, poderia ser alcunhado de “Drácula Anglo-americano”, o monstro por detrás do homem já não é tão mais feio que o homem em si. E seus lacaios desdenhosos fizeram bem a lição de casa: primeiro mataram os colegas de escola e em seguida rumaram para Bagdá, onde retiraram as vestes e a autonomia de um povo com o nobre e impetuoso fim de tornarem-se heróis.

Os corpos nus sobrepostos dos prisioneiros de guerra iraquianos são uma metáfora sem eufemismos do que o presidente do maior e mais poderoso (ou seria perigoso!) país do mundo está reservando para todos que venham a entravar sua gana por conquistas nesta epopéia às avessas que ele mesmo escreve ao som de sua harpa doentia enquanto o planeta sucumbe diante das chamas de seu inflamado despautério, incompreensivelmente pontuado por discursos pacifistas em um simulacro de não-agressão, enquanto as bombas e as rajadas de fuzis e metralhadoras continuam sendo cuspidas da ponta de sua caneta.

Da mesma forma que os prisioneiros iraquianos presentes naquelas fotos, o conservador califa das américas também está nu. Mas falta à humanidade a mesma coragem de uma criança para reconhecer e apontar os medonhos e catastróficos defeitos deste tosco e monstruoso rei.