Honduras Resiste – 49/50 – 4/5*
50 dias de resistência contra o golpe e cinco dias de minha estadia
15 e 16 de agosto de 2009

O final de semana continuou com atividades e conversas. No sábado, um concerto na praça perto do aeroporto, onde foi assassinado o jovem estudante de 19 anos, Isis Obed Murillo Mencía, no dia 5 de julho. Compareceram cerca de mil pessoas com toda a emoção do local onde ocorreu a maior manifestação contra o golpe, o sábado seguinte ao dia 28 de junho, quando Zelaya anunciou que voltaria ao país, e a Frente Nacional Contra o Golpe de Estado convocou a população para recebê-lo.

A avaliação é de que, na ocasião, cerca de 300 mil a 400 mil pessoas vieram de todo o país em caravanas, carros, marchas e que conseguiram chegar à capital e se dirigir ao aeroporto somente um terço. O restante foi bloqueado pelos caminhos. Para a dimensão do Brasil, seria como se um milhão de pessoas se deslocassem para uma manifestação.

Os golpistas anunciaram que não permitiriam o pouso do avião. Os trabalhadores e trabalhadoras se moveram para fazer com que o presidente deposto pudesse voltar.

Em várias conversas, se passa a impressão de que a ditadura quase caiu naquele momento. Os golpistas tinham acabado de se instalar, ainda não haviam definido todos os ministros, setores das Forças Armadas balançavam.

A marcha multitudinária se impôs rompendo três barreiras militares armadas pelos golpistas. O clima era de tensão conforme a marcha avançava, e as barreiras se abriam. Militares informavam pelos rádios que não podiam disparar, porque era o povo hondurenho que marchava.

Somente a última barreira, na cabeceira do aeroporto, onde era possível entrar pelas cercas até a pista, respondeu ao comando e atirou na multidão. Ficaram vários feridos e o estudante, homenageado pelo concerto do sábado, assassinado. Durante a correria, o avião que trazia Zelaya arremete e não pousa. A divisão que se expressou nas bases e em setores da hierarquia das Forças Armadas fica de lado e os milhares se sentem frustrados porque o avião não desceu. Mais uma vez, o centro das expectativas olhando para o que pode chegar e não para o enfrentamento que gerou paralisia nas bases de setores importantes do exército. Isso nunca funcionou para as lutas dos trabalhadores.

Heroico povo, que apesar da frustração continua marchando e se mobilizando.

No domingo, houve uma assembleia geral da Frente para discutir a continuidade. Como um dos primeiros convidados a falar, ofereço como um gesto de solidariedade a bandeira da Conlutas para que esteja em todos os momentos de luta da Frente. A bandeira permanece na mesa durante toda a assembleia. Mais uma vez, as manifestações de carinho e solidariedade de classe. Os abraços, os apertos de mão de ativistas que expressam sua busca na solidariedade internacional de classe um ponto de apoio.

Trata-se de um golpe de classe, apesar das contradições do imperialismo. Os golpistas, como dizem os hondurenhos, são as dez famílias, forma como identificam os principais grupos burgueses que dominam, como sócios menores das multinacionais, os principais negócios do país: bancos, imprensa, café, maquiladoras (principalmente têxteis), banana, madeira, redes de supermercados, fast foods etc.

As decisões centrais da continuidade: ampliar a organização da Frente buscando constituir coordenações regionais da Frente Contra o Golpe. Centrar nos próximos dias, depois da semana em que o centro foi a marcha que chegou a Tegucigalpa no dia 11 e permaneceu, em retomar o debate e a organização nas bases dos movimentos. Ter como eixo de atividades, na próxima semana, a questão dos direitos humanos, aproveitando a visita da Comissão de Direitos Humanos da OEA que visitará o país. A principal bandeira é a libertação dos 11 jovens que continuam detidos e a suspensão dos vários processos em curso.

No domingo, dia 23, haverá um ato show, “Vozes Contra o Golpe”, com a presença de artistas já confirmados da Nicarágua, Venezuela, Guatemala, Costa Rica e Argentina.

Depois da assembleia, junto com advogados de organizações de direitos humanos, jornalistas e parlamentares, fomos visitar os 11 jovens que continuam presos na Penitenciária Nacional, a cerca de 40 minutos da cidade. Todos acusados de vandalismo, atentados terroristas, crime contra propriedade. Estão num presídio comum, onde a visita teve de feita sem celulares ou máquinas fotográficas. Jovens, na sua maioria subempregados, que foram presos, como disse um deles, “porque somos pobres”. O caráter de classe do golpe aparece por todo lado.