Há pouco mais de dois meses, um manifesto assinado por 49 militantes anunciava nova ruptura com o PSOL, no Maranhão. O texto considerava o partido “uma caricatura do PT” e afirma que “nosso combate é outro”. O Opinião entrevistou Saulo Arcangeli, trabalhComo vocês avaliam o PSOL e quais os principais motivos da ruptura?
Saulo Arcangeli – O PSOL teve uma rápida degeneração. Nestes sete anos, buscamos inserir o partido nas lutas e na defesa do socialismo. Mas o partido tomou outro rumo. Transformou-se em um partido reformista, que buscou a institucionalidade e afastou-se das lutas. Passou a não cumprir seu programa e estatuto, inclusive recebendo recursos do grande capital.

Tivemos vários embates nestes anos com a Direção Nacional e, recentemente, uma atitude foi a gota d’água e serviu como base para sairmos: a intervenção para filiar ex-petistas. Já haviamos debatido na estadual e não aprovamos as filiações. Mas a nacional permitiu.

O que tem de pior nesse grupo?
Saulo Arcangeli – A maior parte não participa da militância e das lutas e sempre defendeu políticas do governo Lula. Há alguns que estiveram próximos dos tucanos, inclusive em cargos. Defendiam estes projetos até o ano passado…
Esse grupo procurou o PSOL porque não tinha mais espaço no PT estadual, hoje influenciado pelos Sarney. Na direção estadual, avaliamos que eles não divergiam do projeto petista e impugnamos as filiações. Mas a direção nacional aceitou, passando por cima.

Wilson Leite – O que de pior no grupo é exatamente buscar a conciliação de classe. Achar que os trabalhadores precisam se aliar conjunturalmente com a direita. Acham que não adianta o partido ser forte. Tem de ter cargos.

Outros grupos também romperam. não há mais espaço no PSOL para uma alternativa socialista?
Saulo – O partido foi criado principalmente a partir da rupturas com o PT, inclusive de uma parte de nós, e não tivemos aprofundamento nas discussões para criar um partido que se propunha a ser uma alternativa socialista. Desde o início combatemos o cupulismo nas decisões, das tendências majoritárias. Estas se dividiram e disputam acirradamente a hegemonia. As instâncias não funcionavam e os congressos basicamente eram palco da disputa pela direção.

O partido foi uma tentativa que nós e outros grupos fizemos, mas podemos afirmar que hoje o PSOL não é uma alternativa socialista para os revolucionários deste país. Então essas pessoas que fundaram, acreditaram em um projeto diferente, estão deixando o partido.

Wilson – Isso que o Saulo falou ficou perceptível no I Congresso. A discussão sobre a conjuntura econômica e social, lutas, ficou de lado. A disputa entre as correntes foi acompanhada de políticas que repetem o projeto democrático e popular do PT, que nada mais é do que o projeto de conciliação de classes.

O curioso é que teses de correntes traziam um pouco do que a gente buscava. Mas havia uma diferença grande entre o que estava escrito, no papel, e na prática. A gente percebeu não só nas plenárias, mas no contato com as pessoas.

Recentemente saiu o Censo, que revelou a miséria no Maranhão. Há ainda ataques aos quilombolas, racismo, greves e conflitos. Como é a realidade política do estado?
Saulo – O cenário é de miséria absoluta, com os piores indicadores em Educação do país. Na Saúde, quase 90% da população depende do SUS e temos a menor proporção de médico por habitante. É uma situação muito difícil.

Agora, vemos o avanço do agronegócio, principalmente no sul, em uma devastação. Aumenta o confronto entre capital e trabalho, com ameaças a trabalhadores rurais, indígenas e remanescentes de quilombos. Há ao menos 30 lideranças quilombolas ameaçadas.

Wilson – O governo tem mostrado muito as obras, o desenvolvimento, um Maranhão onde há progresso… Esquecem de mostrar o outro lado nas propagandas. A vida em muitos lugares aqui é comparável a locais de catástrofes, guerras. Isso não mostram. Muitas empresas vêm atrás da mão-de-obra barata e trabalho precário. Sem falar no trabalho escravo. Aqui quem decide se uma empresa será instalada não é o órgão ambiental. Na prática, é a própria empresa. O governo baixa a caneta e libera.

Saulo – O Maranhão é dominado pelo clã dos Sarney, com tentáculos no Legislativo e no Judiciário. E usa contra os movimentos sociais, como na greve dos professores. O governo Roseana perseguiu, remanejou, fez assédio moral… Os professores mantiveram a greve por cerca de 70 dias, com muita resistência.

Como está organizado o grupo de vocês? Onde atuam, em quais cidades?
Saulo – Somos um coletivo. O grupo é variado, composto por sindicalistas que atuam na CSP-Conlutas. Há professores, há bancários, servidores públicos e ativistas do movimento popular.

Wilson – Também estamos aqui em Imperatriz e em Caxias. Pela distância, pelo isolamento, a gente costuma brincar que aqui é a “Sibéria” do Maranhão…

Além das lutas, vocês buscam ser uma alternativa política. Como está o debate estratégico no grupo?
Saulo – O Coletivo Ação Comunista (CAC) foi criado ainda no PSOL para fazer uma intervenção política mais organizada. Os membros saíram de forma conjunta, permanecemos atuando nas lutas sociais e agora nos reunimos sistematicamente, para traçar nossa estratégia de intervenção.

Hoje fazemos uma discussão para decidirmos como será nossa atuação daqui para frente e quais ações e rumos tomaremos. Dentre eles, está inserida a discussão partidária.

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