Os operários da construção civil de Fortaleza (CE) cruzaram os braços no dia 22 de abril. Quando fechávamos esta edição, a greve entrava em sua segunda semana, radicalizada e com alto índice de paralisaçãoPraticamente todas as obras de grande porte estão paradas em Fortaleza. Pela manhã, os operários realizam o que apelidaram de “piquetes andantes”. Começam numa empresa e se espalham pelos demais canteiros de obras de uma região. São 14 piquetes que se espalham por diferentes áreas da capital cearense e cada um deles chega a reunir centenas de trabalhadores. Ao final, os piquetes se transformam em verdadeiras passeatas, que se dirigem para as assembléias diárias na Praça Portugal. Esta região nobre da cidade nunca viu tantos operários juntos. No mínimo mil operários se reúnem nas assembléias, sendo que a do primeiro dia de greve reuniu três mil trabalhadores.

Os patrões e a grande imprensa difundem a idéia de uma greve violenta. Essa violência estaria estampada em canteiros destruídos e nos piquetes radicalizados que, segundo o colunista de um jornal da cidade, “atropelam a Constituição, o direito de propriedade e as liberdades individuais”. Quer dizer, não é a exploração que é violenta, mas a reação do operariado. Nas palavras de um operário da construtora Rolim Machado, “não estamos na obra para quebra-quebra, mas a culpa do que tem acontecido é dos patrões”.

A greve, na realidade, tem se estendido e se fortalecido, inclusive utilizando métodos radicais de luta, como resposta à intransigência patronal. É um fato: os patrões da construção civil de Fortaleza estão nadando em dinheiro. Enquanto no Brasil o crescimento do setor alcançou o patamar de 5%, o empresariado cearense comemora um aumento superior a 10%.

Cotidiano de exploração
Mesmo com o grande crescimento do setor, o Sinduscon (sindicato patronal) apresentou na mesa de negociação uma proposta de reajuste para os pisos da categoria que varia de 5,95% a 8,16%, algo absolutamente irrisório e que enfureceu ainda mais os operários, cuja resposta provocou calafrios nos empresários. O menor piso salarial da categoria, o de servente, é de apenas R$ 415, um salário mínimo. Com a proposta dos empresários, chegaria a R$ 424, uma clara provocação da patronal.

Além disso, os empresários querem obrigar o trabalho aos sábados, aumentando ainda mais a já extenuante jornada dos trabalhadores. Atualmente, algumas empresas obrigam o operário a trabalhar alguns sábados, mas a patronal quer generalizar essa prática. O ataque aos direitos pode ser comparado ao que tentou a General Motors, propondo o banco de horas aos metalúrgicos de São José dos Campos.

Enquanto os empresários enriquecem, os trabalhadores enfrentam um cotidiano de exploração e humilhações. “É difícil, como pai de família, dar de comer à mulher e aos filhos, o jeito que tem é fazer greve mesmo”, afirma o servente de obras Oclásio. Como se não bastassem os baixos salários, os operários têm de sair de casa de madrugada e enfrentar uma dura jornada, geralmente das 7h às 17h. “Tenho de sair de casa às 4h30 porque tenho que vir de trem. Chego em casa do trabalho só lá pelas 8h da noite”, relata o operário.

A indignação se expressa nas manifestações e piquetes. “Os patrões andam de carro importado, moram em mansões e nós não temos nem bicicleta pra ir ao trabalho. Eles até nos obrigam a trabalhar de madrugada, já cheguei a dormir no terminal por isso”, conta outro servente de obras, o operário Antônio.

“Com pão e rapadura, a greve continua”
A paralisação segue forte, com o sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil, ligado à Conlutas, à frente das mobilizações. Tradição em todas as greves da categoria, o sindicato distribui pão e rapadura durante a assembléia dos operários. Uma forma de repor as energias após uma manhã inteira de caminhada nos piquetes, embaixo de um sol implacável. Uma das palavras-de-ordem mais cantadas é “com pão e rapadura, a greve continua”, que demonstra a disposição de luta dos operários.

Na negociação ocorrida horas antes do fechamento desta edição, o sindicato dos patrões choramingou vidros quebrados, canteiros danificados e obras paradas, mas se recusou a propor qualquer resolução no sentido de, pelo menos, se aproximar da pauta de reivindicações da campanha salarial: reajuste de 15%, jornada de trabalho de segunda à sexta, profissionalização do betoneiro, cesta básica, plano de saúde e dia do peão da construção civil.

A imprensa burguesa vem alardeando um suposto “vandalismo” dos grevistas, procurando jogar a população contra os trabalhadores. Isso é parte do embate ideológico em torno da consciência da população e até agora não surtiu o efeito desejado. Assim, começam a tentar intimidar os operários, sendo que seguranças particulares e a própria polícia já chegaram a efetuar disparos em piquetes.

Solidariedade
Há um apoio à luta dos operários da construção civil como pouco se observou em lutas recentes de outras categorias, com a presença da Conlutas, Intersindical, sindicatos da confecção feminina e dos gráficos, diversas oposições (como a dos rodoviários), ativistas da juventude, professores (minoria Sindiute e oposição Apeoc) e militantes do PSTU e PCB. Os jornais procuram desqualificar sobretudo o PSTU, cuja destacada aparição tem multiplicado o ódio de classe da burguesia e dos seus ideólogos.

Os operários de Fortaleza pedem que todos os sindicatos combativos e os lutadores enviem mensagens de apoio à greve do peão. A greve continua como o instrumento fundamental para quebrar a resistência patronal e o seu salário de fome. Ou, como disse um companheiro durante a assembléia: “vamos precisar estocar rapadura”.

  • SAIBA MAIS: Uma cidade cara para os trabalhadores
    Um dos principais destinos turísticos do país, Fortaleza é uma cidade que exclui cada vez mais os trabalhadores e o povo pobre. Além dos baixos salários, os operários enfrentam um alto custo de vida na capital cearense. Em 2007, a cesta básica teve um aumento de 19,76%. Só o feijão sofreu alta de 214% no ano. Já o arroz registrou, em março, um aumento de 20,33% no acumulado dos últimos 12 meses, maior recorde do preço do produto.

    Post author Fábio José, de Fortaleza (CE) e Diego Cruz, enviado especial
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