Jejum é pelo arquivamento do projeto de transposição do rio São Francisco do governo LulaMais um capítulo da luta contra o projeto da transposição do rio São Francisco está sendo protagonizado pelo frei dom Luiz Cappio. Há 13 dias, ele está em greve de fome para reivindicar a Lula o arquivamento definitivo do projeto e a imediata retirada do exército dos eixos Leste e Norte.

Em 2005, no décimo primeiro dia de jejum, o frei suspendeu o ato depois de um acordo com Jacques Wagner (PT), atual governador da Bahia, que representava diretamente Lula nas negociações. Esse acordo previa a suspensão do projeto e a abertura de um diálogo efetivo com a sociedade civil.

Depois de ter acreditado na palavra de Lula, dois anos se passaram e o frei retoma o jejum por causa do descumprimento do acordo pelo presidente. “O senhor não cumpriu sua palavra. O senhor não honrou nosso compromisso. Enganou a mim e a toda a sociedade brasileira”, disse dom Cappio. A resposta imediata do governo foi reafirmar que as obras não seriam paralisadas e que as condições do frei eram inaceitáveis. O governo acusou dom Cappio de “fundamentalista” e “individualista”.

Logo após o anúncio oficial, Lula veio a público com seu argumento populista para tentar desmoralizar o protesto. “Entre os 12 milhões de pessoas que sofrem com a escassez da água e o dom Luiz Cappio, eu fico com os pobres”, disse. Porém são, justamente, os pobres que não terão acesso à maior parte das águas que serão transpostas, já que 70% serão destinadas para grandes projetos de irrigação e produtores de camarão e de frutas para exportação. Apenas 5% serão para a população difusa do sertão do semi-árido, que pagará caro pelo consumo da água.

Ministro da Integração Nacional ataca frei a mando de Lula
Em recente artigo escrito pelo ministro intitulado Sem boa causa não há mártir, Geddel Vieira Lima (PMDB), afirma, entre tantas insanidades, que a transposição e a revitalização não são “causas nobres que justificam tal ato” e que a greve de fome é “um disparate”. Justifica esses adjetivos com o falso argumento de que a transposição é um projeto para “combater a indústria da seca” e que “a democracia não pode se dobrar à um único homem”.

O ministro, que defende a democracia, não é nada democrático. Durante sua caravana Travessia do futuro, em Pirapora (MG), o ministro impediu que 100 manifestantes participassem do debate sobre a transposição. Na ocasião, Geddel falou em defesa do projeto para uma platéia de burocratas, prefeitos, secretários, vereadores e toda espécie de politiqueiros que assistiam com o objetivo de negociar apoios políticos à transposição em troca de verbas.

Com escolta da Polícia Militar, o ministro passou pelo protesto às pressas. Um segurança no interior do carro oficial empunhou a arma contra os manifestantes e, depois de muito enrolar, não foi permitida a entrada de ninguém. Durante o evento, o ministro tentou minimizar a manifestação falando para a platéia: “pensei que ia chegar e ser recebido por uma manifestação grande contra a Transposição, mas só vi meia dúzia de militantes do PSTU”.

Em Belo Horizonte, Pirapora e Montes Claros, no norte de Minas Gerais, Geddel também foi recebido por protestos e manifestações contrárias à transposição. Em todas elas, os manifestantes foram impedidos de participar dos debates. Esse é o ministro democrático, defendendo sua democracia.

A miopia do ministro que não permitiu enxergar o número exato de manifestantes em Pirapora é a mesma que o faz não enxergar o número de pessoas que apóiam o ato de dom Cappio, tentando fazer parecer, em suas declarações, que se trata de um ato isolado do frei.

Desde o dia 27 de novembro, milhares de cartas de apoio de todo país foram enviadas. Já ocorreram manifestações públicas com milhares de participantes, bloqueios de rodovias da região, celebrações com quatro mil pessoas. Estão previstas outras manifestações, convocadas em unidade por Conlutas, Via Campesina e MST.

Definitivamente, somos milhares de “dons Cappios” reivindicando o arquivamento da transposição e a saída do exército dos eixos.

Unificar todos os movimentos que são contrários a Transposição
O corajoso ato de dom Cappio tem cumprido um importante papel na luta para derrotar a transposição do São Francisco. Deu repercussão nacional e internacional à luta contra o projeto do governo e inseriu essa reivindicação na pauta dos movimentos sociais e dos sindicatos. Mais do que isso: foi a continuidade da luta após o jejum de 2005, como mostram os acampamentos em Brasília e em Cabrobó e a ampliação das mobilizações contrárias à transposição.

O governo está atacando com todas as forças a greve de fome e não está se importando com a vida de dom Cappio. Lula está mais preocupado com a aprovação da CPMF no Senado do que com a vida do povo ribeirinho. Lula não vai negociar por vontade própria. Não vai suspender as obras, nem retirar o exército dos eixos. Se depender de Lula, o frei perderá a vida.

Lula só arquivará o projeto se for derrotado pelo movimento nas ruas, com mobilizações unitárias. Há um imenso apoio à luta do frei no Brasil, mas é necessário transformar esse apoio em ações que pressionem o governo e o façam recuar de sua posição autoritária. Ampliar as manifestações de solidariedade em todos os lugares onde for possível é fundamental nesse momento, pois a cada dia que passa, o estado de saúde do frei é mais preocupante.

A falta de diálogo de Lula e a saúde de dom Cappio nos obrigam a agir rápido. O governo está unido no ataque. Por isso, acreditamos que seja necessário convocar uma reunião dos movimentos sociais contrários à transposição, em Sobradinho, que unifique MST, Via Campesina, Conlutas, Comissão Pastoral da Terra, entidades da Articulação em Defesa do São Francisco e todas as forças que são contrárias à transposição para construir um plano de lutas urgente.

Nesse plano, poderá ser incluído um encontro nacional em Brasília em solidariedade ao frei e pela suspensão definitiva da transposição. Para fazer com que Lula suspenda a transposição é preciso ampliar a pressão popular através de uma mobilização concentrada em Brasília.

Nenhuma confiança em Lula: é preciso romper com o governo!
Depois de dois anos de muitos enfrentamentos e mobilizações contra a transposição, qual é o significado do descumprimento do acordo, das tentativas de desmoralização a dom Cappio e do descaso de Lula com a vida do frei? O que esses fatos mostram para todos os lutadores dos movimentos populares que estão contra a Transposição?

Lula tem dado provas todos os dias que mudou de lado. Ele governa para os banqueiros, latifundiários e empresários: esses são sempre atendidos pelo governo. Além do absurdo projeto da transposição, Lula está propondo reforma na Previdência, que vai acabar com o direito dos trabalhadores a se aposentarem, não fez a reforma agrária, assentando menos famílias do que FHC, e não faz a revitalização do rio São Francisco.

Não se pode confiar num governo que não se preocupa com a vida do frei. Não é possível confiar num governo que não se preocupa com a vida dos ribeirinhos. Em 2005, dom Cappio confiou em Lula e o resultado foi o início das obras. É preciso admitir que toda a esperança de mudança foi traída e que não há disputa nesse governo, não há como recuperar o projeto popular porque nunca houve tal projeto. Lula ainda utiliza o apoio de parcela importante da população para conseguir impor suas políticas impopulares mais facilmente.

É preciso romper com esse governo e confiar apenas na luta. Dom Cappio sintetiza bem para quem governa Lula: “hoje, o senhor é refém do capital. O senhor esquece das suas origens. O senhor esqueceu do povo que o elegeu para ser o presidente dos pobres desse país. Não posso admitir que um presidente que foi eleito para ser o (…) presidente dos pobres des